Os Penguins não mereciam levar este jogo para a prorrogação. Mas Marc-André Fleury merecia, e tanto merecia que carregou o time até lá praticamente sozinho. Os Penguins não mereciam ganhar este jogo. Mas Fleury merecia e foi mantendo as chances de seu time ao longo da prorrogação.
É claro que o jogo não teria terminado assim sem uma ajuda dos atacantes que marcaram gols para o time de Pittsburgh. Mas depois dos dois primeiros gols, que deram à torcida esperança de levar estas finais de volta para a Pensilvânia, os Penguins esqueceram-se de continuar jogando.
Quer dizer, já não estavam jogando muito antes. O jogo começou como já tinham começado os outros dois em Detroit. Os Red Wings dominavam o gelo e mantinham o adversário a uma distância segura do gol defendido por Chris Osgood. Os Pens demonstravam uma ansiedade comprovada pela penalidade por homens demais no gelo logo aos 4:15, antes mesmo que o time desse seu primeiro chute a gol.
Essa "fórmula involuntária" deu certo depois de mais de duas horas sem gol na Cidade do Motor, quando Marián Hossa abriu o placar no segundo chute dos Penguins. Se estava funcionando, por que não continuar jogando da mesma maneira? Foi o que fizeram, e o segundo gol veio no quinto chute.
Os Red Wings dominavam até ali, mas não conseguiam passar por Fleury, que começava a se apresentar como o nome da noite. Então alguém no banco do time da casa teve a brilhante idéia de copiar ao menos a fórmula matemática usada pelos Pens, e Pavel Datsyuk diminuiu o placar no segundo chute de sua equipe no segundo período.
Fora isso, nada de o panorama mudar, e a partida seguiu na toada a que já nos acostumamos nestas finais. A diferença final de chutes no período, de 12-7, não chegou nem perto de refletir a supremacia dos Wings entre os dois intervalos. Por coisa de oito minutos na segunda metade do período, os Pens não deram um chute sequer a gol. Mas o placar ficou como estava em grande parte por causa de Fleury.
O terceiro período seria hora de acordar, mas os Wings não queriam deixar. Era o dia de receber a Copa Stanley e levantá-la para fazer delirar a torcida. Enquanto os Penguins mal passavam da zona neutra, os Wings davam um chute, dois chutes, três chutes, quatro chutes e conseguiram o empate. Seguiram no mesmo ritmo. Cinco chutes, seis chutes, sete chutes, oito chutes — conhece aquele ditado "água mole em pedra dura..."? —, nove chutes e a virada veio. Tudo isso antes que os Penguins disparassem um só disco contra o gol de Osgood. O primeiro só viria aos 11:26, mais de dois minutos depois do terceiro gol do time da casa.
Era a festa que Detroit esperava. Os dois gols dos visitantes foram um mero incômodo, talvez para fazer com que a cidade saboreasse melhor a conquista. Mais um gol seria só para causar mais uma explosão antes da que certamente se seguiria ao primeiro levantamento da Copa. O período foi de um domínio ainda mais completo, mas Fleury parecia ter certeza de que, se ele não sofresse mais um gol, um de seus colegas iria fazer alguma coisa.
Mas o tempo foi passando, e nenhum dos seus colegas fez nada. Com dois chutes a gol no período, a partida oferecia um retrato fiel do que tinha sido a série. Já se ouvia a torcida rugindo com o final iminente de uma campanha brilhante. Os Penguins já estavam sem goleiro. Era só algum jogador de vermelho pegar o disco e mandar para o gol vazio, que as garrafas de champanhe já poderiam começar a ser estouradas. Muita gente já tinha até tirado o lacre e o aramado.
Só que o disco não saía do gelo do Detroit. Pressão desesperada, o famoso "abafa". E desta vez deu certo, com os 3-3 vindo no terceiro chute do terceiro período (se fosse no jogo 3, daria um trocadilho ainda mais legal). E deu certo justamente para um time que pouco tinha feito até ali. Tivessem os Penguins jogado assim antes, e a série ou, ao menos, este jogo, poderiam ter sido diferentes. Não foram, mas ainda foi o bastante para estender a partida além dos 60 minutos.
Nada mau para quem tinha sido tão dominado ao longo dos dois últimos períodos. Descontado o abalo emocional de um gol quando a Copa Stanley já estava, literalmente, sendo polida, também nada mau para os Red Wings, que sabiam do que precisavam para sair vitoriosos dali: manter a pressão.
Como já havia acontecido do segundo para o terceiro período, o domínio do time da casa foi ainda maior na prorrogação. Vantagem de chutes a gol: 13-2. É verdade que os dois chutes dos Penguins vieram em boas chances, mas já estava provado desde o período anterior que água mole realmente fura pedra dura. Era só a água mole continuar jorrando.
Mas Fleury, a pedra dura, continuou segurando o ataque dos Wings, a água mole, que nem é tão mole assim. Era como se ele ainda tivesse a certeza de que outro de seus colegas apareceria para encerrar a partida. Ele até estaria certo, mas, do jeito que seus Penguins jogavam, isso poderia levar horas. De fato, o jogo invadiu a madrugada local. Sempre no mesmo ritmo. Sempre parecendo que seria encerrado — pelos Wings — a qualquer momento.
Não se sabe quanto tempo mais Fleury agüentaria. Ele já tinha defendido 55 chutes, vários deles representando boas chances de gol. E nada de seus colegas aparecerem para acabar com o sofrimento. Ao menos não de uma maneira agradável, como com um gol marcado.
Até que a combinação mais improvável da noite aconteceu. Comecemos pela segunda assistência, de Sergei Gonchar, que saíra contundido no terceiro período e só voltou para aquela vantagem numérica, já no terceiro tempo extra. Sigamos pela primeira assistência, de Evgeni Malkin, que ainda não tinha marcado ponto algum nestas finais. E terminemos pelo gol, marcado por Petr Sykora, que também tinha passado em branco nos outros quatro jogos.
Fim de jogo. Mais importante para os Penguins: não foi o fim da série. Mas o champanhe continua na geladeira dos Wings. Da maneira como eles estão jogando, falta apenas ter um pouco mais de sorte para superar Fleury, que veremos em Pittsburgh a primeira festa de um time visitante com a Copa desde que os Devils patinaram com ela em Dallas oito anos atrás.