Quando você perde os playoffs pela terceira vez consecutiva, sem qualquer sinal de evolução no elenco e sem maiores expectativas para o futuro, não há muito o que fazer, exceto limpar a casa, mudar a mentalidade e recomeçar em outubro próximo.
Assim teria agido o gerente geral Cliff Fletcher, do Toronto Maple Leafs, se os seus principais jogadores colaborassem. Não foi o caso.
Os Leafs chegaram ao dia-limite de trocas praticamente eliminados e com diversos atletas desejados por outras equipes da liga. Era a situação ideal para
promover o renascimento do time, apostando nas próximas temporadas, já que essa estava perdida. O Philadelphia Flyers é o exemplo recente de reconstrução. Não fossem as contusões das últimas semanas — Mike Richards, Derian Hatcher, entre outros —, a equipe saltaria do último lugar na temporada passada para os playoffs nesta. Poderia se esperar para o Toronto algo próximo disso.
Pensando desta forma Fletcher se reuniu com os cinco jogadores da equipe que possuíam cláusulas de não-troca: Mats Sundin, Tomas Kaberle, Pavel Kubina, Bryan McCabe e Darcy Tucker. Para todos havia mercado, exceção talvez feita a Tucker. Kubina aceitou abrir mão da cláusula na véspera do dia-limite, apenas para horas depois mudar de idéia e exercer o direito de não ser negociado. Acredita-se inclusive que os Maple Leafs já tivessem acertado uma troca envolvendo o defensor. Outro que esteve bastante próximo de deixar a equipe foi McCabe, que segundo os rumores aceitou abrir mão da cláusula, porém esta informação não é oficial e de fato nenhuma troca envolvendo seu nome foi concretizada.
Kubina e McCabe teriam ajudado e muito na renovação da equipe. Imagine quantos bons prospectos e escolhas no recrutamento os dois defensores não renderiam aos Leafs?
Vejamos outros defensores negociados na terça-feira. Brad Stuart custou ao Detroit Red Wings duas escolhas, incluindo a de segunda rodada. O Colorado Avalanche repatriou Adam Foote ao custo de uma escolha de primeira rodada. Por Brian Campbell o San Jose Sharks negociou o jovem atacante Steve Bernier e a escolha de primeira rodada. Portanto, o preço de Kubina e McCabe, nesta escala, estaria próximo ao de Foote.
Mas seria em cima de Sundin, capitão e ídolo, que o alicerce do novo Toronto seria estabelecido.
Quatro dias antes do dia-limite Fletcher solicitou ao sueco que abrisse mão de sua cláusula e aceitasse ser negociado. Sundin não se surpreendeu com o pedido, porque ele está há tanto tempo no jogo que já aprendeu como os negócios funcionam. Quantos times estariam interessados nele? Uhn... todos, imagino. E as propostas seriam ótimas, não tenha dúvida.
Sundin será agente livre irrestrito em julho, ou seja, mesmo que fosse trocado para outra equipe, poderia negociar com os Leafs o seu retorno, já que Toronto é a sua casa e ele sempre se imaginou aposentando-se com aquela camisa. Bastava que Sundin disputasse os playoffs por outra equipe, no melhor estilo "jogador de aluguel", com chances claras de vencer a Copa Stanley pela primeira vez em sua carreira. Aos 37 anos, essa oportunidade pode não se repetir. Porém ele decidiu continuar.
"Eu não posso deixar meus companheiros e me juntar a outra equipe neste momento. Eu nunca acreditei no conceito de 'jogador de aluguel'.
Eu acredito que vencer a Copa Stanley é o máximo que você pode atingir no hóquei, mas pra mim, para apreciar isso você tem que fazer parte de toda jornada e isso significa de outubro a junho. Eu espero que todo mundo entenda e respeite minha decisão."
Para o Toronto a decisão de Sundin foi a pior possível. A equipe não obteve retorno algum, nada de escolhas e nada de prospectos.
Fletcher fez o que pôde, mas não há nada que ele pudesse fazer diante da recusa de seu capitão. Se ele conhecesse Sundin a fundo, poderia agir de maneira diferente. Na última intertemporada, os Leafs ofereceram ao jogador um novo contrato variando entre um e três anos e ele sabiamente optou pelo de menor duração. Porém foram seis semanas de muita especulação antes de sua resposta oficial.
O que Fletcher fez às vésperas deste dia-limite de trocas foi violentar Sundin com seu pedido urgente. Dois meses atrás ele deveria ter oferecido ao jogador as duas opções: renovar o contrato ou ser negociado. Com mais tempo para pensar, talvez a resposta fosse outra. Quem não quer competir pela Copa Stanley?
É improvável que o jogador retorne ao Toronto em julho, porque após enfrentar a situação mais embaraçosa de sua carreira, é perfeitamente plausível que ele busque novos desafios ou simplesmente se aposente, possibilidade levantada pelo próprio.
O dia-limite de trocas só não foi pior para os Maple Leafs porque Fletcher conseguiu se livrar de três pesos mortos, Hal Gill, Wade Belak e Chad Kilger, em troca de quatro escolhas no recrutamento (segunda, terceira e quinta rodada, deste ano, e quinta rodada, do ano que vem), aliviando a comprometida folha salarial da próxima temporada em quase US$ 3 milhões.
Aliás, a próxima temporada, a se julgar pela situação financeira do Toronto, já está perdida. A equipe tem quase US$ 40 milhões já empregados, em contratos absurdos, a saber:
- Jason Blake :: 34 anos, US$ 4 milhões até 2012;
- McCabe :: 32 anos, US$ 5,75 milhões até 2011;
- Kaberle :: 29 anos, US$ 4,25 milhões até 2011;
- Tucker
:: 32 anos, US$ 3 milhões até 2011;
- Kubina :: 30 anos, US$ 5 milhões até 2010;
- Mark Bell :: 27 anos, US$ 2,167 milhões até 2009.
Otimista é a perspectiva de que só a próxima temporada esteja comprometida. Na verdade os Leafs cavaram um buraco muito mais fundo e agora tentam sobreviver pedindo aos jogadores que desistam de seus direitos. Assim a casa não será limpa por um longo tempo, Fletcher.
Quer uma prova clara do retrocesso dos Maple Leafs? Em 2006 eles ficaram a dois pontos dos playoffs. No ano seguinte, a apenas um ponto.
Nesta temporada a diferença deve ser de seis pontos. E no ano que vem não será diferente.