Por: Thiago Leal

Quem teve o trabalho de assistir àqueles vídeos de tubarões no Discovery Channel ou Animal Planet sabe que, antes de atacar uma presa, o tubarão-branco nada em círculos em torno da mesma. Um ataque de tubarão-branco geralmente é fatal. São raras as exceções de quem sofreu um ataque e viveu para contar história. E quem fala sobre o assunto é alguém viciado em oceanografia que coleciona vídeos de tubarões e os assiste desde os seis anos de idade.

Curiosamente, o San Jose Sharks, que passa toda a temporada circulando os primeiros lugares da Conferência Oeste, falha na hora do ataque às suas vítimas. A mais recente, para o Anaheim Ducks na temporada passada, conseguiu ser humilhante. Naquela ocasião os Sharks viviam a grande expectativa de terem conquistado o Troféu dos Presidentes. Seu adversário na primeira fase era um rival doméstico sobre quem levava vantagens em confrontos de temporada regular. E todos sabemos o que aconteceu. Eliminação precoce com três culpados: Joe Thornton, Patrick Marleau e Jonathan Cheechoo. O crime, simplesmente sumir sem deixar vestígios na hora que o time mais precisa. O azar dos Sharks foi que do lado oposto havia um jogador com a personalidade oposta, que parece gostar de jogos decisivos e chamou para si a responsabilidade, que é o Ryan Getzlaf.

Após a traumática eliminação, pouca coisa mudou. Marleau perdeu o C de capitão. O jogador era uma espécie de símbolo da franquia. Cheechoo foi mandado embora para Ottawa em troca de Dany Heatley. Thornton, o jogador de quem mais se esperava, continuou com suas mesmas funções de principal atacante da franquia e capitão alternativo. E Todd McLellan continua no cargo de técnico da franquia.

E mais uma vez os Sharks lideram o Oeste com folga — ficaram longe do Troféu dos Presidentes porque o Washington Capitals sobrou no Leste. Novamente o San Jose terá o oitavo colocado pela frente. Desta vez, o Colorado Avalanche.

A história pode se repetir?

Thornton-Heatley-Marleau
Tire Cheechoo, coloque Heatley. Os Sharks continuam dependendo de três atacantes, com a diferença é que um deles não é o Cheechoo. E o trio liderou o time em pontos na temporada regular, como era de se esperar. A questão que cerca a dúvida é que Heatley é um jogador que costuma sumir em momentos decisivos, assim como o apagão de Thornton, Marleau e Cheechoo em 2009. O medo de se ter trocado seis por meia-dúzia tem lá seu fundamento. Falei com alguns poucos torcedores dos Sharks recentemente (todos da Baía de São Francisco, todos frequentadores do HP Pavillion) e as opiniões iam do "O time aprendeu, desta vez será diferente" ao "Já vi esse filme".

Não há muito o que dizer sobre como Thornton, Marleau e Heatley se sairão na série devido ao histórico contrastante de suas atuações em temporadas regulares e playoffs. Mas a opinião dos fãs novamente vai desde a esperança de que agora eles têm cabeça para se controlar ao desespero de "conheço esses caras, sei o que eles (não) fazem".

Deixando de lado esse papo de fã, Thornton, Marleau e Heatley estão na casa dos 30 anos e não podem ser considerados jogadores inexperientes. Se sucumbem diante de grandes pressões o problema é qualquer outro, menos a instabilidade de um jogador jovem como Patrick Kane. Então dá para acreditar que uma pressão menor ajudaria os caras a ter atuações melhores?

A esta altura não dá para crer que Thornton & cia. amadureceram. Maduros, já eram. Vamos ver como anda o controle emocional.

A grande expectativa de 2009 e a grande desconfiança de 2010
No ano passado os Sharks estavam disparados na NHL. Eram o melhor time sem sombra de dúvidas e levaram esse rótulo e as pressões agregadas em sua cola aos playoffs. Perderam diante de um adversário tecnicamente mais fraco.

A pressão não diminuiu. Apenas mudou. Alguém aí vai apostar contra o Washington Capitals na decisão da Copa Stanley? Logo o favoritismo está todo do outro lado do país. Certo?

Mas a desconfiança aumentou. Os Sharks agora vão experimentar uma outra pressão, que é a pressão de ter que jogar contra a dúvida de críticos e fãs. São dois sentimentos diferentes. Vale lembrar que o San Jose foi líder no Oeste do mesmo jeito, então continua com o favoritismo dentro da conferência. Tem o melhor time (em tese, porque eu prefiro o Chicago) e um trio de jogadores que ninguém sabe onde se enfia.

Um crime reincidente pode levar a consequências mais drásticas, como a saída de Marleau, por exemplo.

A pressão é a mesma. Só que com tons diferentes.

Colorado Avalanche e todo o resto
Apesar de gostar do time do Colorado, aposto no San Jose para esta primeira série. Há uma diferença básica entre a série contra os Ducks na temporada passada com a série contra o Avalanche atual. Lá os Sharks enfrentaram um adversário que veio de uma jornada de superação incrível. Os Ducks eram dados como desclassificados até a um mês antes dos playoffs, quando iniciaram uma sequência de vitórias que lhes garantiu a última vaga nos confrontos de pós-temporada do Oeste. E havia algo de diferente naquela série entre Ducks e Sharks. Minha opinião é a de que se os Ducks tivessem enfrentado outro adversário, ainda que mais fraco que o San Jose, não passaria. Assim como os Sharks passariam por outro adversário, mesmo mais forte que os Ducks.

O Anaheim vestiu a camisa da rivalidade naquele confronto. Não digo isso apenas pela atitude de Getzlaf, Corey Perry ou Bobby Ryan na série, mas porque o próprio time abriu um discurso de rivalidade com os Sharks propondo inclusive a divisão enfre Califórnia do Norte e Califórnia do Sul naquela série. Os Sharks, do outro lado, estavam apáticos. Entraram no rinque com a pressão arterial 10 por 6 e não pareciam tão ligados no quanto aquilo era importante para um dos lados. Talvez por estarem acostumados a vencer os Ducks em temporada regular. O que havia para se provar ali, afinal?

O Colorado tem hoje um time melhor que os Ducks tinham até sua classificação à pós-temporada de 2009. Só não acredito que consiga uma superação tão grande quanto os Ducks conseguiram, simplesmente porque o confronto agora é comum. Talvez Matt Duchene, auto-alegado torcedor do Colorado desde criança, sentisse o mesmo furor se o adversário fosse o Detroit Red Wings, e isso puxasse o time para a superação. Por mais que Paul Stastny e Chris Stewart estejam jogando bem, acredito que este é um confronto onde, sim, a força dos Sharks fará a diferença.

No entanto a Conferência Oeste tem oito times nos playoffs, dois deles, em particular, eu diria que os Sharks devem temer: Chicago Blackhawks ou Nashville Predators, justamente outros dois times que se enfrentarão na primeira rodada dos playoffs. Os Hawks por serem um time cada vez mais afiado com jogadores em ascenção, caso de Kane e Jonathan Towes. Patrick Sharp é outro nome que deve fazer a diferença. Já os Preds... eles odeiam os Sharks. Claro que falando assim fica parecendo que Jason Arnott esmurraria Thornton na rua se o encontrasse. Óbvio que não. Mas, por mais frio que os jogadores estejam, quando uma franquia e sua cidade incorporam a rivalidade, o contágio de seus atletas é mais fácil. Não afirmo isso com base científica ou estatística alguma. Apenas tenho o palpite de que Jordin Tootoo, Shea Weber e Ryan Sutter têm motivos para querer arrancar alguns dentes do tubarão. Bom, deixemos para falar disso caso o confronto venha a acontecer. Apenas sugiro ao fã do San Jose que fique de olho aberto para esse confronto. Até porque o adversário de agora é o...

... e o Colorado Avalanche?
Peço desculpas aos torcedores do Avalanche pelo artigo. Mas essa coluna não tem o intuito de exatamente discutir o confronto entre Sharks e Avs. O artigo é um levantamento sobre as atitudes dos Sharks. Novamente eles são os protagonistas, independentemente do adversário. Eu estaria falando o mesmo caso o confronto fosse Sharks vs. Vancouver Canucks.

Mas como o Avalanche é o antagonista da situação, vejamos o que a franquia de Denver pode fazer.

Além de ter tido um desempenho melhor na temporada regular, os Sharks mantiveram seu nível de atuação durante todo o tempo. Os Avs, por outro lado, oscilaram na tabela e correram certo risco de serem eliminados antes dos playoffs.

Dentre os oito classificados do Oeste, o Avalanche possui a defesa mais fraca. O ataque mantém uma boa média. A saída deve ser utilizar os turnos dos principais goleadores do time, Stewart e Milan Hejduk, e ver até onde isso funciona contra os Sharks. A história recente da franquia do Vale do Silício certamente dará a John-Michael Lilies e a Kyle Quincey o trabalho de colar em Thornton e Marleau para tentar anulá-los. Craig Anderson chamou atenção para a importância do jogo defensivo nesta série, o que é também um alerta para os homens que o guardam.

Bloquear os três principais atacantes do San Jose e contar com uma participação decisiva de Stastny deve ser o máximo com o que o Colorado pode contar. Se limpar a principal linha dos Sharks corretamente, a possibilidade de vitória aumenta bastante.

Mas se o San Jose Sharks é tão melhor assim, pelo menos que fique para o Colorado Avalanche o exemplo do que aconteceu com o time imbatível na temporada passada. Nos playoffs o jogo muda completamente.

Thiago Leal está pensando em acompanhar jogos do principal time de sua cidade, o Botafogo da Paraíba.
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Página publicada em 25 de março de 2010.