Por: Marco Aurelio Lopes

Quando Keith Ballard descarregou sua frustração por mais um gol sofrido, acertando uma tacada no melhor estilo beisebol contra seu próprio goleiro, o que vimos foi apenas mais um capítulo bizarro em uma história repleta de fatos curiosos na história do Florida Panthers, que como se já não fosse surreal o suficiente, é uma equipe de hóquei no gelo sediada na ensolarada Miami...

Embora não fosse a primeira equipe da NHL localizada no sul dos Estados Unidos, e nem mesmo a primeira do próprio estado da Florida (que já havia recebido o Tampa Bay Lightning um ano antes), os Panthers acabaram por se tornar a história de maior sucesso dentre as equipes de expansão do início dos anos 90, contando à época com jogadores veteranos, com destaque para Scott Mellanby, Brian Skrudland, Ray Sheppard, Tom Fitzgerald e o ótimo goleiro John Vanbiesbrouck, e alguns promissores novatos como Rob Niedermayer e Ed Jovanovski. Essa base acabou dando aos Panthers um dos melhores inícios de uma equipe de expansão na história, conseguindo 83 pontos e ficando muito próximo de classificação aos playoffs, fato que viria dois anos depois.

Um ano que já começara com um fato inusitado, que acabou servindo para ilustrar aquela campanha. No primeiro jogo na Miami Arena, o atacante Scott Mellanby, ao ver um rato passeando pelo vestiário, não pensou duas vezes e desferiu seu taco contra o pobre bichinho. No jogo, Mellanby fez dois gols, Vanbiesbrouck chamou o fato de “rat trick” (parafraseando o termo “hat trick”) e a história correu o mundo. No jogo seguinte, ao invés de chapéus, a torcida começou a levar ratinhos de borracha. Mas ao contrário da tradição, a torcida nunca esperava o terceiro gol de um jogador, bastando um para que o brinquedinho chegasse ao gelo ao tocar da sirene. Como toda boa superstição do mundo do hóquei, os ratinhos foram vistos como sinal de boa sorte aos – quanta ironia – “cats” (apelido dos Panthers). O fato é que aquela foi a primeira temporada onde Florida se classificou aos playoffs, onde eliminou os tradicionais e favoritos Boston, Philadelphia e Pittsburgh, para ser o primeiro time da expansão dos anos 90 ao chegar à decisão da Copa Stanley. Onde enfrentou uma equipe que curiosamente também debutava na liga, o Colorado Avalanche (embora esse uma relocação vinda de Quebec). Mas dessa vez não houve ratos que dessem jeito, e o famoso gol de Uwe Krupp deu à varrida aos Avs e acabou com o sonho dos Panthers de levar a Copa.

Àquelas alturas, o número de ratos jogados a cada gol, já chegava a impensáveis 2.000, com o gelo se tornando um mar de ratos de borracha a cada gol, o que levava os adversários à loucura tamanha a demora para se tirarem todos eles do gelo. Bom, o fato é que passada a euforia da temporada 1995-96, os Panthers acabaram por proibir os ratos na arena, e apesar do bom começo da temporada 1996-97, e a segunda classificação aos playoffs, o time não passou da primeira rodada, perdendo para os Rangers de Wayne Gretzky, e hoje, 12 anos depois, somente retornou aos playoffs mais uma vez, em 2000, com nova varrida, dessa vez para os Devils. E pior ainda foi ver em 2004 seu rival estadual, o Tampa Bay Lightning, levar a Copa Stanley para o Estado Ensolarado. E três anos depois, os Ducks de Anaheim, que entraram na NHL ao mesmo tempo que os Panthers, também erguerem o Santo Graal do hóquei. Tudo isso possivelmente porque não há mais ratos perambulando pelos vestiários...

Não se classificar aos playoffs por tanto tempo, poderia ser visto como um alento para a equipe, no intuito de reconstruí-la a partir de uma boa base formada por altas escolhas no recrutamento. No entanto, manter seus talentos por muito tempo não parece ser marca registrada da equipe. Pegue trocas malsucedidas, por exemplo, como a que mandou Roberto Luongo para Vancouver, onde é ídolo e um dos melhores goleiros da liga, para receber Alex Auld (mais um eterno reserva cigano), ou a que mandou o pilar defensivo Ed Jovanovski para a mesma Vancouver anos antes, por Pavel Bure, craque mas que vivia às voltas com lesões, ou mais recentemente a que mandou o então capitão Olli Jokinen para Phoenix pelo esforçado Ballard.

Escolhas que não renderam o esperado também fazem parte da vida dos Panthers. Embora com tantos anos tendo escolhas altas, apenas Jovanovski e Jay Bouwmeester podem ser consideradas escolhas certeiras que deram a Florida um grande jogador. No demais, nomes apenas medianos, incapazes de formar um time competitivo, capaz de levar o time aos playoffs. E no melhor estilo bola de neve, elenco mediano não leva o time a lugar algum, a torcida se afasta, os jovens que não erguem o time acabam se tornando dispensáveis, e o time nunca consegue terminar sua reconstrução. Lugar comum na vida dos Panthers.

Falando em decisões equivocadas, não podemos esquecer a aposta feita na temproada passada, quando após passar boa parte da temporada na zona de classificação aos playoffs, o time apostou alto, e mesmo sofrendo o assédio dos rivais pela sua única estrela, o estupendo defensor Bouwmeester - que se tornaria agente livre ao final da temporada –, os Panthers acabaram por não negociá-lo no dia limite de trocas, correndo o risco de perdê-lo por nada. Aposta feita, aposta perdida. Com uma queda brusca na reta final, os Panthers sucumbiram à rotina de elminiações precoces, o sonho dos playoffs mais uma vez desmoronou, e aos Panthers restou o consolo de ao menos conseguir de Calgary uma escolha baixa no recrutamento para garantir aos Flames a preferência na assinatura do contrato. Se soubessem, poderiam ter conseguido prospectos de nível ou escolhas altas em recrutamentos, mas estamos falando do Florida Panthers, o time que parece sempre estar do lado errado da história.

Como um dia esteve Richard Zednik, em fevereiro de 2008, quando a sina de fatalidades dos Panthers atingiu seu nível mais dramático. Quando Jokinen colidiu com Clarke MacArthur dos Sabres, seu patim acabou por cortar a carótida de Zednik, que perdera quantidades absurdas de sangue, mas que felizmente foi atendido pronta e eficientemente pela equipe médica da arena em Buffalo e no hospital da cidade, impedindo que uma tragédia maior acontecesse. Aos poucos a condição de Zednik foi evoluindo, e no início da temporada seguinte, ele já estava de volta ao gelo. Mas aquela temporada de 2008 sem dúvida ficou marcada demais por aquela cena, mais um retrato das dificuldades dos Panthers ano a ano.

E esse show de horrores voltou a aparecer na última segunda feira, ainda que com uma face mais tragicômica, mas não menos assustadora. Mais um jogo, mais uma noite de frustração dos Panthers, que depois de um mau começo, começaram a engrenar, e o sonho da famosa vaga aos playoffs parecia começar a reacender. Mas a fase voltou a ser apenas regular, a colocação na tabela foi piorando, e uma viagem a Atlanta para enfrentar os Thrashers de Ilya Kovalchuk acabaram se tornando um verdadeiro tormento para Tomas Vokoun. Apenas pouco menos de 9 minutos, quando Kovalchuk marcou o segundo gol de Atlanta, dando-lhes a liderança por 2 a 1, Keith Ballard, mais conhecido por sua coleção de penalidades do que por suas habilidades com o manejo do taco, usou um método bastante comum de alívio do estresse entre jogadores de hóquei: amassar o taco contra a trave. Método comum mas perigoso, afinal, nunca se sabe o que pode acontecer com o taco nessas horas. Para piorar, Ballard ainda ensaiou uma tacada de beisebol, um autêntico “swing”. Mas ao contrário do “passatempo americano”, onde vc precisa acertar a bola, Ballard tinha que ter “errado” sua tacada. Mas não! Em um lance onde, justiça seja feita, ele não teve a intenção (e nem poderia, sejamos francos), sua tacada acertou em cheio o capacete de Vokoun, que se levantava após lamentar o gol sofrido.

O saldo? Bom, Vokoun saiu do jogo direto para o hospital com o ouvido lacerado, um susto enorme, e algumas partidas fora do time. Para Ballard, a mancha que vai ficar para sempre, a ridicularização do lance, e toda a gozação que sofrerá do próprio time. Ao menos, a impressão que fica é que os Panthers reagiram bem a tudo isso, não procurando crucificar Ballard, e ao invés disso lhe dando suporte, principalmente o atingido Vokoun. Mas não se pode negar o impacto que a notícia teve no mundo do hóquei. Os comentários vão de “imprudente” a “bizarro”. Há os que defendem até suspensão, há os que acham que foi incidente de jogo. Mas no fundo, o fato mostra que mais uma vez um fato estranho envolve o Florida Panthers, o time de hóquei no gelo em uma cidade tropical, onde a torcida joga ratos no gelo, os gerentes negociam suas estrelas, e agora, seus jogadores acertam os colegas. Coisas que só acontecem em Miami...

Marco Aurelio Lopes está em busca da paz interior. E de uma namorada.

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Página publicada em 2 de dezembro de 2009.