Completando a trilogia de artigos sobre os elencos das principais seleções de hóquei nos Jogos Olímpicos de Inverno de 2006, em Turim, eis os grandes favoritos à conquista da medalha de ouro: os canadenses.

Leia também sobre o time norte-americano e os europeus.

O Canadá vai à Itália como a Seleção Brasileira vai à Alemanha: favorito ao título. Assim como o futebol para os brasileiros, o hóquei no gelo desperta o mesmo tipo de paixão e fanatismo na torcida canadense. E a confiança no potencial da seleção do país é tal como cá: estão se perguntando em que lugar ficaria uma segunda seleção canadense, o "Canadá B".

O que quer dizer que o Canadá, para a imprensa local, já ganhou o ouro. E se depender da gerência da equipe, não será medido nenhum esforço para tal. A convocação dos canadenses deixou uma clara mensagem para o resto do mundo: nós queremos a medalha, custe o que custar.

Ou você acredita que a convocação de Todd Bertuzzi aconteceu porque ele representa o verdadeiro espírito olímpico de honestidade, dedicação e senso esportivo?

Bertuzzi é aquele cara que covardemente agrediu um adversário, desferindo um soco por trás e atirando-o ao chão. Steve Moore, então jogador do Colorado Avalanche, quebrou o pescoço e até hoje luta para se recuperar, mas sua carreira acabou.

O diretor executivo da seleção, Kevin Lowe, declarou que "nós estamos orgulhosos de tê-lo". Claro, Bertuzzi é um dos melhores atacantes da liga, grande, forte e talentoso. Orgulhoso, Lowe? O Canadá não precisava sujar a reputação do time convocando um agressor que quase matou um companheiro de esporte.

Então Lowe e o gerente-geral Wayne Gretzky insistem na balela de "esquecer e perdoar". Quando o Vancouver Canucks se tornou um time razoável sem Bertuzzi e implorou pelo seu retorno, a NHL decidiu que 13 míseros jogos seria punição suficiente. Como poderíamos esquecer e perdoar?

E mais: querem nos fazer acreditar que foi uma atitude corajosa convocar o jogador. Não há nada de corajoso nisso. Era o mais fácil a fazer. Bacana seria esquecê-lo para sempre, mas vencer está acima de tudo.

A ética, a honestidade, o espírito olímpico, o amor ao esporte mandava que os responsáveis pelo time não convocassem Bertuzzi. O mundo saberia o motivo. E há tantos grandes jogadores no país — como os reservas Eric Staal e Jason Spezza ou o esquecido Brendan Shanahan — que de forma alguma a seleção ficaria mais fraca. E mesmo que não houvesse opção, por que recompensar Bertuzzi? Sua recompensa foi poder retornar ao hóquei muito antes do que deveria.

Todos os atletas canadenses convocados precisam ser aprovados pelo Comitê Olímpico Canadense. O time de hóquei foi aprovado por unanimidade. O Comitê só se preocupa com o ouro. E assim tenha certeza de que milhares de canadenses não apoiarão o time em Turim. Orgulhoso, Lowe?

Outra grande polêmica levantada pela imprensa foi a não convocação de Sidney Crosby, o queridinho da mídia. Mas, afinal, o que um garoto de 18 anos que mal começou sua carreira na NHL teria para acrescentar em um time recheado de estrelas experientes?

A "febre Crosby" chegou ao ponto de o jogador tornar-se assistente de capitão do Pittsburgh Penguins. Don Cherry, comentarista do "Hockey Night In Canada", esbravejou no ar sua insatisfação com esse ato insano e irresponsável do treinador dos Penguins. "Por favor! Um garoto de 18 anos?", disse Cherry, colocando suas mãos na cabeça enfaticamente. "Ele vai dar idéias? Isso é ridículo!"

Também é ridículo pensar que Crosby, hoje, é mais importante ou melhor para a seleção canadense que Spezza ou Staal, também jovens porém mais experientes, ou que algum veterano convocado.

Crosby era indicação de Mario Lemieux, que retirou seu nome da lista de possíveis convocados, assim como Steve Yzerman. Dois dos maiores nomes do esporte nos anos 90, Lemieux e Yzerman não se sentem em condições ideais para disputar a competição.

No geral a maior parte do elenco canadense é composta por atletas que disputaram as últimas grandes competições internacionais, desde os Jogos Olímpicos de 2002 até a Copa do Mundo de 2004 e o Campeonato Mundial de 2005. Confira o elenco dourado:

Goleiros:
Martin Brodeur, Roberto Luongo e Marty Turco.

Defensores:
Rob Blake, Adam Foote, Ed Jovanovski, Scott Niedermayer, Chris Pronger, Wade Redden e Robin Regehr.

Atacantes:
Bertuzzi, Shane Doan, Kris Draper, Simon Gagne, Dany Heatley, Jarome Iginla, Vincent Lecavalier, Rick Nash, Brad Richards, Joe Sakic (capitão), Ryan Smyth, Martin St. Louis e Joe Thornton.

A profundidade é tão grande que atualmente o terceiro goleiro da equipe, Turco, está em melhor momento que os dois outros convocados. O titular Brodeur vive péssima temporada, mas quando estiver diante de uma defesa decente, voltará a ser o fator dominante de sempre.

É certo que o Canadá nunca teve uma defesa como a que irá desfilar na Itália. Muita força física e talento combinado em sete jogadores excepcionais. O mais difícil é decidir qual deles não será titular. Talvez seja o "brasileiro" Regehr, talvez seja Foote, o único questionado entre os sete. Mas a sensação é de que você poderia ir para a guerra ao lado desses monstros. O reserva imediato em caso de contusão é Bryan McCabe, maior pontuador entre os defensores da temporada.

Entre os atacantes há um trio que não é unânime entre a imprensa. Draper não faz boa temporada ofensiva, mas é o maior especialista da NHL em matar penalidades. É versátil, atua como central e asa. Smyth foi chamado para fazer o jogo sujo, afinal nenhum time vence sem alguém que desfira trancos e brigue nas bordas, e ninguém tem tanta experiência internacional defendendo o Canadá quanto Smyth. E Nash foi o melhor jogador canadense no último campeonato mundial. Embora tenha perdido a maior parte da temporada por contusão, até fevereiro terá disputado jogos suficientes para voltar à sua forma explosiva.

Nenhuma outra seleção no mundo tem três centrais como Sakic, Thornton e Lecavalier. Imagine a troca de linhas canadense. Sai o trio Gagne, Sakic e Iginla, entram Bertuzzi, Thornton e Heatley. Ou Richards, Lecavalier e St. Louis. Não há como pará-los.

Uma pena que entre tantos craques esteja um criminoso, que ocupa boa parte de qualquer matéria sobre os 23 convocados. E Lowe está orgulhoso disso.

Em Turim o Canadá terá sua maior chance de sagrar-se bicampeão olímpico, o que não acontece desde 1952. Aliás, foram exatos 50 anos sem conquistas, até Salt Lake City. E daí em diante, quem sabe, uma dinastia não seja formada, como um dia a União Soviética reinou no hóquei.


Humberto Fernandes detesta sol e areia, mas neste momento está no litoral do Espírito Santo.
POTÊNCIA MÁXIMA Para o Canadá nada mais importa além do ouro olímpico. O elenco inclui o goleiro Martin Brodeur, o defensor Wade Redden e o atacante Jarome Iginla. (Arquivo TheSlot.com.br)
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Página publicada em 4 de janeiro de 2006.