Mike Keenan voltou a treinar um time da NHL. Mais que isso: ele voltou a um time da Divisão Noroeste, e esse é que é o grande detalhe de sua temporada. Afinal, o seu Calgary Flames vai pegar oito vezes o Vancouver Canucks.
E o que tem isso de mais? Ora, Keenan foi aquele que, quando era o gerente geral do Florida, mandou, praticamente de graça, o goleiro Roberto
Luongo para Vancouver. Ou seja, o pessoal do extremo oeste canadense ama esse cara. Eles provavelmente idolatram-no. Muitos seriam capazes de beijar os pés do homem que não só os deu um goleiro de excelente calibre, como ainda livrou-os de mais martírios nas mãos de Dan Cloutier.
No último sábado, Flames e Canucks enfrentaram-se pela primeira vez em 2007-08, e o assunto inevitavelmente infestou as pautas de entrevistas com Keenan. O diálogo seguiu-se assim:
— Mike, ahn... você acha que poderia comentar sobre o goleiro que Roberto Luongo se tornou...
— Ora — respondeu Keenan, depois de perceber que seu entrevistados não terminaria a pergunta devido ao mais puro constrangimento —, o Roberto vai jogar hoje?
Esta última frase foi imediatamente seguida de risadas coletivas. Depois de elas arrefecerem, o técnico continuou:
— Não acredito que eu disse isso. — Seguiu-se nova pausa. — Bem, o pessoal me ama em Vancouver.
Ainda bem que ele sabe disso. Não que ele não se arrependa. É capaz de ele nunca admitir, mas possivelmente ele se arrepende da troca todos os dias, ainda mais depois de o atual GG dos Panthers, Jacques Martin, ter colocado lenha na fogueira ainda na semana passada, ao declarar ao jornal Miami Herald que considerava essa troca a pior da história da NHL. Sim, a pior de todos os tempos. Será que isso feriu os sentimentos de Todd Bertuzzi, Alex Auld e Bryan "Má Notícia" Allen?
Não importa mais, é verdade, porque Keenan já está em um novo time, agora só na condição de técnico. Mas a torcida dos Flames deve sentir um frio na espinha quando se lembra de que seu time tem um excelente goleiro como titular e que... melhor eles nem pensarem nisso. Sendo Miikka Kiprusoff talvez o principal jogador do Calgary, tal pensamento pode até provocar taquicardia.
Ao menos nos primeiros confrontos entre as duas equipes nesta temporada, o foco estará em Keenan por sua famosa troca. Mas é uma injustiça para com o próprio Luongo e com Kiprusoff. São dois dos melhores goleiros na liga. É quase um duelo de grandes atacantes às avessas. O jornal Calgary Herald chegou a compará-lo com os duelos entre Roger Federer e Rafael Nadal no tênis.
Kristian Huselius, dos Flames, que jogou com Luongo em Miami, concorda: "É uma boa comparação. O Kipper é o quietinho, como Federer. Nada parece incomodá-lo. Ele é tão sólido tecnicamente que faz tudo parecer fácil. O Luey é um cara mais emocional, um goleiro atlético de verdade, que consegue fazer grandes defesas. Como Nadal."
Nadal faz defesas? Preciso assistir a mais tênis.
Voltando ao assunto principal, o primeiro round dessa briga foi para Luongo, com a vitória de seu time por 4-3 na prorrogação. Foi um jogo lá e cá, bastante equilibrado, apesar da vantagem de dois gols que os Flames chegaram a sustentar no terceiro período, com direito a gol da vitória dos Canucks a menos de cinco segundos do final do tempo extra. Ou seja, valeu um ponto aos derrotados, que mereceram pelo que jogaram.
Por pouco, o jogo não se transformou em motivo de preocupação para os lados de Vancouver: quase no fim do segundo período, Luongo caiu ao gelo e se contorceu de dor, depois que seu próprio defensor, Aaron Miller, deu um tranco em cruz em Daymond Langkow, que caiu em cima do goleiro. Luongo seguiu no gelo e não preocupa a comissão técnica para os próximos jogos.
"Senti uma torção parecida com
a que senti no final da temporada passada", explicou Luongo. A mesma torção que quase o tirou dos playoffs e obrigou-o a jogar com dor até seu time ser eliminado. Se com dor ele classificou sozinho os Canucks à segunda fase — e depois foi, disparado, o melhor jogador de seu time na derrota em cinco jogos para os Ducks —, talvez essa quase torção logo na segunda partida do ano não seja um sinal dos piores.