Por: Alexandre Giesbrecht

Eu tinha inúmeras coisas para falar sobre o duelo entre Sidney Crosby e Alex Ovechkin na série entre Penguins e Capitals, vencida pelos Pens com grande atuação de Crosby e perdida pelos Caps também com grande atuação de Ovechkin. Mas muito do que eu queria falar já foi escrito por Mike Wise, do jornal Washington Post, em artigo que traduzi para esta edição. Mesmo assim, ainda há o que falar, porque nem mesmo o mais fanático fã de hóquei poderia esperar um confronto tão empolgante — e falo de fã de hóquei porque há diversos fãs de um ou de outro jogador, que se preocupam mais em denegrir o adversário do que em exaltar seu respectivo ídolo, cegados por uma suposta "lealdade".

É claro que não foi só esse tipo de "fã" que criou um clima de animosidade antes de a série começar. A imprensa certamente jogou mais combustível no fogo, e mesmo alguns jogadores deram suas contribuições, ou alguém acha que os Penguins se esqueceram das declarações de Alexander Semin, no início da temporada, dando conta de que achava que Crosby não tinha nada de especial? Apesar desse clima, a série foi muito mais competitiva do que violenta. É verdade que a única contusão da série foi causada justamente por Ovechkin, em uma colisão com Sergei Gonchar, mas duvido muito que o russo tenha tentado voluntariamente machucar seu compatriota. Acho que muitas vezes, especialmente contra os Penguins, Ovechkin exagera em sua "caçada" aos adversários, principalmente depois de perceber que os árbitros deram-lhe passe livre para atravessar a fina linha do charging estabelecida pela regra 43.

Mas daí a dizer que ele é um jogador sujo vai uma enorme distância. De certa maneira, ele está aproveitando-se de sua velocidade, da mesma maneira que a usa para escapar de trancos que seriam certos mesmo em quem fosse bem mais rápido que François Leroux. Se ele tem uma motivação a mais para jogar contra os Penguins, certamente tem o respaldo a torcida, e os 14 pontos que marcou na série demonstram que isso não afeta em nada sua produtividade. Talvez a contusão de Gonchar sirva para ele controlar um pouco esse impulso, afinal, ao conversar longamente com o zagueiro na fila de cumprimentos, Ovie parecia claramente arrependido.

Voltando ao que interessa, que é o hóquei, esta série também serviu para deixar claro que comparar o estilo de ambos é tarefa das mais inglórias. Uma análise rápida dos jogos mostra que Ovechkin é uma máquina de chutar. Ele chuta de tudo quanto é lado. Fosse ele um Marcel Goc (dos Sharks; central com apenas dois gols em nada menos que 104 chutes), seria uma abominável característica. Como ele tem um aproveitamento de 12,2% nestes playoffs (maior que o da temporada regular, de 10,6%, e menor que o aproveitamento na série contra os Penguins, de 19,5%, por causa dos seus modestos três gols na primeira fase), talvez fosse até o caso de ele chutar ainda mais a gol. Com 90 ao longo das duas primeiras fase, ele tem 50% a mais chutes a gol que o segundo colocado, Evgeni Malkin, dos Pens, que teve 60.

Crosby, por outro lado, chutou predominantemente da boca do gol, e foi lá que ele fez o maior estrago: sete de seus oito gols na série contra os Capitals foram marcados ali, enquanto Ovechkin marcou da ponta esquerda, da ponta direita, do meio... Crosby também deu menos chutes, o que fez sua média subir: 25% na série e 21,8% nestes playoffs. Esses números fazem com que a comparação pareça plausível, mas vale destacar que são exceção na carreira de Crosby, já que sua média em jogos de temporada regular é de 14,1% e ele tem praticamente o dobro de assistências em relação a gols, ao contrário desta pós-temporada, quando está com três gols a mais que assistências. Isso talvez seja um indício de que, como Ovechkin, ele talvez dê ainda mais de si quando enfrenta os Capitals, algo com que o ex-técnico e atual consultor do time Eddie Johnston certamente concorda, ao menos no que se refere ao jogo 7: "Só de estar perto dele hoje, pelo olhar dele, dava para sentir. Era hora do jogo."

Ainda é cedo para saber se veremos novos capítulos dessa rivalidade em playoffs vindouros, até porque os Pens estão há quase 30 anos na mesma conferência que os Hurricanes (desde quando o Hartford Whalers deixou a WHA para entrar na NHL) e só agora eles se enfrentarão pela primeira vez em playoffs. Se as próximas vezes forem tão boas quanto esta foi, os amantes do hóquei certamente terão mais motivos para acompanhar a briga. E os trolls da Internet terão novos motivos para tentar manchar as reputações de dois grandes jogadores


Muito do que tenho visto nestes playoffs tem me dado uma forte sensação de déjà-vu. Mais precisamente, em relação aos playoffs de 1995. Não quero dizer que o hóquei esteja tão chato quanto o que foi consagrado naquele ano pelo New Jersey Devils. Mas as situações estão assombrosamente parecidas com muitas das que vimos naquela temporada. Vejamos:

• Penguis e Capitals enfrentaram-se, e os Caps abriram uma boa vantagem e tomaram mais tarde a virada, consolidada no jogo 7, com um gol em que o jogador disparou desde seu gelo sem encontrar adversário algum além do goleiro pela frente. Em 1995 o responsável por tal tento foi Norm Maciver (que mais tarde seria universalmente conhecido como o autor do último gol da história do Winnipeg Jets), em uma das sequências mais bizzaras da história da NHL; em 2009 foi Sidney Crosby quem marcou, com Miroslav Satan se esforçando (!) para roubar o disco de Alex Ovechkin num lance de desespero em vantagem numérica para os Penguins. Não consegui encontrar vídeo do gol de Maciver, mas tenho-o em uma fita antiga; falta apenas equipamento e know-how para colocá-lo no YouTube.

• Nessa mesma série de 1995, o goleiro Jim Carey surgiu naquela temporada como grande promessa, teve a terceira melhor média de gols da liga (2,13, atrás de Dominik Hasek e do inesquecível Rick Tabaracci, ambos com 2,11), mas sucumbiu diante dos Penguins. Simeon Varlamov, o raro russo com nome bíblico, não teve uma campanha tão brilhante durante a temporada regular, quando disputou apenas seis partidas, mas foi o grande responsável pela virada do time na primeira fase sobre os Rangers. Contra os Pens, começou bem, mas fracassou de maneira retumbante: em seus primeiros oito jogos nos playoffs, incluindo a série contra o time de Nova York, ele teve média de 1,64 gols sofridos por jogo. Nos cinco últimos jogos, essa média foi inflada como se por esteroides, passando a 4,27. Sua porcentagem de defesas também ruiu: de 94,2% nos oito primeiros jogos passou a 88,3% nos cinco últimos.

• Do outro lado da chave do Leste, os Bruins foram eliminados por uma zebra que não era tão zebra assim — os Hurricanes ainda têm em seu elenco boa parte do time que conquistou a Copa Stanley em 2005-06. Em 1995, esse papel coube aos Devils, que, apesar de finalistas do Leste no ano anterior, quando foram eliminados pelos campeões Rangers apenas na segunda prorrogação do jogo 7, estavam bem longe de ser considerados favoritos na série de primeira fase contra o Boston, quanto mais ao título que mais tarde conquistariam.

• É claro que as séries mencionadas de 1995 ocorreram na primeira fase, enquanto ambas as que citei em 2009 foram disputadas na segunda, mas uma série do Leste na primeira fase de 1995 teve muito a ver com uma série do Oeste na primeira fase do ano corrente. Duas semanas atrás os Sharks, donos da melhor campanha de sua conferência (e de toda a liga), foram eliminados em seis jogos logo de cara pelo oitavo colocado, o Anaheim Ducks, time que há duas temporadas patinou com a Copa Stanley. Catorze anos atrás, o Quebec Nordiques, melhor time do Leste na temporada regular, caiu, também em seis jogos, frente aos Rangers, campeões um ano antes, mas então relegados à oitava posição na conferência.

• A segunda fase de 1995 foi uma das menos parelhas de que se tem notícia: apenas um dos derrotados venceu uma única partida; os outros foram todos impiedosamente varridos. Em 2009, tivemos a segunda fase com o maior número de jogos da história, ao lado da de 2001: apenas uma das séries foi decidida em seis jogos; as outras chegaram todas à última e decisiva partida. Ou seja, as segundas fases de 1995 e 2009 são diametralmente opostas.

• Tanto em 1995 como em 2009 as finais do Leste envolveram Red Wings e Blackhawks. Os Hawks, aliás, chegaram a ambas as finais depois de derrotar os Canucks — estes, por sua vez, tiveram os Blues como adversários na primeira fase nas duas vezes. Já o Detroit em ambas as ocasiões derrotou um time californiano que estava entalado em sua garganta: os Ducks em 2009 e os Sharks em 1995. Os Ducks tinham vencido as duas últimas séries contra os Wings, e os Sharks em 1994 tinham eliminado o rival em um confronto de primeira fase em que eram os oitavos colocados.

Ok, nem tudo é exatamente igual ao que vi há catorze anos. Mas são muito mais coincidências do que eu já vi em quaisquer duas temporadas.

Alexandre Giesbrecht, 33 anos, acompanhou os jogos da série entre Pens e Caps no Pens Chat.
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Página publicada em 15 de maio de 2009.