Por: Eduardo Costa

O Avangard Omsk foi do inferno ao paraíso inúmeras vezes nesta que é a primeira temporada da KHL. Óbvio que o ponto mais marcante, e lamentável, foi a morte de Alexei Cherepanov logo no início da competição. O trágico falecimento do talentoso jovem foi uma cruz pesada demais para o elenco. Meses depois o Avangard voltaria às manchetes quando o treinador canadense Wayne Fleming foi demitido no meio de uma partida contra o Vityaz Chekhov — mesma equipe que enfrentara o time de Omsk na noite em que Cherepanov faleceu. Fleming foi recontratado (!) horas depois. Jaromír Jágr, o dono do time dentro do gelo, convenceu a alta cúpula da Sibneft, companhia petrolífera que banca boa parte dos gastos do time, que Fleming ainda era o homem certo para o trabalho. Semanas depois Fleming foi novamente demitido, desta vez para valer. Pouco antes disso o arqueiro importado John Grahame teve seu contrato rescindido por motivos etílicos. Você sabe do que estou falando. Grahame exagerou, literalmente, na dose.

Considerado um dos times mais fortes do país, o Avangard só obteve a classificação aos playoffs no último dia da temporada regular, quando contou com a colaboração de um rival histórico: o já classificado Metallurg Magnitogorsk tinha que vencer o Severstal Cherepovets, que estava a um ponto do Avangard, para que Jágr, Alexander Svitov e cia. cravassem a 16.ª posição. Aos 59:04 de jogo Denis Khlystov deu a vitória ao Metallurg, dando também a última vaga ao Avangard. Para o time de Omsk, isso significaria um confronto com o melhor time da temporada regular.

Salavat Yulayev Ufa sofre com a zebra: a decepção é verde
Atual campeão russo, o Salavat foi a equipe que mais se reforçara nas férias. O atleta mais famoso a ser incorporado foi o ex-atacante dos Predators Alexander Radulov, que seria companheiro de linha do ex-Hab Alexander Perezhogin e de Alexei Tereschenko, esse último campeão nacional quatro vezes, continental em duas e mundial com a seleção russa em 2008. Na meta havia a segurança do selecionável arqueiro Aleksander Eremenko. Apesar de ter caído nas semifinais da liga dos campeões da Europa frente ao Metallurg, o time de Ufa correspondeu durante a temporada regular da KHL: em apenas oito dos 56 jogos disputados ele saiu do gelo sem pontuar.

A diferença na tabela entre Salavat e Avangard foi de napoleônicos 51 pontos, mas quando a série começou, Jágr, apenas o oitavo na tabela de artilheiros, resolveu mostrar seu arsenal. Perdendo por 2-1 na melhor de cinco, o Salavat foi a Ufa em busca de uma sobrevida. Nada feito. Um começo arrasador dos rubro-negros decretou uma das maiores zebras já vistas em solo russo. Alviverdes na lona. Ao combalido Avangard, o triunfo.

CSKA humilhado no clássico moscovita
O clube mais laureado do continente não foi páreo para o Dynamo Moscou. Enquanto seu rival citadino varria o Dinamo Riga, clube de Marcel Hossa, com facilidade retumbante nas oitavas- de-final, o CSKA teve que ir até uma caudalosa quinta partida contra o bom time do Lada Togliatti. Treinado por Vyacheslav Bykov, que também é o capo da seleção russa, o CSKA foi varrido com tanta violência que deixaria Suzane von Richthofen transbordando de inveja. O jogo 2 da série foi o mais vergonhoso: o time da classe policial sapecou 7-0 nos representantes das forças armadas. Para fechar a série, outros 5-1, com gols até mesmo do veterano Alexei Zhitnik. Poucas vezes em sua épica existência o CSKA foi tão achincalhado após uma série.

Ray Emery sucumbe à força dos tchecos do Metallurg
Interessante o confronto entre o time da cidade do aço e o Atlant Mytishchi, do ex-arqueiro dos Senators Ray Emery. Ambos os times chegaram aos duelo com boas reservas de energia. O Atlant havia varrido o Traktor Chelyabinsk, time treinado pelo ex-casca grossa da NHL Andrei Nazarov, em um duelo em que Emery foi vazado apenas duas vezes, uma delas pelo inominável Pierre Dagenais. O Torpedo Nizhny Novgorod também não foi páreo para o Metallurg, que chegou à série contra o time da região metropolitana de Moscou como zebra. Além de Emery, o Atlant contava com o artilheiro da temporada, Sergei Mozyakin, um habilidoso ponta de 28 anos que contabilizou 76 pontos em 56 cortejos na campanha.

Mas logo atrás de Mozyakin na tabela dos maiores pontuadores vinha Jan Marek, o tcheco ceifador de goleiros, principal arma ofensiva do "Magnitka". Mostrando que aquela série seria mesmo equilibrada, o primeiro jogo foi decido na prorrogação. Andrei Zubarev deu a vitória ao Atlant. O Metallurg clamou por sua linha tcheca. Só ela poderia reverter a desvantagem. Jaroslav Kudrna, Tomáš Rolinek e Marek não falharam. Três vitórias consecutivas mandaram Emery e seus comparsas para suas respectivas atividades recreativas. Nessa série até mesmo Vladimir Malenkikh, a garça das estepes, fez um bom papel para os vencedores.

Spartak comete uma heresia e paga o preço. Maldito seja!
A terceira força histórica do hóquei moscovita teve nervo suficiente para eliminar o SKA de São Petersburgo, o time de ninguém mais, ninguém menos que Darius Kasparaitis — ora, em uma edição em PDF ele não poderia faltar. Barry Smith, treinador da esquadra litorânea, tinham em mãos um elenco para brigar com o Spartak, mas Branko Radivojevic — sim, aquele mesmo — esteve intragável, sendo um pesadelo constante para Robert Esche. Nem mesmo o poder vulcânico de Kasparaitis e a experiência de Andrei Zyuzin, Sergei Brylin e Maxim Sushinsky evitou a varrida.

Mas as mãos que varrem sem remorsos são as mesmas que vão vergonhosamente ao rosto. O Spartak foi facilmente varrido pelo Lokomotiv Yaroslavl, atual vice-campeão nacional, na sequência dos playoffs. Os maquinistas têm como principal articulador o bipolar Alexei Yashin, que pelo menos na Rússia honra parte da grana que recebe. Centrando a linha do ex-campeão da Copa Stanley Josef Vašícek e do internacional tcheco Zbynek Irgl, Yashin passeou entre a defensiva rubra.

Ak Bars derruba a zebra rubro-negra
Voltamos ao Avangard para podermos encerrar essa missiva sobre as duas primeiras fases dos playoffs em grande estilo. O Avangard Omsk e a representação de Kazan já chegaram a duelar em uma finalíssima de Superliga (2005-06). Na oportunidade o Ak Bars levou a melhor utilizando algumas armas que ainda estão em sua posse. Zinetula Bilyaletdinov, o treinador quebra-línguas, já não conta mais com Sergei Zinoviev — transferido para o Dynamo Moscou —, mas dois terços da linha mais famosa da Europa nos últimos anos continuavam com a equipe do Tartaristão: Danis Zaripov e o indefectível ex-Penguin Aleksei Morozov.

Os tártaros varreram o único representante cazaque da KHL, para a infelicidade geral do meu amigo Igor Vasconcelos, o único anormal a torcer pelo Barys Astana por estas distantes bandas. A equipe de Astana contava com o maior número de fracassados já visto no hóquei. Figuras conhecidas de quem acompanha hóquei norte-americano há algum tempo, como Marc Lamothe, Tomáš Kloucek, Kevin Dallman, Trevor Letowski e Dan LaCouture. Fora fácil contra o Barys, mas na sequência, diante do Avangard, a chapa esquentou. Jágr e cia. chegaram a abrir 2-1 na melhor de cinco. Eles teriam a chance de fechar a urna do Ak Bars em casa, na bela Arena Omsk. Mas, amigos, algo de proporções catastróficas aconteceu naquele encontro.

Oleg Petrov, aquele mesmo que jogou nos Canadiens no século passado, arrombou a porteira e a boiada passou. Passou boi bandido, passou boi bumbá. Passou até meu ex-cunhado. Quando o primeiro período chegou ao final, o Ak Bars vencia por 6-0. Nos 40 minutos restantes o Avangard abriu a caixa de ferramentas. Morozov e o arisco finlandês Jukka Hentunen agradeceram. Quando o placar mostrava 9-0, Jágr deu a assistência para o gol de honra de Anton Malyshev. A orgia ofensiva dos tártaros não parou por aí: a sacanagem terminou em 11-1, placar para os anais da história do hóquei europeu. Em algum lugar do mundo Grahame gargalhava, certamente acompanhado de uma jarra de Velho Barreiro.

Muitos esperavam que o Avangard não teria força moral para reagir depois daquela chacina, na decisiva quinta partida. Mas o time mostrou brios naquela batalha. Em uma TatNeft Arena pintada de verde e vermelho, o Avangard esteve perto da façanha. Estavam tocando o céu com as mãos. Até que os deuses do hóquei serraram os pés da cadeira.

Jágr fez bonito no que pode ter sido seu último jogo pelo Avangard — a crise também chegou forte à KHL. Ele comandou uma virada que parecia definitiva. Por tudo que aconteceu com aquele time, por ter-se refeito após a humilhação de dias antes, e até mesmo pela memória de Cherepanov, reconheço que torci por eles. Mas o destino bateu forte no Avangard. Com 15 segundos restando, o linha azul Ilya Nikulin soltou uma bomba sem chance de resistência para Alexander Fomichev. O drama do banco do Avangard e a explosão da torcida em Kazan; tudo pode ser visto no YouTube. Seja indiferente se for capaz.

Agora, sim, moralmente destruído, o Avangard durou apenas dois minutos na prorrogação. O veterano Petrov selou a classificação do Ak Bars, encerrando ali a temporada de dramas e superação do time Omsk.

Quatro gigantes continuam na luta
As semifinais nos agraciam com duas séries entre presos pesados. Na primeira, Ak Bars e Dynamo Moscou voltam a medir forças. Habituais rivais em estâncias decisivas, fica complicado não dar favoritismo ao time de Kazan, mas é bom lembrar da invencibilidade e do grande momento vivido pelo artilheiro Matthias Weinhandl. Na outra chave, Metallurg e Lokomotiv reeditam a semifinal da temporada passada, quando Yashin e seus asseclas passaram sem problemas pelo time dos Urais. Hoje a coisa parece mais parelha. Eu jogaria uma moeda para decidir quem levará a melhor nesse confronto, mas estou duro. O resultado desse emparelhamento, e mais algumas facetas da segunda liga mais importante do mundo, estarão neste espaço em edições futuras. Isso é uma promessa. E, quando eu prometo, eu cumpro. Desde que eu me lembre, é claro.

Eduardo Costa ficou embasbacado quando viu uma prévia do que seria essa edição em PDF. Parabéns e obrigado a Alexandre Giesbrecht.
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Jaromir Jagr comandou a temporada de altos e baixos do Avangard Omsk na KHL.
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AФото с матча Ак Барс - Авангард (Омская обл.)
Источник галереи: Сайт КХЛ
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Página publicada em 25 de março de 2009.