Por: Marco Aurelio Lopes

Quando se pensa em um grande jogador vindo da gelada Finlândia, um dos primeiros nomes que vêm à cabeça é o de Teemu Selanne, um exímio artilheiro que há mais de uma década se mantém na elite da liga, com seus chutes certeiros e seus gols. No entanto, se hoje a liga conta com finlandeses como ele, Saku Koivu, Miikka Kiprusoff, entre outros, deve-se muito a um pioneiro que mostrou o caminho aos "suomi" de hoje. Embora não tenha sido o primeiro finlandês na NHL, o nome de Jari Kurri é facilmente lembrado como o primeiro astro vindo daquele país, e sem dúvida é até hoje o mais reverenciado deles, tendo sido um membro de destaque da grande dinastia do Edmonton Oilers dos anos 80.

Nascido em Helsinki em 18 de maio de 1960, Jari Pekka Kurri iniciou sua carreira profissional no famoso Jokerit da sua cidade natal, onde apenas com 17 anos já era membro da equipe principal na disputa da Liga Finlandesa, na qual participou por três anos, sendo que em 1980 teve seu melhor ano, marcando 23 gols em apenas 33 jogos. Já no nível internacional, foi membro da seleção júnior de seu país de 1978 a 1980, conquistando o título europeu da categoria na primeira participação, vencendo os soviéticos na decisão — com um gol seu na segunda prorrogação. Dois anos depois, no Mundial Júnior, ajudou a Finlândia a conquistar o terceiro lugar, no que seria a primeira medalha do país na competição. Tamanho talento o levou a participar da seleção principal nas Olimpíadas de Inverno daquele ano, em Lake Placid.

Dessa forma, os observadores do Edmonton Oilers selecionaram o rapaz, ainda desconhecido na América, no recrutamento de 1980, com apenas a modesta 69.ª escolha. Sem o domínio do inglês e ainda com dúvidas sobre o estilo de jogo da NHL, Kurri precisou ser "convencido" a migrar para o Canadá através de dois finlandeses que já atuavam pelos Oilers, Risto Siltanen e Matti Hagman. Decisão acertada. Apesar das dificuldades naturais de todo início de carreira em um novo mundo, Kurri foi abençoado por ter sido, em sua primeira temporada (1980-81) colocado na ponta-direita de um central que viria a ser o maior de todos — Wayne Gretzky. Bingo! Começava ali uma das maiores parcerias da NHL, afinal, Gretzky assistiu em 429 gols de Kurri. Àquelas alturas, os Oilers começavam a moldar um novo padrão para a liga, baseado em um jogo extremamente ofensivo, onde os gols saíam com naturalidade espantosa — tanto que vários recordes da equipe são recordes na NHL até hoje. Um elenco que contava com Mark Messier, Paul Coffey, Glenn Anderson, Esa Tikkanen, Steve Smith, Grant Fuhr, entre outros, e onde a dupla Gretzky-Kurri provia o toque final nas jogadas de ataque. E Kurri, que ao deixar Helsinki imaginava apenas jogar um ou dois anos em Edmonton, acabou se tornando um dos pilares do time que em 1984 desbancaria o New York Islanders para se tornar a nova dinastia do hóquei. Uma equipe que em sete temporadas conquistou cinco Copas Stanley.

O poderio ofensivo dos Oilers pode ser exemplificado por Kurri. Afinal, em dez anos na equipe de Alberta, o mínimo que conseguiu marcar em uma temporada foram "míseros" 32 gols — isso em suas duas primeiras temporadas. Vejamos: em 1983 se tornou o primeiro finlandês a marcar 100 pontos em uma temporada. No ano seguinte, o primeiro a marcar 50 gols, fato que repetiria nos três anos seguintes. Em 1985 estabeleceu um recorde para pontas-direitas, ao marcar 71 gols na temporada — recorde que durou até 1990, quando Brett Hull marcou 72 vezes — e 135 pontos. Neste mesmo ano, entrou para o clube dos "50-em-50", ao marcar seu 50.º gol no seu 50.º jogo — marca um tanto contestada, pois na verdade foi o seu jogo número 50, mas o jogo número 53 dos Oilers na campanha. Como se não bastasse, na pós-temporada atingiu mais duas marcas históricas : igualou Reggie Leach dos Flyers de 1976 ao marcar 19 gols, e se tornou o primeiro — e único até hoje — a conseguir quatro hat tricks. Um ano mágico para o "Finnish Flash", que seria coroado com a sua segunda Copa Stanley e o troféu Lady Byng (de espírito esportivo aliado à performance no gelo). Curiosamente, este foi o único troféu individual que Kurri conseguiu em sua carreira na NHL.

Quando Gretzky foi negociado com o Los Angeles Kings em 1988, Jari assumiu a responsabilidade de produzir os pontos para o time. Nas duas temporadas sem o "The Great One", Kurri marcou 195 pontos em 154 jogos — suficientes para torná-lo o 25.º jogador na NHL a alcançar 1.000 pontos na carreira — e garantir aos Oilers sua quinta Copa. No entanto, uma oferta milionária o fez trocar o campeoníssimo Oilers por uma experiência na desconhecida liga Italiana, onde defendeu o Milano Devils em 1991 — só para constar, foram incríveis 75 pontos em 30 jogos. Mas a possibilidade de voltar a jogar com Gretzky falou mais alto, e em maio de 1991, em uma negociação que envolveu Oilers, Flyers e Kings, Kurri desembarcou em L.A., onde reviveu a mágica parceria com Gretzky. Em sua melhor temporada na Califórnia, a de 1992-93, marcou 27 gols e 87 pontos, em uma campanha que levou os Kings à sua única final de Copa Stanley, onde perdeu para o Montréal Canadiens em cinco jogos, além de se tornar o primeiro jogador treinado na Europa a marcar 500 gols. Lá ficou até 1996 — em 1994-95, uma volta à casa, quando aproveitou o locaute da NHL para defender seu Jokerit —, quando foi negociado com o New York Rangers, onde não teve muito sucesso. Ainda viria a disputar mais duas temporadas na NHL, em 1996-97 com o Mighty Ducks of Anaheim, onde jogou com seu "sucessor" Teemu Selanne, e no ano seguinte com o Colorado Avalanche, quando, mesmo já pensando em se aposentar, resolveu jogar mais um ano para tentar mais uma Copa Stanley, o que não aconteceu, mas onde alcançou a glória de marcar seu 600.º gol, o oitavo jogador na história. Nesta última temporada, disputou ainda seu oitavo Jogo das Estrelas, pela seleção Mundial, enfrentando Gretzky e Messier, que jogaram pela seleção da América.

Nas competições internacionais, disputou ainda quatro mundiais — apenas porque na maioria das vezes os Oilers ainda estavam no páreo pela Stanley Cup, o que o impedia de defender sua Seleção —, ficando com o vice-campeonato em 1994, três Copas do Canadá, a Copa do Mundo de 1996 e as Olimpíadas de Inverno de 1998, sua última competição profissional, onde, no seu último jogo, ajudou a Finlândia a ganhar a medalha de bronze em Nagano, em uma disputa de terceiro lugar contra o Canadá de seu amigo Gretzky, marcando inclusive um dos gols da partida. Ao todo, foram 65 jogos com a camisa azul-clara e branca da Finlândia, marcando 26 gols e 52 pontos.

Jari Kurri encerrou sua carreira após estes Jogos, deixando um legado para toda uma nação, já que mostrou aos finlandeses que eles poderiam obter êxito na América do Norte. Embora sua grande marca fossem as precisas tacadas de primeira, Kurri também sempre foi reverenciado pela sua habilidade defensiva, o que também foi muito importate na sua parceria com Gretzky, pois ajudava na marcação ao adversário, deixando Gretzky livre para criar e infernizar os rivais. Ainda é o segundo europeu com mais pontos na NHL (1398, fruto de 601 gols e 797 assistências), atrás apenas de Jaromir Jagr, e 18.º jogador no geral. Seus 1.043 pontos com os Oilers ficam apenas atrás de Gretzky. E seus 106 gols e 233 pontos em playoffs são a terceira marca da equipe, atrás de Gretzky e Mark Messier.

Após sua aposentadoria em 1998, foi indicado com o 50.º posto na eleição da "The Hockey News" dos 100 maiores jogadores da história, sendo o melhor ranqueado entre os escandinavos. Em 2001, se tornou o primeiro finlandês a fazer parte do Salão da Fama do Hóquei. No mesmo ano, teve sua camisa 17 aposentada pelo Edmonton Oilers, fato que a seleção nacional da Finlândia também o fez. Kurri é tão idolatrado em seu país que a liga finlandesa o homenageou criando o Troféu Jari Kurri, similar ao Conn Smythe da NHL, prêmio dado ao melhor jogador dos playoffs desde 1993-94. Hoje em dia, depois de atuar como comentarista da TV finlandesa, Jari Kurri é o gerente geral da seleção. Se os canadenses procuram um novo "The Great One", os finlandeses procuram um novo "Finnish Flash". E quem sabe um dia Kurri não conseguirá encontrá-lo.


Jari Pekka Kurri
Ponta-direita, nascido em 18/05/1960 em Helsinki, Finlândia.

Carreira na NHL:
— Temporada regular
Edmonton Oilers (1980-1990): 754 jogos, 474 gols, 569 assistências, 1.043 pontos e 348 minutos de penalidades.
Los Angeles Kings (1991-1996): 331 jogos, 108 gols, 185 assistências, 293 pontos e 171 minutos de penalidades.
New York Rangers (1996): 14 jogos, um gol, quatro assistências, cinco pontos e dois minutos de penalidades.
Mighty Ducks of Anaheim (1996-1997): 82 jogos, 13 gols, 22 assistências, 35 pontos e 12 minutos de penalidades.
Colorado Avalanche (1997-1998): 70 jogos, cinco gols, 17 assistências, 22 pontos e 12 minutos de penalidades.
Total (1980-1998): 1.251 jogos, 601 gols, 797 assistências, 1.398 pontos e 545 minutos de penalidades.
— Playoffs:
Edmonton Oilers: 146 jogos, 92 gols, 110 assistências, 202 pontos e 101 minutos de penalidades.
Los Angeles Kings: 28 jogos, dez gols, dez assistências, 20 pontos e 16 minutos de penalidades.
New York Rangers: 11 jogos, três gols, cinco assistências, oito pontos e dois minutos de penalidades.
Mighty Ducks of Anaheim: 11 jogos, um gol, duas assistências, três pontos e quatro minutos de penalidades.
Colorado Avalanche: quatro jogos, nenhum gol, nenhuma assistência, nenhum ponto e nenhum minuto de penalidade.
Total (1980-1998): 200 jogos, 106 gols, 127 assistências, 233 pontos e 123 minutos de penalidades.

Marco Aurelio Lopes informa que não solicitou fotos a ninguém da redação. E que se espelha em Dudu e Mec para falar dos craques do passado da NHL.
Fonte: OilersHeritage.com
Em seu primeiro ano o jovem Jari já treinava seus chutes. Entre temporada regular e playoffs, mais de 700 encontraram o fundo do gol.
Fonte: OilersHeritage.com
Kurri e Gretzky em início de carreira. Essa parceria se tornou uma das mais letais da história da NHL.
Fonte: OilersHeritage.com
Kurri e Glen Sather, técnico do Edmonton Oilers, posam com a Copa Stanley, em 1985, ano da segunda conquista consecutiva.
Fonte: Jokerit.com
Esa Tikkanen e Kurri, ainda como companheiros do time júnior do Jokerit de Helsinki...
Fonte: OilersHeritage.com
... e anos depois, já em Edmonton, celebrando o título da Copa Stanley.
Fonte: LegendsofHockey.net
Sem Gretzky, mas com Mark Messier e Kevin Lowe, entre outros, Kurri conquista a quinta Copa Stanley para os Oilers.
Fonte: LegendsofHockey.net
Em 1991, após um ano na Itália, Kurri trocou o azul de Edmonton pelo preto de Los Angeles, e ao lado de Gretzky levou os Kings a final da Copa Stanley.
Fonte: Slam! Sports
Hora do adeus — em seu último jogo, o abraço do eterno parceiro Gretzky. Por obra do destino, os dois estavam em lados opostos, nas Olimpíadas de Inverno de 1998.
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Página publicada em 14 de março de 2007.