Por: Eduardo Costa

Tinha tudo para dar errado. E foi o que aconteceu.

Bem antes de 82 aparições provarem as suspeitas de muitos, a alta cúpula do Tampa Bay Lightning deu a Denis Savard um companheiro na fila dos treinadores demitidos nessa campanha. Após míseros 16 jogos, a página Barry Melrose foi virada na Flórida. Em algum lugar do planeta Terra John Tortorella está gargalhando diabolicamente.

Mas, a gerência dos Bolts acertou ou errou em demitir Barry Melrose com tanto ainda por jogar? Muita gente está dividida, mas o certo é que não há inocentes no patético desfecho da curtíssima era Melrose em Tampa. Nada de casualidade aqui, apenas um cenário que apodreceu um pouco, bem pouco, antes do esperado.

Óbvio que boa parte da imprensa mainstream(?) derrama Nilos de lágrimas pelo "Mullet", em especial os integrantes da ESPN, ex-empregadora do agora ex-treinador. John Buccigross & cia. condenam sem cerimônia os dois proprietários da franquia. Sim, Oren Koules e Len Barrie despejaram incoerências e inaptidão desde que adquiriram os Bolts em fevereiro desse ano. Eles apenas tentaram corrigir a besteira que haviam feito quando contrataram Melrose.

Tortorella, ao ser demitido sem cerimônia pelos novos donos, utilizou munição pesada para criticar seus algozes. Palavras movidas pela amargura de um recém-demitido? Sem dúvida. Mas o único homem a levar a uma equipe do estado a um título da Copa Stanley estava mais do que certo quando disse que o rumo que o time estava tomando era nebuloso com os "dois cowboys" no comando.

Nenhuma equipe mudou tanto seu elenco em relação à temporada passada quanto o Lightning. A cada dia um novo rumor aparecia, e sempre se mostrava mais do que isso no final das contas. Muita gente chegou. Cometeram a heresia de darem um contrato de US$ 31,5 milhões para Ryan Malone. Em 14 embates o ex-Penguins contabiliza apenas três pontos. Seguindo essa média bisonha, terá 16 no final da temporada, o que significaria que cada ponto seu custará mais que US$ 280.000! Mesmo que ele volte a apresentar uma produção como a da época em que atuava em Pittsburgh, seu custo já seria elevado.

Mark Recchi e Gary Roberts? Há oito anos seriam contratações de peso. Atualmente foram aquisições de cunho midiático apenas.

Os dois defensores mais confiáveis e talentosos ganharam novos lares. Pergunte aos torcedores do Ottawa Senators e do San Jose Sharks se eles estão felizes com os rendimentos de Filip Kuba e Dan Boyle, respectivamente. Aposto que a resposta será muito positiva. Por falar em Boyle, o linha azul foi outro que saiu chutando o balde pela forma com que foi tratado pela nova gerência. Assim como Tortorella, ele também teve papel importante na conquista de 2004.

Em troca de Boyle, veio Matt Carle. Poucas aparições depois o ex-defensor dos Sharks já foi envolvido em uma troca com o Philadelphia Flyers. O velho problema dos muitos chutes contra continuou não solucionado. Mike Smith e Olaf Kolzig merecem aplausos por manterem a coisa em um patamar não caótico — a campanha do time ainda não é ruim o suficiente para dá-los como mortos.

Todos os setores do time tiveram elevada quota de alterações. No nosso Guia desta temporada desafiávamos o enferrujado Melrose a transformar tudo isso em um conjunto. Era trabalho árduo até mesmo para treinadores de gabarito, o que dirá então para um de apenas três temporadas atrás no banco da NHL.

Acionando o túnel do tempo, lembramos que a aventura atrás do banco, na maior das ligas, começou de forma agradável para Melrose — amparado na genialidade de Wayne Gretzky e Luc Robitaille. Ele esperava uma chance nos Red Wings, equipe na qual ele encerrou sua pífia carreira como jogador na NHL. Mas a oportunidade veio em Los Angeles. Logo em sua primeira temporada foi finalista da Copa Stanley. Após vencer o jogo 1 em no Fórum de Montreal, os Kings foram vítimas da excelência dos Canadiens em prorrogações. Os três embates seguidos foram perdidos no tempo extra para o time de Jack Demers, o que praticamente decidiu a sorte daquela final.

Mas as duas temporadas seguintes foram dominadas por insucessos. Fora dos playoffs em ambas, Melrose foi para as cabines, de onde só saiu há poucos meses. Vivendo a glória de ter treinado Gretzky em sua última aparição em uma final e por ter um corte de cabelo esdrúxulo.

Chegamos então a sua recente e curtíssima estadia em Tampa, que foi marcada pelo péssimo ambiente no vestiário. Desde Praga, na República Tcheca, onde os Bolts abriram a temporada contra o New York Rangers, até sua entrevista pós-demissão, Melrose questionou o caráter e a entrega do seus ex-comandados.

Após a derrota por 2-1, no segundo jogo no Velho Continente, Melrose começou a cavar sua sepultura: "Meu maior problema é que eu não posso usar a linha de (Chris) Gratton em todos os turnos", ele disse. "É provavelmente a linha menos cara que enviamos para o gelo, mas é por demais, a melhor linha nesses dois jogos até agora. Espero que meus jogadores sintam-se envergonhados do que têm mostrado".

Traduzindo, as críticas de Melrose batiam forte em Vincent Lecavalier e Martin St. Louis. Logo no começo de seu ciclo ele detonava publicamente as vacas sagradas do elenco. Agiu mais como um torcedor do que como um profissional, membro da comissão técnica. E isso não parou ali. Após cada atuação ruim do time, lá ia Melrose colocar a culpa da derrota em seus atacantes estrelas. De forma pública e clara.

Lecavalier, de tanto escutar, resolveu abrir a boca e reclamar que seu tempo de gelo diminuiu em relação às últimas temporadas. E por falar em tempo de jogo, chegamos ao ex-futuro vencedor do Troféu Calder, Steven Stamkos. Essa expressão eu tirei do texto do nosso honorável colega Humberto Fernandes. A luzente missiva de Fernandes expõe todo o desgaste que a pouca utilização da jovem estrela causou na organização. Isso também pesou muito na demissão de Melrose.

Assistindo aos jogos dos Bolts durante esses meses de temporada, não conseguimos identificar qual o plano de jogo. Em qual sistema, modelo ou, pelo menos, tendência o jogo do time se enquadrava. Quando não se tem conjunto e nem idéias decentes vindo do banco, a coisa só pode terminar mal. Então três anos de contrato viraram 16 jogos. Simples assim.

Em entrevista ao Tampa Tribune, Koules disse que Melrose já estava na corda bamba há algumas semanas. Os resultados de novembro não ajudaram a causa. Cinco derrotas em sete jogos. O time até esteve perto de quebrar uma seqüência negativa quando abriu 2-0 contra os Red Wings no último dia 13, mas a virada da equipe de Michigan foi o que faltava para a decisão ser tomada.

Ao sair, mais estrume no ventilador, com direito a menção honrosa a Radim Vrbata — em parte merecida, é verdade, afinal Melrose não entra no gelo para concluir as jogadas. Com isso fica muito difícil imaginar Melrose recebendo outra chance de treinar um time da NHL. Será complicado tirar esse rotundo fracasso do currículo.

Voltando então à alta cúpula — tão ou ainda mais incompetente. Quem eles escolheram para comandar a nau, de forma interina? Rick Tocchet. Dono de ficha criminal e de uma carreira não muito prodigiosa como assistente técnico, fica difícil imaginar que ele será o responsável por uma mudança significativa. Mais. Um. Erro.

Quanto a Barry Melrose, seu desemprego pode não durar muito. Uma publicação de hóquei da América Latina já recebeu o Curriculum Vitae do ex-analista. Existem rumores que o cargo de operador de empilhadeira do Parque Gráfico da revista, hoje disponível, estará ocupado em breve.

Eduardo Costa deseja pronta recuperação a Humberto Fernandes, o inigualável.
AP
Em primeiro plano o demitido; ao fundo seu sucessor. Escolhas aquivocadas continuam acontecendo em Tampa.
Edição Atual | Edições anteriores | Sobre TheSlot.com.br | Comunidade no Orkut | Contato
© 2002-08 TheSlot.com.br. Todos os direitos reservados. Permitida a reprodução do conteúdo escrito, desde que citados autor e fonte.
Página publicada em 19 de novembro de 2008.