Riga 2000
O campeonato letão pode não ser a 8.ª maravilha do mundo, mas teve um final digno de fazer Bruce Lee se revirar na tumba de tanta inveja. Mas, antes de abordamos a amotinada final, vamos ver comentários desnecessários sobre o hóquei letão. Todos de pé.
Das repúblicas bálticas, a Letônia é a que sempre apresentou um hóquei mais desenvolvido. Seu campeonato, porém, sempre deixou a desejar.
Os jovens que mostram talento acima da média acabam pegando o rumo dos times médios da Rússia ou da CHL — Kaspars Daugavins, Griss Grundmanis, Arturs Kulda, Kaspars Saulietis e Oskars Bartulis formaram o último lote de atletas que saiu da Letônia para atuar em alguma das três grandes ligas juniores canadenses. A primeira divisão não colhe os bons frutos do trabalho que acontece nas categorias de base.
Na seleção adulta o cenário não é diferente. Do grupo que foi a Moscou disputar o mundial deste ano, apenas três atletas militam no hóquei doméstico. E como esses três indivíduos atuam pelo clube Riga 2000, é de se supor que essa seja a equipe mais forte do país. Ainda mais se levarmos em consideração que eles venceram as últimas quatro edições do torneio nacional.
Clube bem novo (o 2000 de seu nome remete ao ano de sua fundação), o Riga 2000 conta com uma estrutura invejável para os padrões bálticos. É o único que consegue segurar alguns de seus destaques individuais. No início dessa temporada, o Augsburger Panther, time alemão, tentou levar Artis Abols e Armands Berzins para a DEL, mas o time da capital conseguiu manter os dois atacantes.
Entre os rivais do Riga em 2006-07 estiveram o glorioso SC Elektrenai Energia, da Lituânia. Muitos esperavam que o time de Elektrenai se reforçasse com russos e letões para não fazer feio na Samsung Premier League, mas o único estrangeiro da equipe foi o treinador Guntis Balins. O verde e amarelo da capital lituana apostou em um hóquei ofensivo, e acabou mostrando para o mundo — na verdade apenas para alguns — a categoria de indivíduos como Martynas Slikas, Dovydas Kulevicius e Algimantas Visockas
Além dos já citados Elektrenai e Riga 2000, mais quatro times fazem parte da Premier League.
O Riga 20 (é, tem Riga 2000 e Riga 20; durma com esse barulho), clube atual do lendário Artus Irbe; o Daugavpils Hokeja Klubs Latgale, time com maior número de estrangeiros do país; o Hokeja Klubs Liepajas Metallurg, que tem um estrutura de não fazer inveja a qualquer clube do mundo; e o Armijas Sporta Klubs/Ogre, que, como o próprio nome sugere, é o time das forças armadas (espécie de CSKA letão).
Armijas Sporta Klubs (ASK) Ogre era tido como o mais forte candidato para interromper a hegemonia do Riga 2000. De fato, os maiores destaques individuais da Premier League foram do time de Ogre: os atacantes Aleksandrs Kercs e Aigars Razgals. Kercs foi o maior pontuador da SPL, com 75 pontos em 50 jogos. Razgals veio a seguir. Ambos foram fundamentais para a primeira colocação geral de seu clube ao final da temporada regular.
Por falar em artilheiros, os compatriotas de Darius Kasparaitis fizeram bonito em território letão. A metade da lista dos dez maiores pontuadores da temporada foi ocupada por lituanos, com destaque maior para Egidijus Bauba, do Latgale, com 44 pontos em 38 jogos.
Todos esperavam uma final entre Ogre e Riga 2000. E foi isso que aconteceu, e sem percalços durante a pós-temporada.
O Riga 2000, apesar de jogar em uma arena (Siemens Ledus Halle) que leva o nome de um concorrente que patrocina a liga, é acusado de ser sempre favorecido pela arbitragem. Então, antes mesmo de ASK Ogre e o time da capital Riga entrarem no gelo, a final já estava sendo jogada nos bastidores.
O jogo inicial acabou dando razão aos que suspeitam da lisura da competição. Penalidades suspeitas foram marcadas contra o time do interior, com três delas servindo para ajudar o Riga 2000 a abrir 5-0 no placar com dois períodos de hóquei jogados. O ASK Ogre ainda amenizaria a derrota com dois gols, mas nada que ameaçasse a liderança do Riga.
O confronto seguinte teve um ASK mais fixado com jogar hóquei do que se preocupar com conspirações. E isso foi o suficiente. Kercs, Razgals, o tcheco Petr Chvojka e Kirils Ugarovs deram ao ASK uma vantagem que o Riga não pode reverter. Série empatada.
Raimonds Danilics e Edgars Zaltkovskis foram as estrelas do terceiro confronto da série, vencido pelo Riga. Na partida número 4, o demônio do báltico Artis Abols, seria mais do que nunca o Artis Abols que todos conhecemos — na verdade ninguém que eu conheça sabe quem é Abols, mas isso não vem ao caso agora. O atleta de 34 anos, e de passagens por equipes da Dinamarca e da segunda divisão sueca, foi a artilheiro do time na temporada, mas andava sumido nos playoffs. Reapareceu quando mais importava. Como a partida terminou empatada em 4-4, mesmo após o tempo extra de cinco minutos, tudo acabou decidido nos pênaltis, e Abols foi o único que marcou, abrindo uma bela vantagem de 3-1 na série para o Riga 2000.
Invejoso como poucos, Aigars Razgals, do ASK, fez o mesmo que Abols no jogo anterior, convertendo um pênalti decisivo e mantendo seu time na briga para evitar o quinto título consecutivo do time da capital.
A batalha de Riga
O 6.º jogo final entrou para a história do hóquei letão. Definitivamente o dia 30 de março de 2007 será lembrado por muitos e muitos anos.
Após dois períodos tensos onde as defesas sobressaíram-se, a segunda linha do Riga 2000 decidiu a liga no tempo final. Edgars Brancis, famoso pelas assistências, inverteu seu papel com o fominha Girts Ankipans. Quando a defesa do ASK esperava mais um ato egoísta de Ankipans, esse preferiu o passe. Brancis não desperdiçou. Cinco minutos depois tudo voltaria ser como antes. Passe de Brancis e gol de Ankipans.
O tento de Ankipans desencadeou uma série de brigas. Frustrados com o placar adverso, Dmitrijs Kornilovs e Aleksandrs Terjohins se tornaram animais no gelo, socando quem estivesse de amarelo e branco pela frente. Mais três embates se seguiram. Após quase dez minutos de muitos socos e reclamações, a partida foi reiniciada. Com menos de três minutos para o final do tempo regulamentar, o ASK Ogre obteve uma vantagem numérica. Aproveitou e sacou do gelo seu goleiro, Imants Legzda. Com dois homens a mais no gelo, Kirils Ugarovs acabou diminuindo a distância.
Ainda restavam dois minutos de partida após o tento de Ugarovs. Várias tentativas que se seguiram pararam no jovem goleiro Martins Raitums. E após uma delas, o disco sobrou para o ídolo Artis Abols. Ele puxou um contra-ataque furioso e serviu seu companheiro Raimonds Danilics, que mandou para a rede vazia.
Teria sido tudo perfeito, mas Andrejs Lavrenovs acabaria acertando Danilics poucos segundos depois. Ele atingiu com o taco a cabeça do jogador logo após a sirene final. Esse ato covarde iniciou mais uma nova série de brigas envolvendo os dois times. Até a polícia foi chamada para prender Andrejs Lavrenovs. Mas o mesmo escapou no meio de tanta confusão.
O Riga 2000 recebeu a taça e comemorou a conquista do pentacampeonato. Mais tarde viria mais uma boa notícia: a suspensão de dois anos (!!!) para Lavrenovs e um ano para Dmitrijs Kornilovs e Aleksandrs Terjohins.
Os links da treta, cortesia do nosso bom amigo, YouTube: vídeo 1 e vídeo 2.
Elenco campeão
Goleiros: Martins Raitums, Ugis Avotins e Kristaps Zelcs.
Defensores: Maksims Sirokovs, Ilya Demidov, Renars Valters, Aigars Mironovics, Guntis Galvins, Kristaps Sotnieks, Janis Andersons, Ronalds Ozolins, Rodrigo Lavins, Jekabs Redlihs, Girts Zvirgzdins, Dmitrijs Orlovs, Ricards Birzins, Rihards Dombrovskis, Martins Gipters e Ilja Artjomenkovs.
Atacantes: Artis Abols, Andrejs Ignatovics, Edijs Brahmanis, Girts Ankipans, Aleksejs Hromcenkovs, Edgars Brancis, Raimonds Danilics, Edgars Zaltkovskis, Armands Berzins, Romans Nikitins, Aldis Abolins, Renars Undelis, Juris Galajevs, Jurijs Klujevskis, Andis Abolins, Janis Leitans, Roberts Bukarts, Nikolajs Jerofejevs, Artis Vazpins e Janis Ozolins.
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