Stan Mikita não sabe quantos jogos disputou contra os Red Wings em seus 22 anos de carreira, mas os registros mostram que ele foi marcante. O membro do Salão da Fama é o maior artilheiro em temporada regular do Chicago em todos os tempos em jogos contra o Detroit, com 69 gols, 121 assistências e 190 pontos.

Mikita entende como ninguém a amarga rivalidade entre as duas franquias pertencentes ao grupo dos Seis Originais. Ele vivenciou toda essa história em média 14 vezes por temporada, algumas vezes no Chicago Stadium, outras no hostil Olympia Stadium.

Stanislaus Mikita disputou sua primeira temporada completa da NHL em 1959-60. E com um grupo de jogadores daquela qualidade, garantir uma vaga no elenco era um batalha árdua.

Momentos antes de participar de uma partida de golfe num agradável dia do último mês de novembro, Mikita reservou um tempo para responder a algumas questões sobre a rivalidade Blackhawks-Red Wings, e não demorou muito até ele chegar a uma história que desenvolveu com tanta clareza que parecia que o incidente tinha acontecido ontem.

"No início da minha carreira, tive um pequeno incidente com o Gordie (Howe) que me deixou até um pouco preocupado. Eu cometi um erro e acidentalmente provoquei um corte abaixo do seu queixo. Fui para acertá-lo nas mãos, mas o taco acabou saltando de suas luvas, subiu e o acertou perto do queixo e da bocheha. Ele não estava sangrando muito, apenas umas gotas. Gordie olhou para mim, tirou suas luvas, encostou os dedos em seu peito, olhou e viu sangue, apontou o dedo para mim e disse, 'Seu pirralho, vou te pegar.' Sendo apenas um garoto, eu disse a ele, 'Você é um velhote, vá procurar uma cadeira de rodas.'

"No intervalo, quando chegamos aos vestiários, próximo de mim estava o nosso ponta esquerda Ted Lindsay, que jogou por 16 anos em Detroit e conhecia o Gordie muito bem. Ele estava sentado perto de mim e disse 'Stanley, você não devia ter feito aquilo.' Eu disse que não tive a intenção de machucá-lo. Ted disse, 'Não, não foi isso. Aquilo foi um acidente. Estou falando quando você começou a gritar atrás dele e disse aquillo sobre ser um velhote. Gordie demora um bom tempo para esquecer dessas coisas, então tenha cuidado.' Olhando para trás, foi muito legal da parte Teddy ter me dito aquilo. Terminei o jogo e talvez tenha ocorrido alguma outra 'troca de elogios' com o Gordie.

"Nos quatro ou seis jogos seguintes contra o Detroit eu fiz questão de observar o Gordie, mas nada aconteceu. Até que mais tarde, durante uma noite em Detroit, lembro que eu estava no gelo indo em direção ao ataque e Gordie estava vindo pela outro lado do rinque. Nós nos cruzamos no meio do gelo. A próxima coisa que lembro é eu me arrastando até o banco. Alguém me acertou e me jogou longe. Fui parar no banco do Detroit. O jogo era em Detroit e os torcedores foram à loucura. Fiz então o caminho até o banco do Chicago e me sentei próximo a um rapaz chamado Denis DeJordy (o goleiro reserva). Ele me disse com seu sotaque francês, 'Ei, quer saber o número da placa do caminhão que te atropelou? Sou o único neste lugar que viu tudo o que aconteceu. Você foi até o fundo do rinque, fez a volta, e então ele te acertou um soco no rosto.' Eu não voltei ao gelo pelo restante daquele período.

"O Teddy olhou para mim e disse, 'Você já está quase empatado com ele. Seria bom você perguntá-lo se já está tudo resolvido, ou ele pode vir até você mais uma vez.'

"No período seguinte, vejo o Gordie e ele diz baixinho, 'Garoto, você aprendeu alguma coisa?', e vai embora. Fiquei olhando para ele pelo restante da partida. No terceiro jogo após aquele incidente, ele disse para mim, 'Acho que você aprendeu alguma coisa no último jogo,' e eu disse, 'Sim, senhor,' e aquela foi a primeira vez em que eu o chamei de senhor."

No retrospecto, Mikita teve sorte em jogar ao lado de Lindsay por muitas razões, uma vez que Lindsay já estava tranqüilo com sua carreira e com o sua vaga no Salão da Fama quando chegou aos Blackhawks, dispensado dos Red Wings pelo vingativo gerente geral Jack Adams, que havia discutido arduamente com o jogador e estrela do time.

"Quando eu estava em Chicago em 1959-60, na minha primeira temporada completa da liga, o Teddy foi o meu primeiro ponta esquerda," disse Mikita. "Ele teve uma brilhante carreira. Um grande homem, uma cara muito agressivo e às vezes hostil. Posso dizer isso agora porque ele está com 85 e não pode mais me pegar."

"Ele era o tipo de jogador que dava muito trabalho, jogando ao lado dele ou contra ele. Era o seu jeito. Não importava como ele fazia, ele entrava para ganhar. Ele era bastante tenaz, muito competitivo."

"Ele me deu pequena lição da qual nunca esquecerei. Eu perguntei, 'Teddy, você jogou por 16 anos. O que um cara como você tem de fazer para sobreviver por 16 anos na liga? Ele olhou para mim e disse, 'Garoto, acerte-os primeiro.' Eu disse 'OK,' e foi assim que eu joguei durante os meus primeiros quatro ou cinco anos na liga. Eles testam você e querem sempre te acertar."

Em 1960-61, Mikita estava no time que trouxe a Chicago sua terceira e última Copa Stanley. Para dar mais créditos àquela conquista, os Blackhawks tiveram que passar pelo Montreal nas semifinais e pelo Detroit na final, vencendo ambas as séries em seis jogos.

"Nós tinhamos que vencer o Montreal para chegar ainda mais longe, e nosso goleiro, Glenn Hall, fez o seu papel. Eu nunca vi um goleiro jogar tão bem em minha vida," disse Mikita. "Contra o Detroit, nós jogamos melhor. Terminamos a temporada na terceira posição e eles, na quarta."

"No jogo 6, eles abriram 1-0. Reg Fleming marcou o gol de empate, em desvantagem numérica, e Ab McDonald anotou o gol da vitória."

"Eu não acreditei nos apertos de mão. Após o jogo, fui ao vestiário e fiquei sentado embaixo do chuveiro. No meu caminho para fora da arena eu passei pelo vestiário do time visitante e encontrei o capitão deles, a quem dei os parabéns pela série. Depois, vi a comissão técnica e fiz a mesma coisa. Fiz aquilo uma hora após o jogo, quando já estava um pouco mais calmo."

"Nos tempos da liga de seis equipes, víamos uns aos outros umas 14 vezes durante o ano, então você podia de fato construir uma rivalidade sem ficar extremamente entusiasmado."

• Capa
• Editorial
• Faceoff
• Prorrogação
• Seqüência dos Devils é pura poesia
• Quando o copo transborda
• Técnico para quê?
• Tempo de sobra em Edmonton
• Não há páreo para os Sharks
• Avery, calado, é um poeta
• A rivalidade Hawks-Wings