Por: Humberto Fernandes

Pouco mais de dez meses depois da troca de Ilya Kovalchuk, o Atlanta Thrashers é um dos times mais quentes da NHL e o New Jersey Devils um dos mais frios. Não deveria ser o contrário? Não foram os Devils que se reforçaram contratando um dos melhores atacantes do mundo? Não foram os Thrashers que receberam, nas palavras deste colunista em fevereiro, "um defensor esforçado, porém limitado, um atacante promissor, mas que ainda não justifica a aposta, um prospecto perturbado e duas escolhas ruins"?

O que as estatísticas mostram é que a negociação não foi um péssimo negócio para o Atlanta. Na verdade, no período considerado (cerca de 60 jogos), foi um bom negócio. Já para o New Jersey, que enfrentou o desgaste da renovação contratual com o jogador, a punição por assinar um contrato que burlava as diretrizes do teto salarial e a posterior conclusão do acordo, muito lucrativo para o atleta e arriscado para a franquia, se fosse possível voltar no tempo seu gerente geral talvez o fizesse.

Em 58 jogos pelos Devils, Kovalchuk marcou 18 gols, sendo dez na temporada passada e oito na atual, e somou 45 pontos. Sua média de gols por jogo, que em Atlanta era de 0,55, em New Jersey é de 0,31 — é como se ele fosse um Marcel Dionne e virasse um Mark Parrish ao trocar de time. A média de pontos por jogo despencou de 1,04 para 0,78. Kovalchuk ocupa a segunda posição na equipe tanto em gols quanto em pontos.

Um número que ainda impressiona em Kovalchuk como nos seus tempos de Atlanta é o saldo +/-. Em oito das nove temporadas de sua carreira, o russo registrou +/- negativo. A exceção é justamente a temporada passada, em que terminou com +10. Com -21 subtraídos ao longo dos 31 jogos desta temporada, Kovalchuk é o último jogador da liga no quesito. Expandindo o período de análise para o começo da temporada 2001-02, ano em que ele chegou à NHL, descobre-se que o atacante tem o pior saldo acumulado entre todos os jogadores no período de nove anos, com -96.

São esses -96 que atestam para o mundo do hóquei que Kovalchuk é um dos jogadores menos confiáveis dentro do gelo por sua incompetência defensiva. E os Devils vão pagar uma fortuna por toda a vida para um jogador incompleto, que peca justamente naquilo que a equipe sempre se destacou: a defesa.

Já o Atlanta se diverte com a produtividade do atacante Niclas Bergfors, autor de 15 gols e 35 pontos em 54 jogos, e do defensor Johnny Oduya, que atua por mais de 21 minutos por noite e soma 61 jogos, três gols e 22 pontos pelos Thrashers. Bergfors é quatro anos mais novo que Kovalchuk e ainda tem muito o que desenvolver do seu potencial, já Oduya é dois anos mais velho que o russo, mas em sua quinta temporada na NHL já se mostra um defensor seguro.

Enquanto Kovalchuk tem um contrato de US$ 100 milhões por 15 anos, com impacto de US$ 6,66 milhões por temporada no teto salarial, Bergfors e Oduya, somados, consomem menos de US$ 4,5 milhões por ano e produzem mais. O Atlanta está fazendo mais com menos, prova disso é a sua posição na tabela — primeiro lugar na Divisão Sudeste, terceira melhor campanha da Conferência Leste — em comparação com a folha de pagamento do time — a menor de toda a liga. Assim, o nome do treinador Craig Ramsay ganha cada vez mais força nas conversas sobre o Troféu Jack Adams.

Os Devils de Kovalchuk, com apenas nove vitórias em 32 jogos, têm a segunda pior campanha da liga, apenas dois pontos à frente do New York Islanders (e seu elenco digno de AHL). A equipe já utilizou 30 patinadores — o Detroit Red Wings, por exemplo, escalou 22 — e apenas três não têm saldo +/- negativo. Soma-se à ineficiência de Kovalchuk o mau gerenciamento de Lou Lamoriello, que culminou na vergonhosa partida disputada com três jogadores a menos ainda em outubro.

E o ano não poderia ser mesmo do New Jersey, ainda que Kovalchuk marcasse gols e o time não tivesse o pior ataque da liga. Até o sempre consistente Martin Brodeur, capaz de disputar mais de 70 jogos por temporada, se ausentou de diversas partidas por contusão, forçando o contestado treinador John MacLean a escalar o reserva, Johan Hedberg, e até um terceiro goleiro, Mike McKenna. Durante muitos anos, a maioria dos torcedores da liga não saberia dizer o nome do segundo goleiro dos Devils, tão raras as aparições de quem ocupava o posto. Neste ano, já foram três.

O titular Brodeur tem cinco das nove vitórias do time, sendo três por shutout. O goleiro nunca teve números tão ruins, com média de gols sofridos de 2,84 por jogo e percentual de defesas de 89,6%. Ainda assim, seu nome circula entre os especuladores do mercado de trocas. Para esses jornalistas, Brodeur poderia ser trocado, o que soa como uma heresia. Aos 38 anos, o dono de quase todos os recordes da posição teria que aceitar o desafio de trocar de time, abrindo mão de sua cláusula de veto. Não há como ser um bom negócio para os Devils, também não há motivação para Brodeur. Três vezes campeão da Copa Stanley, qual o sentido de conquistá-la novamente, desta vez em outro lugar?

No reencontro de Kovalchuk com seu ex-time, no sábado, os Devils foram massacrados pelos Thrashers por 7-1. De novo, não deveria ser o contrário?

Antes mesmo da virada do ano, a temporada dos Devils já acabou. Para chegar aos 95 pontos, que devem ser suficientes para que o oitavo colocado se classifique para os playoffs, a equipe teria que vencer 34 dos 50 jogos restantes. Impossível. O melhor a fazer é planejar a próxima temporada, começando pela demissão de MacLean. Sua história como jogador em New Jersey é admirável, mas isso não é o bastante para assegurar o seu lugar à frente de um time ambicioso.

Humberto Fernandes foi a uma festa trajando o máximo do conforto: camiseta, bermuda e chinelo havaianas.

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Página publicada em 19 de dezembro de 2010.