Dois jogos em Detroit. Duas vitórias dos Red Wings. Dois jogos em Pittsburgh. Duas vitórias dos Penguins. Mais um jogo em Detroit. Mais uma vitória dos Wings. Mais um em Pittsburgh, outra vitória dos Pens. E aqui estamos no jogo 7 da série final com uma situação raríssima: sempre o time que jogou em casa venceu.
Se compararmos com a série passada, os Wings venceram em seis jogos. Ganharam suas duas partidas iniciais em casa e mais duas em Pittsburgh: o jogo 4 e o jogo 6. Os Pens, por outro lado, chegaram a derrotar os Wings na Joe Louis Arena no jogo 5. Isso porque, vamos direto ao ponto, mando de gelo na NHL não tem tanta significância assim.
Aliás... eu, pessoalmente, sou do princípio que "mando de campo" não influencia em nada — com exceção da Copa Davis de Tênis, pois lá você determina o tipo de piso onde vai jogar, e, eventualmente, pode escolher alguma quadra que desfavoreça seu adversário, como, por exemplo, utilizar saibro para enfrentar a Suíça... ou qualquer tipo de piso que não seja saibro para jogar contra o Brasil. Mas em outras ocasiões, sejamos racionais, o mando de campo influencia em quê? Pressão da torcida? No futebol o Brasil perdeu uma partida decisiva de Copa do Mundo (que não era uma final) em casa, com o Maracanã lotado. O Flamengo também já perdeu final de Copa do Brasil para o inexpressivo Santo André em casa, também com Maracanã lotado. No beisebol, o Boston Red Sox perdia uma série por 3-0 do New York Yankees e reverteu para 4-3 vencendo, claro, alguns jogos em pleno Yankee Stadium. E no hóquei? Se pressão de torcida contasse, visitantes não venceriam jogos em Detroit ou em Minnesota. E o mesmo vale para qualquer outro esporte. Um time que tiver jogadores frios com a cabeça no lugar certamente não se importa com o barulho da torcida ou as vaias.
A NHL é uma prova desta tese. A torcida norte-americana, por mais fanática que seja, geralmente costuma exercer pressão bem menor que torcida brasileira, inglesa ou argentina de futebol. Com as franquias menos tradicional, então, este fator nem mesmo existe. É 0%. E isso é fruto de uma cultura que não cabe analisar aqui — mas basta dizer que torcedor norte-americano (e aqui inclui estadunidenses e canadenses) tem mais com que se preocupar de que como seu time preferido de hóquei, futebol americano, beisebol ou lacrosse está se saindo. Torcedor protesta? Sim, protesta. Basta lembrar do caso dos torcedores do Toronto que enfiaram sacos escritos FÃ DESAPONTADO nas cabeças, para simbolizar a vergonha do time. Mesmo assim... alguém aí já ouviu falar sobre torcida organizada invadindo treino dos Leafs para esmurrar os jogadores? Isso é coisa de quem não tem o que fazer. E basicamente ao sair de um jogo, mesmo uma torcida fanática como a do Edmonton Oilers, por exemplo, pode esquecer a eliminação ao se concentrar em coisas como sua rotina de trabalho e de estudos.
Então, voltemos a Wings e Pens, afinal, o assunto do artigo é o jogo 6 da Copa Stanley. Este foi, sem dúvidas, o jogo mais equilibrado destas finais — a simetria de que Alexandre Giesbrecht falou aqui esteve mais evidente de que nunca. E isso, obviamente, é um sinal da ausência de fator mando de gelo que defendo. O Detroit não toma conhecimento dos Penguins e parte para cima, mesmo jogando em Pittsburgh, exigindo o melhor trabalho de Marc-André Fleury. E isso esteve menos evidente na sexta partida de que na terceira, também realizada em Pittsburgh, quando os Wings bombardearam a trave dos Pens e fizeram de Fleury a grande estrela da noite.
Contando ou não, fato é que o mando de gelo foi coincidentemente funcional nesta tão simétrica decisão. A última vez que os times alternaram resultados, sempre com vitória da franquia da casa, foi em 2003, na série entre New Jersey Devils e Mighty Ducks of Anaheim. Na ocasião os Devils, que tinham mando de gelo, foram campeões. Mas antes disso, já chegou a acontecer? Sim. Em 1965, numa final entre Chicago Black Hawks e Montreal Canadiens. Os Habs tinham mando de gelo. E levaram o título na última partida, em casa. E antes? Em 1955, com o Detroit Red Wings vencendo a Copa em cima dos Canadiens. Houve mais alguma série? Não.
Ou seja, esse equilíbrio em finais e essa confirmação de vitória do mandante de gelo são simplesmente aleatórios e raramente acontecem.
Se nos basearmos por estas três finais anteriores e também pelo que vem acontecendo na série, os Wings, então, venceriam a finalíssima e levariam a Copa. Mas esse palpite seria mero blefe. Não se basearia em nada, a não ser três coincidências do passado — duas delas ocorridas na Era Pré-Expansão.
E já houve alguma ocasião onde o time da casa venceu todos os jogos até a sexta partida, mas na finalíssima o visitante surpreendeu e conquistou o campeonato? Sim, apenas uma vez, em 1971, na série entre o Montreal Canadiens contra o Chicago Black Hawks, então mandante de gelo. As franquias alternaram vitórias em casa e, chegada a grande decisão, os Canadiens bateram os Hawks em Chicago e ficaram com a Copa.
O próprio jogo 7 em final de Copa Stanley não é lá muito comum. Esta é a 71ª decisão em que jogamos com esse sistema de eliminação, e em apenas 14 deles tivemos a última partida. Esta será a 15ª ocasião.
O que será do jogo 7 desta final? Teremos repetição de 1971, ou veremos o mesmo filme que em 2003, 1965 e 1955? Impossível de saber. Hóquei no gelo, sim, é um esporte onde qualquer previsibilidade é incerta.
De qualquer forma, cinco finais em sete jogos numa mesma década é inédito em termos de final de Copa Stanley. Isso só mostra o quanto esta série está equilibrada.