Na semana que passou, o Detroit Red Wings anunciou a realização de
sua tarefa mais na temporada: a renovação de contrato com Henrik Zetterberg
por assombrosos 12 anos de contrato, com média de US$ 6 milhões ao ano.
Zetterberg, escolhido o jogador mais valioso dos playoffs passados,
sabe que conseguiria bem mais que os US$ 6 milhões no mercado, se decidisse
ficar com o passe livre. Analistas estimam que ele conseguiria facilmente
um contrato de US$ 8 milhões/ano. Mas Zetta preferiu a estabilidade
de longa duração com receita garantida e a permanência em Detroit.
Uma renovação desse naipe, com toda essa duração envolve risco? Sim.
Diante do cenário de crise macroeconômica atual, inclusive com expectativas
ainda sombrias e que se avolumam diária e negativamente, 12 anos de
contrato envolvem uma dose considerável de risco. Você não tem como
afirmar que daqui a dez temporadas os salários ainda estarão subindo,
ou mesmo no patamar atual. Isso é o que se espera, diante do curso normal
das coisas. Mas o cenário atual é de início de um choque sobre esse
curso normal. Ninguém tem como afirmar nem mesmo qual será a conseqüência
sobre a NHL da atual crise. Mas, enfim, assim foi feito.
O ponto subseqüente mais importante desta renovação é a abertura de
espaço para a possibilidade de realizar o que até então era considerado
impossível: renovar tanto com Marian Hossa quanto com Johan Franzen.
O problema principal está, claro, na renovação de Franzen, que ainda
tem um salário bem abaixo (US$ 1,15 milhões) do que pode conseguir.
Ainda mais que não há consenso sobre quanto o jogador valeria no mercado.
Nesses casos, geralmente surge um time oferecendo um contrato astronômico
ao jogador, muito acima do que ele realmente demandaria e mereceria,
inflacionando grotescamente o mercado. Exemplos disso, pré e pós locaute,
não faltam.
De qualquer forma, o segredo para conseguir renovar com ambos é seguir
a mesma linha da renovação de Zetta, com um cronograma anual de pagamentos
de forma que sempre caibam no teto salarial da equipe, tendo, claro,
pagamentos mais pesados nos anos iniciais.
Em números: com Zetterberg valendo na faixa de US$ 6 milhões/ano num
contrato de longa duração, podemos dizer que Hossa valeria cerca de
US$ 5-5,5 milhões/ano, enquanto Franzen estaria na faixa de US$ 4 milhões/ano.
Tudo isso, repito, num cenário de contrato de longa duração, até a aposentadoria,
e com ambos aceitando receber menos do que poderiam para permanecer
em Detroit. É evidente que tanto Hossa quanto Franzen valem mais do
que isso hoje. E é evidente que o Detroit oferecerá mais do que isso
a ambos para os próximos anos. A questão é desenhar o contrato de forma
que hoje seja pago um valor maior, enquanto esse valor vai diminuindo
ao longo dos últimos anos de contrato. O contrato de Zetterberg, por
exemplo, paga a ele "míseros" US$ 1 milhão/ano nos últimos dois anos.
E, claro, paga mais de US$ 7 milhões nesses primeiros anos. Assim pode
ser feito com Hossa e Franzen.
Tudo isso depende fundamentalmente da aceitação de ambos em receber
menos para ficar em Detroit. Porque, no fim das contas, ambos estarão
escolhendo um contrato de longa duração (estabilidade), porém ganhando
menos do que poderiam ganhar caso fossem para o mercado com passe livre.
A renovação com Hossa e Franzen tem outras implicações. Jogadores como
Mikael Samuelsson dificilmente teriam espaço no orçamento. Isso porque
imagina-se que Samuelsson, agora bem mais famoso do que quando chegou
em Detroit, preferirá testar o mercado para buscar uma boa elevação
em relação aos US$ 1,2 milhões que atualmente recebe. Dificilmente ele
receberá um aumento substantivo em Detroit.
Para manter Hossa e Franzen e ficar dentro do teto salarial, talvez
seja necessário inclusive desfazer-se de jogadores. Quando se fala em
negociar jogadores em Detroit, o primeiro nome de toda e qualquer lista
é Andreas Lilja. Mas isso não é corroborado pela gerência, muito menos
pela comissão técnica, já que o criticado defensor parece ter seu pequeno
prestígio inabalado. Descartando uma nova temporada de Chris Chelios
no gelo e imaginando que Jonathan Ericsson deve finalmente fazer sua
primeira temporada cheia, talvez o espaço fique pequeno demais para
Lilja. Talvez.
Mas não apenas ele. Se for realmente necessário, veteranos com sólidas
raízes na franquia, como Kirk Maltby, por exemplo, podem ser forçados
a encerrar a carreira (supondo, claro, que não haja mercado para ele
em outro time). Até mesmo Kris Draper poderia entrar na roda, embora
eu realmente não acredite e não consiga enxergar isso. Em última hipótese,
até Jiri Hudler — que deve tornar-se agente livre restrito — poderia
ser negociado para abrir algum espaço no orçamento. Embora seja útil
e faça uma boa temporada, Hudler demonstra que não passará de um jogador
de terceira linha (ou de segunda, se você tiver boa vontade) no Detroit,
abaixo das expectativas inicialmente geradas.
O gerente do Detroit, Ken Holland, já indicou qual é a linha de pensamento
sobre a renovação com Hossa e Franzen: "É possível, mas difícil — embora
eu acredite que ambos gostariam de ficar. Eu quero renovar com um deles
até os playoffs, e então esperar até o fim de junho para ver qual será
o teto salarial."
Escolher ficar no Detroit não é exatamente algo desagradável. É escolher
ficar numa franquia de longo e, até o momento, ininterrupto sucesso.
Desde o começo da década de 90 está sempre nos playoffs, sempre figurando
entre os favoritos ao título. Claro que nem todos se contentam com isso
(vide Sergei Fedorov, que cismou de sair, mesmo que para ganhar menos
e/ou jogar em times de pouca expressão — e Fedorov nunca mais conseguiu
um décimo da representatividade que tinha em Detroit), e é certo que
o dinheiro é imperativo para alguns. Mas não é o caso de Hossa, pelo
que demonstrou para jogar pelos Red Wings nesta temporada. Vamos ver
o caso de Franzen.
Que é possível manter ambos e manter um time competitivo, é. Que a gerência
dos Red Wings tem gabarito para tanto, é indiscutível. O resultado nós
veremos em junho próximo.
Marcelo Constantino ainda está chocado com a partida de Heinz Krug Junior.