Quando ao final da temporada 2005-06, os Penguins anunciaram que não renovariam o contrato de gerente geral Craig Patrick, a notícia pegou muitos de surpresa, já que Patrick era uma espécie de celebridade em Pittsburgh, por ter sido o mentor por trás da montagem dos times campeões de 91 e 92, além de ter dado aos Penguins o respeito que a franquia jamais teve. Quando foi anunciado o nome de Ray Shero como seu substituto, houve mais surpresa ainda, já que Shero jamais havia tido experiência como gerente geral na NHL, embora tenha sido assistente nas jovens franquias de Ottawa e Nashville. Ao menos, Shero trazia para a mesa o “pedigree” de ser filho do lendário Fred Shero, técnico dos Philadelphia Flyers na época dos “Broad Street Bullies”, campeões em 74 e 75.
Claro que ajudou muito para o seu crescimento na organização o fato dos Penguins terem uma equipe sabidamente projetada para o futuro, vindo de sucessivas temporadas medíocres, o que gerou sucessivas escolhas altas no recrutamento. Quando assumiu o comando do time, Sidney Crosby concluía sua primeira temporada, e a expectativa era em torno da estréia do russo Evgeni Malkin, os pilares da nova geração dos Penguins. E mais um desses pilares veio no primeiro recrutamento de Shero, que com a segunda escolha selecionou Jordan Staal, então apenas o irmão mais novo de Eric Staal dos Hurricanes. E pela primeira vez a estrela do jovem gerente brilhou. Após uma tremenda pré-temporada, Staal, com apenas 18 anos, acabou sendo confirmado no elenco principal dos Penguins, e marcou 29 gols em sua primeira temporada. Some-se a isto a estréia sensacional de Malkin, a consolidação de Crosby como estrela em ascensão, e a nova filosofia implantada pelo treinador Michel Therrien, e os Penguins mais que dobraram seu número de vitórias da temporada anterior, garantindo assim seu retorno aos playoffs. Embora a pós-temporada tenha durado apenas 5 jogos, Ray Shero também já mostrara seu faro agressivo para a montagem do time, ao adquirir os veteranos Gary Roberts e Georges Laraque, adicionando um elemento de dureza que o jovem elenco não tinha.
Veio a temporada 2007-2008, e os Penguins buscaram no mercado o veterano asa Petr Sykora, campeão com os Devils em 2000. A base estava pronta, e quando Sidney Crosby e Marc-Andre Fleury, o então questionado goleiro, que finalmente começava a justificar seu status de primeira escolha geral, acabaram perdendo boa parte da temporada por lesões, Malkin e Ty Conklin, um eterno goleiro reserva carregaram o time, e mostraram que os Penguins eram sim uma nova força da NHL, e a mensagem foi enviada no limite de trocas da temporada, quando Ray Shero surpreendeu o mundo e adquiriu a grande jóia daquele dia, Marian Hossa (junto com o atacante defensivo Pascal Dupuis), em troca dos jovens Colby Armstrong e Erik Christensen, além do altamente considerado prospecto Angelo Esposito. A negociação, que desagradou a muitos, visto que os 3 poderiam contribuir com o futuro do time, ao passo que Hossa era apenas um jogador de aluguel, mas mostrou o quanto Shero confiava no potencial do time, e sabia que poderiam brigar sim pela Copa. Some-se a esta a aquisição de Hal Gill, o gigantesco mas questionado defensor de Toronto, e os Penguins estavam prontos.
Com esse elenco, os Penguins recuperaram o título da divisão do Atlântico, e atropelando Senators, Rangers e Flyers, perdendo apenas 2 jogos no caminho, chegaram a uma até então improvável decisão da Copa Stanley. Finalmente a experiência pesou, e os Penguins sucumbiram em 6 jogos ante os poderosos e calejados Detroit Red Wings. Mas o projeto para fazer os Penguins novamente campeões se mostrou mais do que na trilha certa. Na verdade, o projeto nem contava com a ascensão e maturação tão rápida do elenco, e as finais em 2008 foram realmente não estava nos planos. Pelo menos nos planos dos torcedores, que talvez imaginassem 2008 como sendo o retorno dos Penguins à pós-temporada. Mas esses mesmos torcedores também não esperavam que 2007 fosse o ano desse retorno. Podia-se dizer que o time estava 1 ano à frente do seu projeto.
Durante a pré-temporada de 2008-09 Ray Shero teve seu grande desafio: manter o máximo possível de jogadores de um elenco que ficou a apenas duas vitórias de ganhar a Copa Stanley, renovar suas principais estrelas, que já não teriam mais a proteção dos contratos de 3 temporadas para os calouros, e tentar manter Hossa em Pittsburgh. Aos poucos, o time foi perdendo peças para o mercado de agentes livres, e nomes com Roberts, Laraque, Jarkko Ruutu, procuraram outras equipes. Se não eram os astros, ao menos eram jogadores experientes – os chamados utilitários – que todo time precisa. A perda de Ryan Malone também foi muito contestada, já que este era um dos que conseguia se salvar na mediocridade dos Penguins de temporadas passadas, e era tido como o “herói local”, nascido na Pennsylvania, sem falar que teve uma bela temporada jogando ao lado de Malkin. Mas o teto salarial pesou e Shero acabou liberando-o para Tampa Bay. E o golpe final veio quando Marian Hossa optou por assinar com Detroit, ainda que por um ano, recusando uma oferta vantajosa dos Penguins. O futuro parecia sombrio para o time, já que a reposição – mais precisamente Ruslan Fedotenko, Miro Satan e Matt Cooke – não parecia capaz de suprir a ausência destes jogadores.
Ao menos a decantada base para o futuro ia sendo preservada. Um a um, Crosby, Malkin, Fleury, Orpik, Staal, Whitney iam ampliando seus contratos por longos períodos, garantindo que o núcleo dos Penguins estaria intacto por várias temporadas. E foi essa manutenção dos seus jovens que aliviou um pouco a carga de críticas sobre Shero por não ter conseguido manter Hossa no elenco, já que se o eslovaco continuasse na equipe, certamente não haveria espaço no teto salarial para segurar todo mundo. No entanto, as críticas voltaram junto com a onda de maus resultados na equipe, que depois de um bom início, despencou aos confins da décima colocação na conferência Leste já no mês de fevereiro, virtualmente eliminado da pós-temporada. Foi quando Shero mais uma vez surpreendeu, primeiro, ao demitir otécnico Michel Therrien,que já não era mais uma unanimidade no vestiário, e substituí-lo pelo então desconhecido Dan Bylsma, ex-jogador mediano que treinava com certo sucesso a equipe afiliada dos Penguins na AHL em Wilkes-Barre/Scranton. E depois ao negociar Ryan Whitney, um dos pilares da equipe, mas que ainda não havia retomado sua famosa produção ofensiva depois de retornar de operação – perdendo espaço para Kris Letang, seu substituto no quinteto de vantagem numérica –, para o Anaheim Ducks, em troca do aguerrido Chris Kunitz. As mudanças surtiram efeito, o estilo mais solto de Bylsma encaixou bem no estilo de jogo do elenco, e a entrada de Kunitz deu a Sidney Crosby um jogador que faria o “serviço sujo” na sua linha, elemento que faltava a Sid.
Mas ainda faltava mais, e Ray Shero não se intimidou, e foi buscar nos Islanders a experiência que faltava em Bill Guerin, veterano que já havia vencido a Copa no distante 1995, mas que ainda poderia contribuir com liderança e pontos. Estava formada assim a primeira linha dos Penguins, e Crosby finalmente podia se vangloriar de ter a seu lado dois asas confiáveis. Com o ressurgimento de Fedotenko ao lado de Malkin, Staal se estabelecendo como um bom atacante defensivo, e os Penguins pareciam estar moldados para brigar por uma vaga na pós-temporada. Vaga que foi conquistada após uma seqüência de vitórias, combinada com a queda de adversários diretos, e principalmente, devido à retomada de um padrão de jogo que traduzia mais fielmente a eterna vocação ofensiva dos Penguins. Não só a vaga foi conquistada, como também os Penguins chegaram à quarta colocação no Leste, suficiente para ganhar ainda o mando de gelo na primeira rodada, contra o eterno rival Philadelphia.
Na pós-temporada, os Flyers sucumbiram em 6 jogos, e o duelo tão aguardado contra os Capitals de Alex Ovechkin foi a prova de fogo para esse elenco, que ainda buscava se afirmar de vez como candidato ao título. A vitória no jogo 7, em Washington, mostrou que o time podia sim repetir a visita às finais. A fácil vitória sobre Carolina colocou os Penguins novamente no caminho dos Red Wings, em uma re-edição das finais do ano anterior. Independente do resultado, o plano de Ray Shero já mostrava seu sucesso. O título conquistado em Detroit coroou de vez os Penguins como novos campeões da NHL, e deu a Ray Shero seu primeiro título como gerente geral.
Em 4 temporadas à frente da equipe, Ray Shero mostrou a competência para mover as peças do elenco com sabedoria. Encarou as dificuldades da reconstrução de um elenco baseado em jovens, lidou com o teto salarial, e com talento e sorte, qualidades indispensáveis para um gerente de sucesso, fez com que as decisões que foram questionadas no início se mostrassem corretas no final. No entanto, Shero já sabe que a partir de julho novas decisões serão tomadas, com novos agentes livres (entre eles, Rob Scuderi, o mais valorizado deles após as finais), e outros jogadores também disponíveis no mercado. Mas se até agora, as escolhas foram acertadas, não duvide que serão também desta vez.
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