Seja qual for o seu resultado final, a temporada 2009-10 ficará marcada na história recente do Detroit Red Wings.
Equipe com histórico de baixa rotatividade de jogadores, com poucas mudanças ao longo dos anos, o Detroit passou pela sua maior reformulação (quantitativa e qualitativa) na década, abrindo mão de jogadores importantes — Marian Hossa, Mikael Samuelsson, Tomas Kopecky e Ty Conklin, sem espaço no teto salarial, Jiri Hudler, por opção do jogador, e Chris Chelios, por opção da gerência — e contratando ou promovendo outros tantos para substituí-los — Todd Bertuzzi, Jason Williams e Patrick Eaves, contratados como agentes livres, e Darren Helm, Jonathan Ericsson e Jimmy Howard, promovidos do Grand Rapids Griffins.
De repente, eram muitas caras novas no time e, para piorar, de qualidade duvidosa. Um atacante cujos melhores anos ficaram para trás (Bertuzzi), outro que saiu de Detroit brigado com o treinador (Williams) e um que teve o contrato rescindido em seu último time (Eaves). Contra os garotos não havia críticas, exceto pela ampla desconfiança na capacidade do goleiro Howard.
Diante deste cenário, os Red Wings perderam para o Chicago Blackhawks o favoritismo na até então dominada Divisão Central.
A abertura da temporada, na Suécia, com duas derrotas para o St. Louis Blues, foi uma prévia do que o Detroit apresentaria constantemente em seus jogos seguintes: viradas inexplicáveis sofridas em poucos minutos, incompetência absoluta para matar penalidades, incapacidade de atuar durante 60 minutos com constância.
De volta à América, os Red Wings perderam Johan Franzen, que sofreu danos nos ligamentos do joelho, logo no terceiro jogo da temporada — a primeira vitória do time na campanha —, contra o Chicago Blackhawks. Vinte e um dias depois, no 11.º jogo, foi a vez de Valtteri Filppula quebrar o pulso. Então, em menos de um mês, a equipe perdeu justamente os dois atacantes de quem mais dependia para substituir a produção ofensiva dos que foram embora.
Apesar das baixas, a equipe cresceu ao longo do mês de outubro, mas só conseguiu ultrapassar a marca dos 50% de aproveitamento no último jogo do período, na vitória sobre o Calgary Flames, no Canadá, fechando o mês com 5-4-3, 13 pontos conquistados em 24 possíveis.
Com os triunfos sobre Boston Bruins e San Jose Sharks, ambos em Detroit, no começo de novembro,
os Red Wings venceram três jogos seguidos pela primeira vez na temporada.
Na partida seguinte, contra o Toronto Maple Leafs, um dos piores times da liga até então, os Wings mostraram sua vocação para perder jogos considerados fáceis. Foi também neste jogo que Williams quebrou a perna, a terceira baixa no ataque.
Para recompor o elenco, a gerência requisitou o atacante Drew Miller, colocado na Desistência pelo Tampa Bay Lightning, após disputar 14 jogos e não pontuar uma vez sequer. O que esperar de um jogador que não serviu nem para o Lightning?
Howard assumiu o posto de titular do time quando Chris Osgood foi afastado por causa de uma gripe. Se Osgood imaginasse o que viria a seguir, teria tomado mais vitamina C. O novato Howard não largou mais o gol, atuando com consistência e compilando bons números, conquistando a confiança do treinador Mike Babcock.
Ponto alto do mês de novembro: a nova sequência de três vitórias consecutivas, incluindo duas goleadas (9-1 no Columbus Blue Jackets e 7-4 no Anaheim Ducks). Ponto baixo: duas derrotas seguidas em Detroit sem marcar gol (2-0 para o Atlanta Thrashers e 3-0 para o Calgary Flames). A campanha no mês teve 8-5-1, com 60,7% de aproveitamento dos pontos.
No jogo do dia 21 de novembro,
contra o Montreal Canadiens, a quarta baixa do time: o defensor Niklas Kronwall, que contundiu os ligamentos do joelho. O sueco era o melhor da equipe na posição quando se machucou.
A primeira semana de dezembro foi negativa, com derrotas para Edmonton Oilers, outro time entre os piores da liga, e New Jersey Devils. Quando os torcedores já estavam acostumados à sina de perder um jogador por semana, a situação ficou ainda pior. Na derrota para os Blues, no dia 9, em Detroit, Dan Cleary machucou o ombro. Três dias depois, Helm sentiu o pulso. Mais dois dias e Ericsson levou uma joelhada na parte interna do joelho, sofrendo uma contusão no osso.
Neste ponto, a lista de contundidos chegou a oito: Franzen, Filppula, Williams, Kronwall, Cleary, Helm, Ericsson e Andreas Lilja, defensor que está desde fevereiro sem atuar por causa de uma síndrome pós-concussão. Todos os jogadores listados seriam titulares, alguns atuando tanto em vantagem quanto em desvantagem numérica.
Os torcedores dos Wings se lembram da "tradição" de perder um defensor todos os anos, vítima de contusão no joelho. Foi assim com Chris Chelios, Jiri Fischer, Derian Hatcher. Mas as proporções a que o quebra-quebra
chegou são inéditas na equipe, que vai superar por muito o seu recorde de jogadores perdidos por contusão em uma temporada.
Na vitória contra o Phoenix Coyotes, no dia 14, os Wings enviaram ao gelo um time que tinha Justin Abdelkader, Eaves, Ville Leino, Brad May, Miller e Kris Newbury. Nenhum torcedor do Detroit imaginou que um dia isso pudesse ser a escalação de ataque da equipe.
Apesar dos desfalques, os Red Wings venceram os três últimos jogos — dois deles graças a Bertuzzi, autor de dois gols na prorrogação em noites seguidas —, alcançando a marca de 4-2-1 em dezembro, com mais sete jogos a disputar até a virada do ano.
Nesta caminhada até o fim do conturbado 2009, é provável que a defesa titular três jogadores (Brett Lebda, Derek Meech e Doug Janik) que não estariam atuando se não fossem as contusões.
Com todos os tropeços e dificuldades, a equipe se mantém na briga por uma vaga nos playoffs. Seria inimaginável a pós-temporada da NHL sem o Detroit, mas os torcedores sentiram que isso poderia acontecer — e ainda pode, caso a "bruxa" continue à solta, vitimando os jogadores do time.
Aos poucos os atletas contundidos retornarão ao gelo. Helm já deve atuar nos próximos dias, Filppula pode voltar depois do Natal. Em meados de janeiro, será a vez de Williams, Kronwall, Cleary e Ericsson. Para Franzen o caminho é mais longo, fora até março. E Lilja sequer sabe se um dia poderá jogar novamente.
Quando o time estiver completo, Babcock terá uma profundidade no elenco até então não conhecida.
Ele não contava com a evolução de Abdelkader, que deveria estar na AHL, mas revelou-se pronto para a grande liga, nem com Miller, achado no "lixo" e que agradou em cheio aos torcedores, ou com Eaves, líder do time em +/-.
Com companheiros de primeira linha, literalmente, e menos pressão para carregar o time, talvez Henrik Zetterberg e Pavel Datsyuk reencontrem o melhor hóquei.
Da adversidade pode nascer um time muito mais forte. E todo mundo sabe do que o Detroit é capaz.
AP |
AP |