5 de junho de 2002
Constantino: Considerações sobre Wings x Avalanche

Por Marcelo Constantino

Vamos esquecer o jogo 7 entre Detroit Red Wings e Colorado Avalanche; este foi atípico, ficou fora da média.

Foi a melhor série de playoffs dos últimos anos. Hóquei de primeira qualidade, tanto ofensiva como defensivamente. É fato que na maior parte dos jogos ocorreu uma grande batalha entre as defesas principalmente, mas como não pensar na retaguarda quando se enfrenta o maior rival pela frente, além de ser considerado o grande obstáculo ao título?

O Detroit Red Wings foi construído no último verão norte-americano para ganhar o título hoje, nesta temporada. A próxima está longe e deverá ser tarde demais. O Colorado Avalanche, que tem em Joe Sakic seu maior líder, na casa dos 31 anos de idade, é time para uma dinastia. Com a impressionante quantidade de bons novatos que conseguem a cada ano, ainda deverão ser favoritos pelos próximos cinco a oito anos.

Esta é provavelmente a última chance de alguns jogadores (re)conquistarem a Stanley Cup. Hasek, Larionov, Hull, Duchesne, Chelios, Robitaille, Yzerman... todos estão muito próximos do final da carreira e o ano seguinte será pesado demais para vencer se neste o insucesso prevalecer. Pode parecer estranho, mas eu creio que os Wings sejam mais competitivos no próximo ano vencendo este ano do que perdendo. A injeção de jovens jogadores no time este ano ocorreu como há muito tempo não se via, a ponto de disputarmos os playoffs com ao menos um novato permanente, Pavel Datsyuk ou Jason Williams. Na próxima temporada, ambos terão mais tempo de gelo, além do queridinho de Detroit, Sean Avery, e outros prospectos que deverão subir para suprir a saída de boa parte dos jogadores com mais de 35 anos do time.

De fato, os Wings foram incisivos na obtenção de grande armas antes desta pré-temporada, sendo Hasek a principal delas. Entretanto, todas as armas tinham mais de 35 anos de idade, o que dava um caráter de "última chance" a este grupo. Até porque este é o último ano de Larionov, talvez fosse o último de Chelios — não fosse sua temporada espetacular — e é o último ano de contrato de Duchesne com o clube. Brett Hull ficou um bom tempo disponível no mercado até que o Detroit o contratasse. E, se o elenco do clube de Hockeytown é uma constelação de futuros integrantes do Salão da Fama, o elenco dos Avs também o é.

Rob Blake pode não ser o melhor defensor da NHL, mas seguramente é um dos cinco melhores. Roy é o maior goleiro da história, restam poucas dúvidas de que Sakic é o melhor central da atualidade e Forsberg, além de provavelmente ser o jogador mais completo da liga, é o MVP desses playoffs.

Não foi qualquer time que o Detroit venceu, foi este aí de cima. Os Wings podem ter uma variedade maior de bons jogadores — e de fato têm. Mas inexiste essa história de que o Colorado só possui duas linhas e que basta anular seus dois principais centrais. Sakic, Forsberg, Hejduk, Drury, Reinprecht, Tanguay, Keane, Hinote, Yelle... pronto, no mínimo se formam três excelentes linhas com estes jogadores.

É fato que há algum tempo não há como dizer quem é a primeira, segunda, terceira e quarta linhas do Detroit, simplesmente porque não há ordem hierárquica. Evidente que uma linha com Yzerman, Fedorov e Shanahan é a número 1, mas qual seria a segunda? A de Brett Hull, a de Luc Robiltaille ou a grind line? Difícil dizer. Talvez a diferença esteja mesmo aí. Jogadores como McCarty e Holmstrom tiveram sete gols somados, enquanto as armas "secundárias" do Avalanche não funcionaram.

Na quarta-feira da semana retrasada, jogo 3, era perceptível que o time do Colorado ficara cansado na prorrogação. Era o terceiro jogo em seis dias. No jogo seguinte já foi diferente, com um espaço de três dias, e não dois, e o Avalanche venceu o jogo 4. Pela lógica, sendo o decisivo jogo 6 também numa quarta-feira, eles estariam cansados também. E estavam. Agora, o time chamado de "veterano" e "experiente" quando a imprensa não quer chamar de "velho" é o Detroit, não o Colorado. De fato, o time de Denver vinha de duas séries difíceis, ambas chegando ao derradeiro jogo, o que gera desgaste físico e psicológico. Mas não justifica o cansaço nitidamente maior frente aos jogadores dos Wings, a maioria com mais de 30 anos e uma mão cheia de outros com mais de 35.

É fato também que as contusões atrapalharam e muito o time do Colorado. Keane, Hinote, Tanguay, Yelle tiveram de sair. Blake jogou machucado. Do lado dos Wings, Yzerman jogou praticamente com uma perna só, Larionov teve de sair por alguns jogos e ainda houve pequenas contusões com Shanahan e Hull. Acontece que meio Yzerman e meio Blake valem mais que qualquer reserva disponível.

Se as contusões dão a impressão de que os Wings foram mais violentos, é puro engano. De um modo geral, as jogadas foram normais, com lances mais ríspidos aqui e ali, típicos de playoffs. Nada de golpes baixos. É bem verdade que, sabendo que o adversário está machucado, o jogador geralmente fica mais ouriçado em alvejar o ponto em questão. Isso não aconteceu de forma incisiva, até porque Hartley nunca colocou Scott Parker no gelo, o que seria interpretado em Detroit como uma tentativa de eliminar Yzerman da série.

Apenas um exemplo, a que eu pude assistir: Yelle contundiu-se duas vezes. Uma delas por conta de um forte tranco de Maltby que o jogou na borda do banco dos jogadores. Outra, num empurrão, soco, semi-choque-cruzado, seja lá o que tenha sido, de Steve Duchesne, pouco tempo depois de levantar o capitão do Detroit com uma entrada nas pernas dele, no jogo 6. Yelle caiu de mau jeito e isso que provocou sua pior contusão, não a entrada em si.

Times especiais -- A vantagem numérica dos Wings levou clara desvantagem em relação à do Avalanche. Desconsiderando os dois gols na atípica partida final, a vantagem numérica do Detroit foi pífia, marcando somente em momentos de grande sorte. Ao menos o time especial do Detroit que defendia penalidades foi corrigido ao longo da série e terminou sem levar gols nas três últimas partidas.

Quando se perguntava a cada time o que seria necessário para vencer a partida seguinte, sempre se ouvia de ambos a mesma coisa: "mais do mesmo". Com uma correção aqui e ali, como melhorar os times especiais e sair na frente do placar, para o Detroit, e abrir maior vantagem, segurar o placar e mandar mais chutes a gol, para o Colorado. Ou seja, de fato ambos estavam muito bem, com pequenos problemas pontuais.

O jogo 7 -- Era um jogo de tabus, e a ESPN nos presenteou com vários deles: o Colorado estava havia quatro jogos 7 sem perder e o último jogo decisivo assim do Detroit foi em 1996, contra o St. Louis Blues, palco do lendário gol de Steve Yzerman na segunda prorrogação.

Do lado do Colorado, nenhum time havia conseguido vencer três vezes um jogo 7 num mesmo ano — os Avs poderiam ser os primeiros da história —; Scott Bowman nunca havia perdido uma série de playoffs três vezes para um mesmo técnico — Bob Hartley poderia ser o primeiro, já que havia vencido em 1999 e 2000. Nada disso foi quebrado.

Quem quebrou tabus foi o Detroit. Jamais a diferença de gols num jogo 7 foi superior a seis. Patrick Roy nunca havia sido sacado do gol num jogo 7.

Marcelo Constantino Monteiro parabeniza o Detroit Red Wings e o Colorado Avalanche pelo espetáculo proporcionado durante a série.
ELE FECHOU O GOL Dominik Hasek não precisou ser espetacular no jogo 7 (Mandi Wright/Detroit Free Press - 31/05/2002)
 
ELE NÃO Patrick Roy precisou — mas não o foi (Mandi Wright/Detroit Free Press - 31/05/2002)
 
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Página publicada em 3 de junho de 2002.