Por: Marcelo Constantino

Nas últimas três eliminações do Detroit Red Wings nos playoffs, sobretudo e especialmente nas duas últimas, eu escrevi neste espaço artigos sempre ressaltando como o time amarelava quando a hora decisiva chegava, como faltava garra e luta à equipe como um todo. No fundo eu esperava por uma repetição disso nesta temporada. Porém, desta vez não. Desta vez os Red Wings foram bravos guerreiros.

Eles acabaram fulminados por uma sensacional virada dos Ducks no jogo 5 da final da Conferência Oeste. Absolutamente um jogo decisivo quando uma série está empatada, o jogo 5 foi praticamente um déjà-vu para os Wings — só que ao contrário. Na série anterior, quando tudo parecia caminhar para os lados do San Jose Sharks, Robert Lang empatou o jogo 4 nos últimos segundos e Mathieu Schneider virou o jogo na prorrogação. Os Sharks não conseguiram se recuperar do baque e perderam a série.

Diga-se de passagem, trata-se de um baque de proporções muito, mas muito grandes para qualquer time. É provavelmente pior que sofrer uma goleada acachapante. Você ter um jogo nas mãos para levar o gol de empate nos últimos momentos já é demolidor. Perder esse jogo logo a seguir, na prorrogação, é mais que arrasador — embora até seja uma conseqüência um tanto "natural" do ato anterior. E aconteceu com os Wings, no decisivo jogo 5 da série contra os Ducks, agora como vítima.

O Detroit dominava a partida, mas vencia apenas por 1-0. Desperdiçava vantagens numéricas, inclusive de dois homens. Essas duas deficiências graves e antigas da equipe — dominar jogos sem traduzir isso em gols e a falta daquele instinto matador — acabaram por cobrar seu preço, caríssimo, derradeiro e definitivo, no fim daquele jogo 5. Uma penalidade duvidosa foi marcada contra o Detroit, o técnico do Anaheim Randy Carlyle ousou e retirou seu goleiro e os Ducks conseguiram empatar. E depois viraram na prorrogação.

De nada adianta buscar escolher culpados individuais, sejam eles Pavel Dastuk (pela suposta penalidade), o juiz (por ter marcado a duvidosa penalidade e ainda mais naquele momento), Johan Franzen (por não ter conseguido rifar o disco da zona defensiva logo antes do gol de empate), Andreas Lilja (por bisonhamente perder o disco que acabou na rede de Dominik Hasek) ou quem quer que seja. Quem perdeu o jogo foi o time, que, mesmo dominando a maior parte do tempo, não conseguiu marcar mais de um gol. Eles tiveram várias e várias chances de matar o jogo, e desperdiçaram cada uma delas.

Mas não apenas isso: o Anaheim mostrou ser um time que, se jogava de um modo geral em equilíbrio contra o Detroit, ao menos tinha o instinto matador no fim das contas. Ou seja, quando era necessário, nas horas decisivas, seus jogadores decidiam.

De um modo geral o saldo desta temporada é positivo para os Red Wings. Muito positivo, eu diria, sobretudo em comparação às três últimas. Poucos apostavam no time desta vez, em grande parte diante dos repetidos fracassos passados e das evidentes deficiências que o time trazia. Mas esse time mostrou a todos que era mais do que se esperava. Jogadores como Pavel Datsyuk e Henrik Zetterberg diversas vezes desferiram trancos na zona de ataque, batalharam por discos nas bordas e jamais se intimidaram. Jogaram bem, marcaram gols, pressionaram, atacaram e marcaram com eficiência. Ainda falta algo mais de ambos? Sim, mas o estigma passado deve ficar no passado.

Durante os playoffs a equipe jogou sem seu defensor número 3, Niklas Kronwall, e ficou sem seu defensor número 2, Mathieu Schneider — não é qualquer coisa, é um defensor da elite da NHL —, para a série contra os Ducks. E, ainda assim, jogou de igual para igual e jamais se entregou. Aliás, essa talvez seja a principal característica desses novos Red Wings: jamais se entregaram. Até mesmo quando tudo parecia perdido, no jogo 6, perdendo por três gols de diferença, eles correram atrás e chegaram perto, muito perto: diminuíram a diferença para um gol e proporcionaram um sensacional fim de jogo, com uma forte pressão sobre Jean Sebastien Giguere.

Só que acabou ficando no "quase", ou o velho "já imaginou se...". Já imaginou se o time convertesse as vantagens numéricas de dois homens; se Datsyuk não tivesse supostamente interferido naquele final de jogo ou se o árbitro não tivesse marcado; se Franzen tivesse rifado aquele disco; se Nicklas Lidstrom não tivesse tentado bloquear o disparo de Scott Niedermayer; se Andreas Lilja não tivesse errado o passa na saída da defesa; se algum daqueles disparos nos segundos finais do jogo 6 tivesse entrado... Pois é, tudo isso que os Red Wings ficam imaginando na forma do "se" aconteceu efetivamente para os Ducks, lá atrás no jogo 5: o gol de empate no fim e a virada na prorrogação.

Esse Detroit é ainda um time que finalmente tem um goleiro confiável, ainda que em curva descendente e por, talvez, no máximo, mais uma temporada. Esse é um time que tem jogadores "de meio" que são grandes guerreiros, em especial Dan Cleary, talvez o jogador de ataque mais regular do time durante os playoffs. O corpo defensivo, que já gerava algumas dúvidas quando era completo, desfalcado de dois de seus melhores correspondeu bem, muito bem. É desnecessário classificar Lidstrom, mas vale ressaltar que Chris Chelios foi um monstro (ainda que dinossauro), Danny Markov foi ótimo e Brett Lebda e Lilja, infelicidade deste último à parte, superaram-se de um modo geral. Até a série contra os Ducks o time não havia sofrido mais que três gols numa partida.

Enfim, essa é uma base que deve ser mantida. Eles viraram jogos, marcaram gols de empate e da vitória no fim dos jogos e jamais perderam uma partida por diferença superior a dois gols. Batalharam sempre, jamais desistiram. Até o último segundo do jogo 6 da final contra o Anaheim.

Quando Mike Babcock levou o então Anaheim Mighty Ducks à final da Copa Stanley, uma frase dele tornou-se marcante na época: Os deuses do hóquei premiam os mais batalhadores. Na série deste ano contra os Wings os Ducks batalharam mais e venceram. Mas os Wings foram um time batalhador como poucas vezes visto antes.

Foi o time mais guerreiro do Detroit que eu vi em anos.

Marcelo Constantino nunca assistiu a tantos jogos de hóquei em playoffs da NHL quanto este ano.

Chris Carlson/AP
Com Dominik Hasek estirado no gelo, os Red Wings sofrem o quarto gol dos Ducks no jogo 6 — este seria o gol da vitória.

Daniel Mears/The Detroit News
Fim de temporada mais cedo para os Red Wings. Desta vez de cabeça erguida.
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Página publicada em 23 de maio de 2007.