Boa parte dos colunistas da nossa revista começou a acompanhar hóquei no gelo na época que se convencionou a chamar (por mim mesmo, e talvez tão somente) de "vanguarda" do hóquei sobre o gelo no Brasil. Nos anos 1990, as transmissões dos VT's das partidas eram passados em horários bastante complicados e a internet que tínhamos era a mesma que as de telefones celulares de uns cinco anos atrás. Talvez isso explique que acompanhar hóquei — NHL, especificamente — naquela época era uma coisa bem romântica mesmo. Ou explique que éramos um bando de malucos mesmo.
Conheci o esporte há uns 12 anos. Tarde, se comparado com outros por aqui. Em 1998, comprei um playstation que vinha com um cd de jogos demos. Lá tinha um joguinho chamado NHL Breakaway 98. A única coisa que me recordo desse jogo é que não consegui vencer uma partida sequer. O desafio era tão grande que fui à feira comprar o jogo na versão completa, já que falhei miseravelmente nas partidas de cinco minutos. Voltei para casa com o NHL 98 da EA Sports. Muito mais fácil de jogar, tinha um tal Detroit Red Wings logo de cara para escolher. Paixão instantânea.
Aqueles tempos não eram de vacas magras. Ao contrário: frangos gordos eram vendidos a R$ 1,00. Mas avaliar a economia por frango é um erro fatal e causa lapsos nas contas públicas. Alguns hereges criaram o tal Índice Big Mac para saber como anda o poder monetário de cada moeda. Tolos. O correto, como todos os economistas sérios e entendidos sabem, é avaliar o poderio econômico de uma nação pelo preço do Kinder Ovo. E pasmém, também custava apenas R$ 1,00!
Com tanta fartura, meu progenitor resolveu bancar uma assinatura da TVA. Os 20 e poucos canais quebravam um belo galho à epoca. Lá tive o primeiro contato com a ESPN. Enquanto assistia às entediantes chamadas para o campeonato de homem mais forte do mundo (com uns malucos carregando umas bolas de pedra), apareceu uma chamada para uma partida do Detroit Red Wings. Sim, aquele time que me fazia perder horas e horas, com os gols de Yzerman, Shanahan, Fedorov e companhia. Eu finalmente iria assistir àqueles caras.
Nem lembro o adversário. Era um timeco qualquer. Não me importava, eu estava feliz. Só me lembro de ser um jogo de temporada regular. Mas o ano ainda era 1998.
Em 1999, vi alguns jogos daquela série entre Red Wings x Avalanche. Via com muita atenção, já que fiquei sabendo do tal Bloodybath uns dois anos antes. Nunca fui um entusiasta das brigas no esporte, mas aquele time do Avalanche era, na cabeça do pequeno Fábio, o inimigo a ser batido. Se Kris Draper precisasse pegar uma metralhadora e sair atirando em cada um dos maus elementos, que assim o fizesse. A vingança seria feita.
Não lembro quais jogos daquela semifinal de conferência a ESPN transmitiu. Mas lembro-me de ter visto todos. E o mais amargo dessa série foi aquele fatídico jogo seis. A ESPN iria passar um VT da partida na quarta-feira à tarde. Pedi para meu irmão gravar a partida, já que estudava à tarde. Minha ansiedade era tanta que liguei no intervalo para saber quanto estava a partida. Como se recebesse a notícia de um falecimento ou de um término de namoro, meu pequeno mundo caiu ali. Nunca tive coragem de ver a íntegra daquela partida. Os Red Wings não poderiam falhar, não na minha memória, não na voz de André José Adler, não com aqueles golaços que eu via no NHL Power Week.
Assisti a diversos jogos e aprendi bastante naquela época. Vi grandes trancos de Darius Kasparaitis, grandes jogadas de Steve Yzerman, grandes defesas de Patrick Roy. Após o locaute da liga, todos nós ficamos órfãos e aprendemos a nos virar sem NHL na ESPN.
Os novos espectadores, que começarão a acompanhar a NHL nesta nova fase da ESPN, terão um contexto completamente daquele vivido por mim e por vários dos colunistas da TheSlot.com.br. Eles não dependerão de VT's e nem do NHL Power Week. Não conhecerão hóquei jogando Playstation I, nem ouvirão a narração de André José Adler e os comentários de Marco Alfaro. Hoje, temos um universo de informação acessível. Temos Playstation 3. Temos Everaldo Marques e Paulo Antunes.
Mas nenhuma das épocas é melhor do que a outra. São tempos totalmente diferentes e incomparáveis. Mas nessa reestreia da NHL na ESPN, um sentimento teremos em comum, velhos e novos espectadores: a paixão pelo hóquei.
Fabio Ivo Monteiro se tornou bacharel em Comunicação Social na semana passada.