Só uns poucos sortudos conseguem testemunhar a comemoração das finais de uma liga de esportes profissional ao vivo e em pessoa. Na quarta-feira, eu tornei-me uma dessas pessoas. Por isso, é difícil não olhar para trás e dizer: "Ei, isso foi bem legal." Afinal de contas, a comemoração da Copa Stanley é, de longe, a melhor entre os esportes profissionais. Do capitão levantando a Copa à passagem dela por cada jogador (por falar nisso, a ordem sempre importa), das voltas olímpicas ao redor do gelo ao enxame de jornalistas que eventualmente podem se juntar aos jogadores, é uma hora ou mais de um incrível teatro.
Mas eu não sou um torcedor dos Blackhawks. Eu sou um torcedor dos Flyers desde o berço. E ver aquele time que eu rapidamente passei a odiar nas duas últimas semanas comemorar o seu título no nosso gelo foi, honestamente, uma das coisas mais dolorosas que eu já tive de experimentar como fã de esportes.
Sentei-me na sala auxiliar de imprensa do Wachovia Center durante o jogo todo, mesmo quando a maior parte da imprensa desceu, entre o terceiro período e a prorrogação, ou como o resto fez com o emocionante final do tempo extra. Com cerca de dez minutos de comemoração, eu era o único membro da imprensa sobrando na sala. Ao longo do jogo, eu estava planejando descer ao gelo com o resto da imprensa se o inimaginável acontecesse — se os Blackhawks ganhassem a Copa. Isso aconteceu, e não consegui sequer me mexer. Fiquei assistindo a Patrick Sharp, que estava do meu lado em 2005 quando ele comemorou o título da Copa Calder nesse mesmo estádio com o Philadelphia Phantoms, da AHL, voar pelo gelo na direção de Patrick Kane, que tinha acabado de marcar o gol que deu a Copa ao Chicago. Parecia que eles eram as duas únicas pessoas no estádio que sabiam que o disco estava dentro do gol. Como ficou provado, eles eram duas de apenas três pessoas com tal conhecimento — o goleiro dos Flyers, Michael Leighton, também sabia.
"Acho que todo mundo estava pensando se estava dentro, eu olhei para trás e vi o disco preso na proteção e soube que tinha acabado", confessou Leighton depois do jogo.
Os Hawks basicamente confiaram na palavra de Kane e pularam do banco para invadir o gelo na direção dos braços de seu goleiro, Antti Niemi. Enquanto isso, os mais de 20 mil torcedores no estádio, eu incluído, ainda estavam em estado de choque. A luz vermelha não chegou a acender. Será que este foi o momento mais embaraçoso da história da Copa Stanley?
Eu tinha uma televisão à minha frente. Olhei para ela. A CBC estava mostrando o replay, enquanto o árbitro no gelo estava quase chegando ao banco de árbitros para chamar a equipe do replay. Eu estava tremendo, sentado na parte de cima do meu assento, que ainda estava levantado. O disco estava claramente dentro. Eu desmoronei. O assento desceu e assumiu sua forma de cadeira sob mim. Soltei um quase inaudível "Merda". E lá se foi a temporada mágica. Das expectativas da pré-temporada à depressão de novembro, da esperança e da empolgação nos playoffs a todo o resto, foi uma experiência incrível. Só que é fácil esquecer-se de tudo isso quando se está naquele instante. Afinal de contas, os Flyers pareciam absolutamente destinados a conquistar a Copa, e isso só foi reforçado pelo gol de Scott Hartnell nos minutos finais do terceiro período, que mandou o jogo para a prorrogação.
Não poderia acabar assim, certo?
Foi aí que entrou Lou Nolan, a voz dos autofalantes dos Flyers: "Gol do Chicago marcado pelo número 88, Patrick Kane. Seu décimo dos playoffs. Assistência do número 51, Brian Campbell. Tempo do gol, 4:06 da prorrogação. Foi Kane, seu décimo, com Campbell aos 4:06." Oficialmente oficial.
Alguns rostos do lado dos Flyers mostravam decepção enquanto eles estavam alinhados na linha azul assistindo à celebração dos Hawks. Na torcida, a maioria das pessoas ainda estava em choque. Alguns começaram a descer as escadas, ou porque não conseguiam assistir ou porque queriam fugir do trânsito. Mas a maioria estava como eu — ainda grudado no assento. Havia muitos torcedores dos Blackhawks no estádio, e não é difícil entender por quê. O time deles não ganhava a Copa fazia 49 anos, e, com a chance de fazê-lo no jogo 6, tenho certeza de que toda a cidade de Chicago teria comprado um ingresso se pudesse. Eles estavam aplaudindo, é claro, mas, enquanto a linha de cumprimentos progredia, gritos de "Va-mos, Fly-ers!" começaram a ecoar. Não vou mentir: eu quase chorei.
A equipe de manutenção, usando seus uniformes com o logo dos Flyers, estendeu os tapetes vermelhos a partir do túnel do zamboni. Eles foram estendidos ao largo da borda externa do gelo para os cinegrafistas, e um dos tapetes vinha direto do túnel até quase o ponto de faceoffs. Ele tinha um logo onde se lia "Campeões da Copa Stanley". Uma pequena mesa cheia de logos da NHL foi colocada no final do tapete.
Gary Bettman apareceu. A torcida: "Uuuuuuuuuuuu. (Pausa para respirar.) Uuuuuuuuuuuuu." Ele falou por sobre as vaias, dizendo algo elogioso sobre os torcedores da Filadélfia e sua "paixão". Sim, nós acreditamos em você, Gary. As vaias pararam quando Bettman anunciou o vencedor do Troféu Conn Smythe. "Jonathan Toews." Mais vaias. Não eram exatamente para Toews. Em vez disso, a torcida dos Flyers no recinto ainda achava que Chris Pronger tinha chance de ganhar. Eles ainda têm bons argumentos para isso, se você me perguntar.
Toews aceitou seu prêmio rapidamente, mas ele queria o prêmio grande, é claro. E lá veio a Copa. Bettman falou alguma coisa. O troféu foi erguido sob aplausos de uns duzentos torcedores dos Blackhawks nas arquibancadas e aplausos polidos de torcedores dos Flyers. Afinal de contas, apenas uns poucos sortudos testemunham isso. Eles patinaram com a Copa. Passaram-na de mão em mão. Eles ganharam a Copa Stanley.
A maioria dos torcedores dos Flyers provavelmente desligou suas televisões mais ou menos por aí. É duro de assistir. Eu não tinha a opção de desligar um botão, claro. Eu ainda não conseguia me mexer. É um sentimento de torpor que se sente quando seu time perde a Copa, mas quando você tem certeza que terá de reviver essas imagens uma vez atrás da outra ao longo do verão setentrional e do ano que vem e talvez além disso, e você sabe que elas foram feitas no seu estádio... é muito doloroso.
Cerca de meia hora após o fim do jogo, as equipes de manutenção começaram a aparecer no anel superior do estádio. Alguns torcedores vestidos de laranja ainda estavam em seus assentos, simplesmente olhando para o que acontecia lá embaixo. Os torcedores dos Blackhawks presentes reuniram-se perto do banco.
Aquele grito de "Vamos, Flyers!" transformou-se em "Vamos, Hawks!", ou mesmo em uma versão improvisada de "Chelsea Dagger" [N. do T.: música tocada no United Center em gols e vitórias dos Blackhawks]. Um jogador jogou espumante na multidão de vermelho. Antes que percebêssemos, o gelo estava vazio. A comemoração tinha sido transferida para o vestiário. A temporada estava oficialmente encerrada, e, cara, isso dói. É quando você para para pensar e percebe: "Oh, sim, eu tenho de escrever."
Eu já não odeio mais os Blackhawks (exceto taaaaalvez por Adam Burish). Eu odiei-os por duas semanas durante a série, mas a verdade é que agora não tenho mais antipatia por eles. Jonathan Toews é um grande capitão. Antti Niemi vai ter uma carreira fantástica. O bonequinho de Patrick Sharp ainda está sobre minha escrivaninha, e estou extremamente feliz por ele.
Serão longas férias para a torcida dos Flyers, mas no fim acabaremos nos lembrando desta temporada mágica por muito tempo. Podemos orgulhar-nos das coisas que nosso time conquistou neste ano, e, por causa disso, sinto-me feliz por ter testemunhado uma conquista da Copa Stanley com meus próprios olhos.
Travis Hughes é blogueiro do Broad Street Hockey. O artigo original foi traduzido por Alexandre Giesbrecht..