Por: Mike Wise

A boa gente de Halifax — das províncias geladas do norte em geral — pode respirar aliviada. Seu garoto de ouro — o salvador do hóquei canadense, a total contradição a todo o espetáculo com que Alex Ovechkin repentinamente corrompeu seu esporte — segue em frente. A sublime atuação de Sid, com dois gols e três pontos, especialmente aquele em disparada que garantiu uma goleada no começo do terceiro período, colocou vários sorrisos de satisfação no rosto dos guardiões da pureza do hóquei. Mas sua atuação não foi tão importante na confecção desses sorrisos do que a visão de um russo vestido de vermelho brilhante que só quer aparecer indo para casa. Direto para Moscou — ou para o México; para eles tanto faz.

Terra da rainha 6, KGB 2.

O confronto entre Penguins e Capitals nunca foi apenas uma tremenda série dos playoffs da Copa Stanley apresentando as estrelas mais cintilantes da NHL e indo até o máximo de sete jogos, uma série cheia de suspense até o ignóbil fracasso do jogo 7. para Não, os tradicionalistas hard-core, que veem boa parte dos jogadores ultratalentosos do outro lado do Atlântico como nada mais que eurolixo, esta série serviu para validar sua xenofobia.

Sidney Crosby, o pacato garoto da roça de Nova Scotia, venceu; seu time de Pittsburgh está de volta às finais da Conferência Leste. Ovechkin, o semideus do YouTube que certa vez fingiu que seu taco estava pegando fogo após um gol, teve sua justa punição. Assim como certos confrontos na liga americana de cestobol representaram socialmente muito mais que o esporte, chegando a níveis incômodos de orgulho cívico e racial, o primeiro capítulo de Crosby contra Ovechkin engloba questões maiores, lugares aonde ninguém quer ir.

Depois que os dois times e os dois últimos MVPs da liga duelaram ao longo das duas últimas semanas, inoculando o produto de Gary Bettman com uma vacina para quaisquer preocupações remanescentes quanto ao interesse pós-locaute com um esporte veloz e furioso que é tão cativante em pessoa, um bom número de extremistas de ambos os lados não larga de suas posições ou seus sentimentos torpes quanto a Crosby e Ovechkin. Eles enchem-se de uma coragem gerada pelo anonimato do teclado e disparam pela Internet seus discursos rancorosos, dizendo que Ovechkin deveria atacar Crosby para machucá-lo de maneira permanente ou que Crosby representa tudo que é bom e certo no hóquei e Ovie, como no sentimento expressado por um imprudente garoto de 17 anos na semana passada, deveria simplesmente morrer. Ora, eles jogam hóquei; eles não extorquem pensão alimentícia ou mandam crianças para a guerra em lugares longínquos. Crosby levou a melhor sobre Ovechkin no jogo decisivo de uma série ultrairresistível. Só isso.

Na fila de cumprimentos depois do anticlimático final de seis meses de pura emoção, Ovechkin encontrou Sergei Gonchar, o jogador dos Penguins com quem ele colidira violentamente no jogo 4, e conversou com ele por um bom tempo, explicando-lhe como ele sentia muito por tê-lo contundido. E Crosby e Ovechkin acabaram por se encontrar no meio do gelo, Crosby tendo não só levado a melhor sobre seu rival em um jogo decisivo, como ainda assumindo a responsabilidade como apenas um jovem capitão e jogador de momentos decisivos conseguiria. É isso aí: jogador de momentos decisivos.

Depois do jogo 2, escrevi aqui que que Ovie era um jogador muito melhor sob pressão, sendo sua velocidade e explosão superiores a qualquer coisa que o mais calculista Crosby conseguiria demonstrar. Mas, depois de acompanhá-lo de perto por sete jogos, ver sua economia de movimentos fora da área, sua agressividade nos cantos e sua incomparável habilidade para entregar perfeitamente o disco para um colega em disparada, ele fica como o jogador mais importante neste momento de sua carreira.

É hora de um mea culpa. Não importa quão bom Ovechkin foi nas últimas duas semanas; ele não foi tão completo e versátil como Crosby foi quando sua temporada estava em jogo. Sid já ganhou sete séries de playoffs e logo mais disputará sua segunda final da Conferência Leste e possivelmente sua segunda final de Copa Stanley. O Grande Oito é incrível e o mais original, orgânico e empolgante jogador do esporte. Mas em 21 instigantes jogos de playoffs, seu time tem campanha de 1-2 em jogos 7, e, com a última derrota, ficaram a no mínimo um ano da primeira final de Copa da Era Ovechkin.

Isso não é nenhuma prova do que é melhor para o esporte — conservadores da América do Norte que cresceram em lagos congelados ou sensações goleadoras e distribuidoras de trancos do exterior. É só a verdade depois da noite mais perfeita que Crosby já aproveitou em sua jovem e brilhante carriera. Ovechkin foi uma supernova nesta série, mas Sid foi melhor. Juntos, eles somaram profanos 27 pontos — 16 gols e 11 assistências — em sete jogos. Eles disputaram três prorrogações e cinco jogos espetaculares que foram decididos por apenas um gol, e tiveram ambos um histórico hat trick para cada um no jogo 2. Como crianças que não querem parar de brincar de guerra de travesseiros, um deles teria de cair desmaiada antes de desistir.

Quando Ovie e os Capitals foram brutalmente eliminados na última noite de sua temporada por Crosby e um grupo de jogadores mais acostumados às agruras dos playoffs, Sid saiu vencedor do primeiro round de uma, espero, longa série de embates nos playoffs por vir. "Só de estar perto dele hoje, pelo olhar dele, dava para sentir", contou Eddie Johnston, de 73 anos, o ex-técnico dos Penguins, agora seu conselheiro para operações de hóquei. "Era hora do jogo." Eddie, é claro, disse que, se fosse começar um time hoje, Crosby seria sua primeira escolha. Era difícil discordar dele depois do jogo 7.

Simeon Varlamov, o goleiro de 21 anos dos Capitals, disse a jornalistas russos depois do jogo que ficou surpreso quando Crosby disse "Grande série" para ele na fila de cumprimentos: "Considerando que ele provavelmente marcou mais gols contra mim do que contra qualquer um nos playoffs. Pelo que ele fez nesta série, deveriam construir um monumento para ele." Talvez o maior elogio tenha vindo de Bruce Boudreau, o técnico do Washington, que já viu em sua vida um ou outro bom jogador canadense. "Sempre achei um grande jogador, mas não sabia quão grande", disse Boudreau, que, no começo da série, tinha chamado Crosby de segundo melhor jogador da liga. "Ele está sempre ligado. Ele não descansa nunca."

Crosby certamente não descansou durante o jogo 7 em Washington, quando essencialmente ele ninou e botou para dormir tranquilamente a nação que inventou o esporte. Até aquele momento, seu esporte estava a salvo daquele intrometido emocional que comemora seu grande sucesso de uma maneira tão pouco canadense.

Mike Wise é colunista do jornal Washington Post. O artigo original foi traduzido por Alexandre Giesbrecht.
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Página publicada em 15 de maio de 2009.