Por: Alexandre Giesbrecht

Você já viu jogadores das categorias de base subir sem conhecer ninguém do time de cima. Sem os titulares o conhecerem. Mas ao menos sabiam o seu nome e, ao perguntar para a comissão técnica, poderiam ter alguma ideia de seu estilo de jogo. Essa situação ocorre dezenas de vezes ao longo de uma temporada da NHL, e não é incomum em outros esportes. O que é incomum é o que aconteceu com os Penguins no fim de semana passado, quando o quinto goleiro foi o responsável por tentar parar o potente ataque dos Canucks em Vancouver. O quinto goleiro, vocês devem imaginar, é um completo desconhecido para o elenco titular, que talvez sequer tenha ouvido falar dele.

Depois de experimentar uma série de contusões de seus defensores em novembro, agora foi a vez de os goleiros caírem um a um. Primeiro foi o titular Marc-André Fleury, que, com uma contusão num dedo da mão, ficou sem condições de jogo. Seu reserva imediato, Bret Johnson, também não estava disponível, com compromisso na enfermaria. Foi o que bastou para colocar John Curry na fogueira. Com apenas três jogos de experiência na NHL, todos na temporada passada, o terceiro goleiro dos Penguins foi escalado para defender o gol de seu time em Vancouver. "Mas, espere aí", devem estar se perguntando meus três leitores, "você não estava falando do quinto goleiro?"

Sim, estava. E, aliás, estou. É que o quarto goleiro, Brad Thiessen, reserva de Curry em Wilkes-Barre, estava, bem, em Wilkes-Barre. E o quinto goleiro, Alex Pechurski, que defende o Tri-City Americans, da WHL, joga em Kennewick, no estado de Washington, muito próximo a Vancouver. Ele assinou um contrato amador de emergência e foi escalado para a reserva de Curry, papel que deveria cumprir sem sair do banco. Pechurski nem tinha números ruins na WHL (4-1-1, com média de 1,84 gols sofridos 93,6% de defesas), mas, aos 19 anos, faltava-lhe a experiência, isso sem falar que ele chegou à América do Norte apenas no final de dezembro, vindo de sua Rússia natal, sequer fala inglês e tinha defendido os Americans na noite anterior. "Temos certeza de que ele consegue parar o disco se tiver de entrar", disse o técnico dos Pens, Dan Bylsma, antes da partida, mas pode ter certeza de que ele torcia para que o garoto não precisasse entrar.

Só que ele precisou. A experiência continua faltando, mas um gostinho ele já teve, às custas da péssima atuação de Curry. O titular dos Baby Pens sofreu cinco gols em apenas catorze chutes, incluindo três gols nos primeiros quatro minutos do segundo período, a bem da verdade números bastante prejudicados pela também péssima atuação do corpo defensivo à sua frente. Sem ter nem suas próprias proteções — teve de pegar emprestadas as de Fleury, pois as suas da WHL estavam além do tamanho máximo estipulado pela NHL —, Pechurski entrou na fogueira. Àquela altura, os Penguins perdiam por 5-1 e não tinham mais esperanças (não esperanças realistas, pelo menos) de sequer empatar o jogo, mas não seria difícil imaginar que a porteira continuaria aberta e uma goleada histórica estaria a caminho.

"Acho que precisávamos da troca, não importava quem fosse o reserva", explicou Bylsma, que tirou Curry aos quatro minutos e meio da segunda etapa. A 150.ª escolha do recrutamento de 2008, entretanto, mostrou-se à altura do que se esperava. Mostrou-se até melhor, aliás, considerando-se que mais da metade da torcida esperava que ele fosse mal (o resto não era tão otimista). Ele sofreu um gol quando em desvantagem numérica, mas parou os outros doze chutes que enfrentou.

"Fiquei muito surpreso", disse Pechurski, usando o zagueiro Sergei Gonchar com intérprete. "Eu não sabia que iria jogar, mas ao mesmo tempo fiquei feliz por ter uma chance de entrar no gelo. Jogar na NHL é como um sonho virando realidade. Foi duro, porque eu joguei [na noite anterior] e vim para cá, por isso não dormi muito, mas no jogo todos me ajudaram e me incentivaram, e senti-me confortável" O jovem goleiro russo devia ser o único jogador dos Penguins sorrindo ao fim do jogo, que terminou com o placar de 6-2. Ganhou elogios de Bylsma e de vários colegas, inclusive Crosby e Curry, e mostrou que o time tem razão em apostar que um dia ele terá uma chance na NHL que dure mais que um jogo, já que ele foi mandado de volta aos Americans em seguida.

Quando e se ele voltar à NHL, é bom que já tenha aprendido não só a falar inglês, mas também as práticas e costumes da liga. Uma das cenas mais engraçadas da temporada aconteceu depois de ele ser eleito a terceira estrela da partida: tiveram de explicar-lhe, com gestos, que ele deveria adentrar o gelo e dar uma volta, o que ele fez batendo palmas, num misto de gratidão e constrangimento.

Alexandre Giesbrecht, publicitário, vai voltar a enfrentar o caótico trânsito de São Paulo na hora do rush a partir da semana que vem.
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Página publicada em 22 de janeiro de 2010.