Por: Thiago Leal

Quando a sirene soou após o gol de Steve Rucchin, Jean-Sebastién Giguère somava 165 defesas em quatro jogos. O Mighty Ducks of Anaheim vencia não apenas o jogo 4 na prorrogação, mas também a série contra o poderoso Detroit Red Wings. Talvez aquela tenha sido a varrida mais surpreendente da década até aqui. Os Ducks foram a sensação da pós-temporada em 2003 e chegaram à decisão da Copa Stanley, perdendo para o New Jersey Devils. E se você lê TheSlot.com.br, deve estar cansado dessa história. De lá para cá seis anos se passaram, os Ducks voltaram a vencer os Wings em pós-temporada, em 2007, mas na ocasião como favoritos, avançando novamente à decisão da Copa Stanley e desta vez a conquistando.

Depois de vencer os Wings no jogo 3 da atual série de semi-final da Conferência Oeste, os Ducks tomaram a liderança no confronto por 2 jogos a 1. E é impossível, principalmente para o fã, não fazer uma relação com o passado — e essa relação é apenas com 2003, não com 2007, embora boa parte dos elencos que entrem no gelo atualmente remeta à série mais recente. E a força dos Ducks, enquanto equipe, também estão mais para o último confronto de playoffs que os dois travaram. O patamar em que a série se estabeleceu, por outro lado, lembra muito mais 2003, principalmente quando pensamos nos goleiros.

Os Ducks chegaram à pós-temporada aos trancos e barrancos, enquanto os Wings voaram como de costume. Em um primeiro olhar, seria fácil entender o fenômeno que ocorre com os Ducks. Seria mais ou menos o mesmo que houve com o Tampa Bay Lightning: a franquia teve sua temporada. Ganhou a Copa. Não engrenou e vai retornar ao ostracismo. Os Ducks deram pista disso na temporada passada e a campanha irregular, principalmente no começo, da atual temporada reforçariam essa tese. O principal responsável pelo sucesso recente dos Ducks, pelo menos creditado como tal, Brian Burke, saiu do time, o que para muitos era sinônimo do fim completo dos dias vencedores em Anaheim. Para piorar, Giguère vive uma má fase duradoura enquanto Scott Niedermayer e Teemu Selanne não são mais os mesmos depois de terem passado por reflexões sobre suas carreiras. Ou seja, tudo errado. Olhando por esse ponto de vista, dá para entender porque ninguém acreditava nos Ducks para seu confronto contra os Sharks, embora eu tenha defendido a tese de que o Anaheim era o verdadeiro favorito no confronto e ela se confirmou.

Esse fenômeno, no entanto, é equivocado. Para entender melhor os Ducks que disputam a pós-temporada e compreender porque a franquia eliminou os Sharks com certa facilidade e engrossou para cima dos Wings, primeiramente seria bom analisar e digerir as trocas realizadas no Dia-Limite e acompanhar o impacto que elas tiveram sobre a franquia. Porque uma coisa era aqueles Ducks do começo da temporada. Outra é o time com Ryan Whitney, James Wisniewski e a volta de François Beauchemin, que permitiram ao time reestruturar aquilo que ele sempre teve de melhor: a defesa. Scott Niedermayer e Chris Pronger voltaram a ter a liberdade que tinham em 2007 e o time voltou a jogar quase tão bem quanto. Chega a ser injusto considerar os Ducks uma zebra — tanto na eliminação dos Sharks quanto ao bom desempenho apresentado até aqui contra os Wings.

Desse ponto de vista, a campanha de pós-temporada dos Ducks guarda mais semelhanças com 2007. O ataque não tem tanta consistência, mas Ryan Getzlaf e Bobby Ryan, juntos com Selanne, com Todd Marchant e com todos os demais, têm tido um desempenho suficiente para que o Anaheim vençam seus jogos, e isso basta. Não é um ataque mínimo, como o de 2003. Mais uma semelhança que está mais para 2007.

Mas o ponto principal da campanha vem sendo as atuações seguras do goleiro Jonas Hiller, que no jogo 2, vitória por 4-3 após três prorrogações, parou nada menos que 60 chutes. Isso sim lembra Giguère em 2003 e remete àquela campanha. E quando pensamos no favoritismo exagerado atribuído aos Wings, temos mais uma semelhança com 2003. E se eu disser que naquele ano os Ducks eliminaram um time que vinha embalado na busca por um bi-campeonato?

Por outro lado, essas semelhanças com 2003 que se sobressaem estão ligadas meramente ao patamar, à forma como a série era encarada. E é justamente por isso que elas saltam aos olhos. Um goleiro que vem se superando, uma franquia mais fraca que está encarando uma favoritíssima de igual para igual, os Wings tendo sua briga pelo bi-campeonato atrapalhada pelos Ducks... o jogo, em si, como falei, está muito mais para 2007. Isso porque os Ducks vêm atuando bem, fazendo com que os números das partidas enganem. Pegue os jogos 2 e 3, as duas vitórias do Anaheim na série. Foram respectivamente 62 e 46 chutes do Detroit e em ambos Hiller saiu como a estrela da partida. Qualquer um pensaria que os Wings massacraram — e se você encarar pela lógica de Wayne Gretzky onde "você perde 100% dos chutes que você não chutar", realmente essa ideia faz sentido. Mas se você pensar pela lógica de Randy Carlyle e da forma defensiva como os Ducks jogam, isso estaria mais ou menos dentro do planejado. Porque esses chutes parariam em Whitney, Pronger, Niedermayer ou Hiller. Os Ducks se prepararam para isso, para jogar assim. Dessa forma tiveram muito mais consistência no jogo e saíram merecedores das vitórias. Nem sempre o time que chuta mais é o melhor no gelo. Uma ressalva: os Wings tiveram um gol absurdamente legal de Marián Hossa anulado no jogo 3 — ou melhor, "não validado", já que a arbitragem parou o jogo antes do gol em si acontecer. Na opinião de Everton "Mococa", isso só levaria o Detroit a perder o jogo na prorrogação. E se um torcedor dos Wings encara dessa forma, significa que esse jogo feio dos Ducks não só tem dado resultado como vem sendo compreeendido por quem acompanha a série.

Claro que ainda vejo os Wings como favoritos, afinal, ainda é um time bem superior aos Ducks. O problema, que deve ser a maior preocupação dos torcedores dos Wings, é outro. Mike Babcock, que já esteve do lado do Anaheim, quando era uma outra franquia e um outro time, deve ter sido o primeiro a entender que os Ducks estão explorando o fator defesa — tanto sua própria defesa, se valendo dela para garantir o placar, quando a defesa dos Wings, ainda bastante deficiente. No jogo 3 isso somou-se ao fato de que o Detroit cometeu uma série de penalidades bestas, o que, contra os Ducks, os Sharks devem ter aprendido, é pedir para tomar gol. E correr atrás do prejuízo contra o Anaheim é difícil...

Uma possível ausência que os Ducks devem sentir é a de James Wisniewski, com uma concussão no pulmão após tomar um chute no peito. É mais ou menos semelhante à ausência de Brian Rafalski? Não. É pior, uma vez que os Ducks dependem bastante dos defensores e dos intimidadores que tem.

Do pouco que pôde se observar até agora, podemos constatar que não há muito o que mudar na série. Tudo vai acontecer do jeito que aconteceu até agora. As interrogações são sobre o quanto os Ducks irão aguentar a pressão imposta pelo Detroit, ou o quanto vai demorar para que o Detroit desmonte a defesa dos Anaheim, se é que ele vai conseguir. Certamente os torcedores vermelhos preferem relembrar uma outra série: 1999, quando os Wings varreram um Mighty Ducks of Anaheim bem diferente do que se conhece hoje em dia.

É quase certo que o que resta da série vai ser um teste para os nervos de ambas as torcidas. Resta saber qual o modelo de jogo vai funcionar melhor. Apostei nos Wings e continuo batendo o pé na aposta. Mas considerar os Ducks uma surpresa, uma zebra ou acreditar que tudo poderia se resolver em quatro ou cinco jogos é um equívoco, possivelmente fruto da falta de atenção com que os Ducks foram tratados neste final de temporada regular.

Thiago Leal recomenda o blog da Marina Magalhães.

Kevork Djansezian/Getty Images
Jonas Hiller vem sendo o nome da série, bem como da pós-temporada — pelo menos para os Ducks.
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Mikael Samuelsson tem bombardeado o gol do Anaheim, mas tem Hiller pela frente.
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Um flagra no estilo de jogo dos Ducks: o ataque adversário tem que se desdobrar para escapar de cotovelos e empurrões.
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Nem valeu! Marián Hossa marcou legal, mas o lance já havia sido anulado previamente.
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James Wisniewski cospe sangue: ausência que preocupa os Ducks.
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Página publicada em 07 de maio de 2009.