Na
nova NHL o predomínio é dos times mais habilidosos e velozes.
Mas, se existe uma equipe que pode seguir na contramão disso tudo
e obter sucesso, essa equipe é o atual vice-campeão da Copa Stanley.
Após um começo deprimente na temporada, o Calgary Flames resgata
o protagonismo quando se trata de jogo defensivo e de intimidação
na NHL, e com isso a vida para os adversários do time de Alberta
— em especial no Pengrowth Saddledome — voltou a ser
miserável.
Nas últimas quatro partidas foram quatro vitórias. Nas três primeiras
delas, apenas um gol sofrido, o que deu ao goleiro Miikka Kiprusoff
o simbólico título de jogador defensivo da semana. O finlandês
voltou a dar mostras daquele goleiro dominante dos últimos playoffs,
mas ele tem a sorte de contar com um grupo de defensores que tornou
sua vida bem tranqüila nesses três jogos — contra Wild,
Blue Jackets e Canucks. Em nenhuma dessas partidas o adversário
ultrapassou a marca de 23 chutes. Bem verdade que a péssima campanha
dos Blue Jackets e o fato do Minnesota Wild ser a quarta equipe
que menos chuta a gol na liga cooperaram, mas contra os fortes
Canucks deu para comprovar que a melhoria é real. E, para não
deixar dúvidas, venceram novamente os Canucks duas noites depois.
E que rufem os tambores, pois um dos motivos da defesa dos Flames
voltar a ser temida é a volta do brasileiro Robyn Regehr. Após
machucar o joelho numa partida de pré-temporada contra os Oilers,
Regehr voltou contra o Columbus Blue Jackets e pareceu não ter
receio de utilizar a sua maior arma, o jogo extremamente físico.
Se bem que, se existe uma equipe boa para ter uma volta tranqüila,
essa equipe é a de Ohio, com sua média inferior a dois gols por
partida na temporada. Mas, já na primeira batalha contra os Canucks,
Regehr manteve Naslund fora da partida, uma coisa complicada para
qualquer jogador de hóquei do planeta.
Já Jordan Leopold vem sendo o maior mistério em Calgary nesses
dias. Ele é, dentre os excepcionais três jovens defensores do
time, o que tem maior potencial ofensivo, mas ainda não pontuou
nos 17 jogos em que atuou na temporada. Se os pontos não vêm,
pelo menos o treinador e gerente geral do time, Darryl Sutter,
vem dando a Leopold o mesmo tempo de gelo que dá aos outros principais
defensores do time. Contra os Canucks, no último sábado, ficou
no gelo por mais de 22 minutos, o mesmo tempo dado a Hamrlik e
Regehr. Um dos prováveis motivos dessa seca de pontos é que, devido
à ausência de Regehr, Leopold tenha assumido a função do brasileiro,
ficando bem mais fixo na defesa que de costume. Com a volta de
Robyn, é questão de tempo para Leopold voltar a marcar.
O terceiro, e mais jovem desses três promissores defensores, é
também o mais completo. Dion Phaneuf pode ser o elemento surpresa
na disputa pelo Troféu Calder — concedido ao melhor novato
da temporada — que, salvo uma contusão ou queda brusca de
rendimento, deverá ter Ovechkin e Crosby como outros dois candidatos
máximos. Obviamente é bem mais fácil chamar a atenção sendo um
atacante ou um goleiro, mas se um defensor chegar a essa disputa,
podemos afirmar que esse defensor será Dion Phaneuf.
E digo isso mesmo com Brent Seabrook, dos Blackhawks, tendo até
agora o mesmo número de pontos. O aspecto que mais chama atenção
em Phaneuf é a sua liderança no gelo. Mesmo tendo apenas 20 anos
de idade, a impressão é que se trata de um veterano de dez temporadas
de NHL nas costas, e ele ainda tem a capacidade de atingir qualquer
coisa que se mova. No primeiro confronto contra os Canucks, Dion
Phaneuf faz Sami Salo literalmente voar no gelo do Saddledome
com um tranco que foi poesia em movimento. No segundo jogo entre
os rivais de divisão, ele acabou com o jogo: gol da vitória e
duas assistências. Volto a dizer: se um defensor chegar à concorrida
disputa pelo Calder, será o camisa 3 dos Flames.
Se os citados acima têm vaga nos dois principais pares defensivos
do time — o veterano de 12 anos na NHL, Roman Hamrlik, é
dono da vaga restante — o mesmo não acontece com o igualmente
jovem Andrew Ference que, mesmo na condição de menor jogador de
defesa do time, tem como principal hobby durante as partidas atingir
os adversários. Mostrou isso na grande corrida dos Flames nos
playoffs passados e faz parte também dessa nova geração que terá
a missão de manter a NHL forte após tantos medalhões terem se
aposentado.
Ference geralmente atua do lado de outro jogador que desfila agressividade
e não deixa passar a chance de mostrar aos rivais que a vida é
difícil para aqueles que querem se aproximar da meta de Kipper.
Rhett Warrener foi ovacionado quando deu um tranco daqueles em
Todd Bertuzzi. Foi tão forte que o capacete saiu da cabeça oca
do atacante vancouverite. Por falar em cabeça oca, outro inconseqüente-mor,
Bryan Marchment, é uma espécie de sétimo defensor do time. Com
os árbitros marcando tudo o que eles fingiam que não viam antes,
seria ideal que o veterano — de 2.232 minutos de penalidades
na carreira — ficasse vendo o jogo do time pela TV.
Por último, o tcheco Roman Hamrlik — 12 anos na NHL —
que, apesar de estar em uma fase meio fria, é uma espécie de professor
do corpo defensivo. Já foi campeão olímpico — Nagano 1998
—, disputou três Jogos das Estrelas e está bem próximo dos
500 pontos na NHL. Foi a adição mais significativa do time, ao
meu ver, para essa temporada, até mais que Tony Amonte e Darren
McCarty.
No ataque o time é totalmente dependente do capitão Jarome Iginla
e dos centrais Steve Reinprecht e Daymond Langkow. Darren McCarty
e Jason Wiemer fazem apenas o serviço sujo. Tony Amonte e Stephane
Yelle vivem de lampejos. Com isso, é bom mesmo concentrar as forças
no jogo defensivo. Até porque poucos são tão bons nisso quanto
os Flames. Se você acha que o melhor ataque é a defesa, então
esse é o time a seguir de perto nesta temporada.
Eduardo Costa consumiu diversos pacotes de Doritos enquanto
escrevia essa coluna.