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6 de junho de 2003
São só nove anos de diferença...

Por Alexandre Giesbrecht

Certos hábitos não fazem muito bem. Por exemplo, ouvir axé. Outro exemplo pode ser pegar a 23 de Maio às seis da tarde. E o mais importante: assistir a um jogo das antigas antes de um jogo das malfadadas finais da Stanley Cup deste ano.

Sim, eu cometi esse pecado mortal na última segunda-feira. Eu assisti ao jogo 7 das finais de 1994 antes do jogo 4 das finais de 2003. Que jogão! Chances reais de gol a todo instante, quase nenhum minuto jogado na zona neutra, emoção! Daí veio a triste realidade. Um jogo frio, sem gols e com pouquíssimas chances, concentrado quase que exclusivamente na zona neutra, o resultado do encontro dos dois times que melhor jogaram defensivamente nestes playoffs.

Será que eu achei o jogo 4 tão ruim por causa do meu flashback alguns instantes antes? Acho que não. Afinal, eu venho criticando o defensivismo exagerado da NHL atual já há algum tempo.

As finais de 1994 foram as últimas finais das antigas. No ano seguinte, os Devils venceram a Stanley Cup e consagraram a armadilha, que passou a ser usada por todo time que não tinha os recursos para contratar estrelas. Não por coincidência, 1995 foi a primeira de quatro finais consecutivas decididas em apenas quatro jogos.

E hoje somos obrigados a assistir a uma final com uma média de três gols por jogo (dos dois times!) e com uma média de chances por jogo só um pouquinho maior. A diminuição foi diretamente proporcional ao aumento do número de bocejos. Quem se arrisca a acompanhar um jogo que começa na TV às duas da manhã (caso dos dois primeiros jogos, que não foram transmitidos ao vivo para o Brasil), sabendo que os times vão fazer de tudo para pôr o espectador para dormir? Só os fanáticos.

E não é dos fanáticos que a NHL precisa. A NHL, para ser algo viável financeiramente, precisa daquele pessoal que gosta de esportes, mas não sabe exatamente em que cidade jogam os Panthers. É esse pessoal que vai aumentar a audiência. E é esse pessoal que não agüentar assistir a mais de uns cinco minutos de hóquei "jogado" com a armadilha.

Imagino a difícil situação em que se encontram os locutores André José Adler e Marco Alfaro, que fazem as transmissões da NHL pela ESPN. Eles, que assumem um papel de "tutores" para aqueles que não entendem muito de hóquei, têm de tentar passar uma emoção que não está presente no gelo. Nas finais de 1994, eles praticamente não teriam tempo para explicar as regras do jogo, simplesmente porque a ação não parava nunca.

Chega de reclamar. Até porque, bem ou mal, há finais acontecendo, goste-se ou não do modo como elas são jogadas.

Se após os dois primeiros jogos uma varrida dos Devils parecia inevitável, depois dos dois jogos seguintes ninguém mais aposta em nada. No jogo 5, que será jogado em Nova Jersey, tanto os Ducks podem sumir de novo, da mesma forma que o fizeram nos jogos 1 e 2, como podem voltar a dar tudo de si, como se jogassem em casa.

E o momento parece ser mesmo dos Ducks. A tendência parece ser a seguinte: (a) se os Ducks ganharem, levam a série no jogo seguinte, em casa; (b) se os Devils ganharem, é possível que tenhamos um jogo 7, que pode dar algum tipo de emoção a esta série.

Se os Ducks de fato ficarem com o título, eles vão ter muito a agradecer a Martin Brodeur, um dos maiores goleiros de sua geração. O bizarro gol que ele sofreu no jogo 3, quando o chute de Sandis Ozolinsh, da linha vermelha, passou pateticamente pelo goleiro, que tinha acabado de deixar o taco escorregar de suas mãos, pode ter sido o divisor de águas da série.

Mas, claro, estamos falando de Martin Brodeur, um goleiro que já tem duas Stanley Cups no currículo e que mantém performances sensacionais, apesar de usar um equipamento muito menor que o da maioria de seus colegas — suas proteções de perna são as menores da liga. Sua atitude em relação ao frango foi a melhor possível. Tudo bem, sua campanha na prorrogação ainda é lastimável, mas, se o ataque conseguir decidir o jogo nos 60 minutos, ele ainda tem a capacidade de garantir lá atrás.

O melhor episódio relacionado ao frango foi a reação de Jeremy, não aquele da canção do Pearl Jam, mas o filho do goleiro, de seis anos. O Brodeur mais novo, que se considera o treinador de goleiros do pai, ajoelhou-se na entrada do vestiário dos Devils, para mostrar a Martin como ele deveria ter apelado ao estilo "borboleta" para impedir o gol.

Eu não podia deixar de mencionar... -- No dia 5 de outubro de 1965, os astros se alinharam como nunca antes, e o mundo do hóquei ganhou duas super-estrelas: Patrick Roy e Mario Lemieux. A aposentadoria de Roy já é um fato, mas, pelas suas mais recentes atuações, ainda dá para acreditar que ele poderia jogar mais dois ou três anos. Só que ele decidiu que a hora é essa, e a torcida do Avalanche vai ter de conviver com esta decisão. Com a aposentadoria de Roy e a possível debandada de Peter Forsberg, os Avs tornam-se um time comum, que deverá finalmente ser superado em sua divisão, algo que há nove anos não acontece.

Enquanto isso, a aposentadoria de Lemieux parece ser apenas uma questão de semanas até ser anunciada. Quer dizer, surgiram boatos durante o último fim de semana, que davam conta de que Lemieux iria vender sua parte no comando dos Penguins e assinar como agente livre com Rangers, Flyers ou Canadiens, por algo em torno de US$ 15 milhões (R$ 45 milhões, quase o dobro do último prêmio acumulado da Mega Sena).

Na segunda-feira, Lemieux apressou-se em desmentir os boatos, dizendo que, se ele jogar na próxima temporada, será com a camisa preta e dourada dos Penguins. Realmente, os boatos não faziam muito sentido, e não digo isso só pelo fato de que vieram da boca de Al Strachan, o falastrão colunista do jornal sensacionalista Toronto Sun.

Por falar nele, o analista da ESPN americana Bill Clement esteve no programa de rádio de Mark Madden, na WEAE de Pittsburgh, e contou a seguinte história: a fauna do hóquei ocasionalmente inventa histórias e começa a falar delas quando Strachan está por perto. O colunista, obviamente, "arregala as orelhas". A partir daí, é só esperar pela menção das tais histórias inventadas na coluna de Strachan ou em alguma aparição dele na TV, o que invariavelmente acontece.

Quão fácil você acha que seria para Lemieux vender sua parte de um time sem estrelas, composto quase que totalmente por jovens desconhecidos, numa liga que pode implodir daqui a pouco mais de um ano? E o que são US$ 15 milhões, perto do lucro que o astro pode ter se deixar para vender suas ações depois que a liga for (supostamente) reestruturada e o time estiver com sua nova arena já em construção?

Isso sem falar no seu legado. Lemieux tem uma ligação com a cidade de Pittsburgh. Em toda a sua carreira, nunca defendeu outro time. Ora, o estádio dos Pens fica na Praça Mario Lemieux, 66. Será que ele jogaria mesmo tudo isso no lixo para defender os odiados Rangers ou os ainda mais odiados Flyers?

Alexandre Giesbrecht, 27 anos, prometeu nunca mais assistir a jogos pré-1995 antes de assistir a jogos atuais.
AH, QUE SAUDADES Pavel Bure marca contra Mike Richter no jogo 3 das finais de 1994 (Alexandre Giesbrecht/The Slot BR, reprodução da TV - 06/1994)
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Página publicada em 4 de junho de 2003.