Mesmo quando Theoren Fleury atingiu o fundo do poço, era impossível para a torcida dos Flames esquecer-se de todos os grandes momentos que ele lhe proporcionara. Dos gols e assistências que o tornaram o maior artilheiro da história da franquia — até ser passado por Jarome Iginla no começo deste ano — ao retorno da troca que o tirou de Calgary — os cones René Corbet e Wade Belak, ao lado de um certo Robyn Regehr. As torcidas de Denver, Nova York, San Jose e Chicago não tinham o mesmo envolvimento emocional com o jogador, por isso só a metade vermelha da província de Alberta realmente se importou com os seguidos problemas pessoais que Fleury viveu no início desta década.
Quando o jogador decidiu tentar retornar ao gelo nesta pré-temporada, não foi nenhuma surpresa sua decisão de escolher os Flames. O que foi, sim, uma surpresa foram suas atuações. Longe do nível que ele alcançara na década de 1990, ainda assim foram muito melhores do que se esperava de um jogador de 41 anos que não jogava na NHL desde 2003 e que tinha entrado no gelo para jogos oficiais apenas 54 vezes nos seis anos anteriores, nenhuma delas por uma liga minimamente comparável à principal liga do mundo.
O gol da vitória que ele marcou nos pênaltis contra os Islanders, em 17 de setembro, serviu para coroar uma noite emotiva em que ele foi ovacionado durante o jogo inteiro. Após o gol, ele ainda foi recebido aos cânticos de "Theo! Theo! Theo!" enquanto acenava para a torcida. Sim, era apenas um mero jogo de pré-temporada, mas já pode ser considerado como um dos momentos mais humanos da NHL neste ano. Ora, até nesta década! Três dias depois ele marcaria um gol e uma assistência na vitória por 5-2 sobre os Panthers.
As coisas pareciam estar correndo bem, mas mesmo assim ele declarou que não se importaria em ser mandado para a AHL. Não era para menos que ele estava treinando arduamente desde fevereiro com um personal trainer: o que ele queria era jogar competitivamente, não importava onde, desde que fosse sob o guarda-chuva da organização Calgary Flames.
Apesar de ele não estar se destacando tanto (um gol e três assistências em quatro jogos), a decisão dos Flames de cortá-lo foi surpreendente. O gerente geral Darryl Sutter disse que Fleury "fez um grande trabalho e deveria estar orgulhoso de si mesmo, especialmente por causa de fatores como idade, vida longe do esporte e mudança no estilo de vida". Era o hóquei que importava para ele como dirigente esportivo, e Fleury teria de ser um dos seis principais atacantes para merecer um contrato. Mandá-lo para a AHL nunca foi uma opção cogitada por Sutter.
Diante da negativa dos Flames, Fleury deve ter pensado bastante se tentaria encontrar um novo time para defender. Mas seu passado em Calgary é algo foa do real: que outra torcida teria uma reação como a dos Flames para um jogador que tinha deixado o clube dez anos antes? Na última segunda-feira seu anúncio de aposentadoria virou uma celebração, porque, se ele se aposentava a contra-gosto, ao menos aposentava-se como um Flame. Nada poderia ser mais adequado para ele. Até o mês passado, as últimas memórias que se tinha dele na cidade eram dos problemas com álcool e drogas que ele enfrentou, acompanhados de longe por uma torcida que ainda assim tinha esperanças de vê-lo envergar o C flamejante no peito. Agora a última memória vai ser eternamente a das lágrimas emocionadas que encerraram sua carreira depois de uma quase volta com ingredientes de filme de Hollywood.
E, agora sim, uma verdadeira história de vida com final agridoce.
Jeff McIntosh/CP |