Após esmiuçar o caos institucional que vem maltratando o Chicago
Blackhawks nos últimos dez anos e desmascarar o hediondo Bill
Wirtz, voltamos. E por que voltamos? Porque temos um compromisso
com o nosso leitor. Temos um compromisso com a verdade. Prometemos
e aqui estamos para analisar o final do ciclo de Trent Yawney e o
feliz início de Denis Savard no comando do time. E, apesar de
ninguém ter pedido, veremos quais são os jovens valores que estão
no sistema da franquia.
Trent Yawney: culpado ou inocente?
O que é mais fácil: juntar todos os jogadores, empacotá-los, selar
e enviar via Sedex para a Papua Nova Guiné (onde os canibais da
tribo Fore estão sempre com alta carência protéica e gostariam
muito de reverter essa situação, tendo bem alimentados atletas
como prato principal) ou mandar o treinador embora?
Exatamente por isso Yawney caiu. Ele teve sua parcela no insucesso
da equipe, mas não pôde realmente fazer muito. Foi um dos treinadores
que mais perdeu comandados por contusão na última temporada. Nikolai
Khabibulin, Tuomo Ruutu e Adrian Aucoin passaram boa parte do
tempo no departamento médico. E, quando você perde seu mais experimentado
atleta, sua maior revelação e seu principal defensor numa equipe
sem profundidade como era — continua sendo — o caso
dos Hawks, a coisa desanda.
Passado o pesadelo de 2005-06, vieram os reforços tão pedidos
por Yawney. Martin Havlat e Michael Handzus chegaram com a missão
de fornecer o poderio ofensivo que faltava. Não foram poucos os
que passaram a considerar o Chicago uma das prováveis surpresas
para esta temporada. Principalmente após a chegada do ex-atacante
dos Senators.
Logo no primeiro jogo, uma orgia (?) de gols na vitória por 8-6
contra o Nashville Predators. Havlat, com quatro pontos, teve
a estréia oficial sonhada por qualquer atleta. Handzus também
produzia. Tudo ia bem até que o destino, tal qual Alexander Ovechkin,
deu um tranco por trás em Yawney. Em menos de 24 horas, ele perdeu
seus dois principais reforços.
Havlat liderava a liga em pontos (13) até se contundir contra
o Dallas Stars, na sétima partida do Chicago. O prognóstico foi desalentador
(cerca de um mês fora, prazo que, mais tarde, foi estendido).
Mas nada é tão ruim que não possa ser piorado. Após perder seu
líder ofensivo, foi a vez de Handzus. O eslovaco vinha com sólidos
oito pontos e +4 quando machucou o joelho contra os Blues. Final
de temporada para o central.
Ah, ainda nos jogos de pré-temporada, o talentosíssimo finlandês
Tuomo Ruutu (que parece ter herdado todo o bom hóquei da família
Ruutu, já que é irmão do limitadíssimo ponta Jarkko
Ruutu, dos Penguins) contundiu-se e perdeu os primeiros dez jogos da temporada.
Khabibulin também seguiu o mesmo rumo dos citados acima.
Com tantos desfalques, a equipe passou a ir na contramão da liga,
tentando diminuir a velocidade dos jogos. Não deu resultado. Jogo
feio que não dá resultados numa franquia há muito sem crédito
com seu torcedor foi a corda no pescoço do nosso amigo Yawney.
Não raro, o gerente geral Dale Tallon dava pitacos, principalmente
criticando a má — segundo ele — utilização de jovens como Jeff Hamilton
e Tony Salmelainen. O tempo, como você verá mais à frente, vem
dando razão a Tallon nesse tópico.
Após perder 12 de 15 jogos, Tallon chamou o treinador em seu escritório
e, tal qual Topete Justus, soltou a clássica frase: "Você está
demitido! Ponha-se daqui para fora, infeliz!"
Mesmo destino que tiveram Craig Hartsburg, Dirk Graham, Lorne
Molleken, Alpo Suhonen e Brian Sutter. Só para citar os últimos.
Para o lugar de Trent, foi chamado o eterno assistente de treinador
Denis Savard, com curta passagem como treinador principal (tampão)
na temporada de 2000-01, também pelo Chicago.
Savard, um histórico Hawk
Eu poderia escrever muitos parágrafos sobre a história de Denis
Savard como jogador dentro do próprio Chicago Blackhawks, mas,
como tenho a terceira temporada de Lost aqui pronta para ser degustada,
contente-se com poucas linhas mesmo. Savard é o terceiro maior
pontuador da história do cacique de Chicago, atrás apenas de Stan
Mikita e Bobby Hull. Membro do Hall da Fama do hóquei, teve sua
camisa número 18 aposentada pela franquia. Defendeu também as cores
do Montreal Canadiens (onde venceu sua única Copa Stanley, em 1993)
e do Tampa Bay Lightning.
Início vitorioso
Três jogos, três vitórias. Agônicas, é verdade, mas, para o torcedor
dos Blackhawks, ver seu time atingir essa seqüência positiva após
fase tão ruim já é alentador. O editor-chefe me mandou o tape
de dois desses jogos. (Por que não um jogo dos Sabres ou dos Ducks,
seus tarados? Também quero me divertir!) O da estréia do novo técnico, contra
os Stars e, seguindo a seqüência, o jogo contra os Blues.
O Dallas Stars, um adversário de respeito, foi o ponto de partida
para esse novo ciclo. Não foi uma partida técnica. Os Stars são
uma equipe pesada e que não contou com Mike Modano no início da
partida (por conta da estranha queda de um dos melhores patinadores
da NHL, ainda no aquecimento). Muitos discos rifados para ser
recuperados com trancos. A velha escola norte-americana. Isso
refletiu-se no placar, baixo para os padrões atuais da liga: 2-1
em favor dos Hawks, que jogaram frente a uma torcida curiosa,
querendo ver a nova roupagem que Savard daria ao time. Ele havia
prometido uma postura mais ofensiva, mas vimos o mesmo dos jogos
anteriores: poucas chances geradas. Boa parte delas no terceiro
período, onde duas foram aproveitadas. Ruutu foi o destaque individual.
Já contra os Blues chega ser complicado analisar. Vencê-los é
obrigação. Ok, eu sei que eles têm Dallas Drake, e este é capaz
de mudar o rumo de um jogo (como fez contra o Detroit recentemente),
mas, ao contrário de Gretzky, que tinha Jari Kurri, Mark Messier
e Paul Coffey, Drake está praticamente sozinho em sua luta. Nesse
jogo, notamos uma mudança de atitude nos Hawks. A ofensividade
prometida apareceu em doses mais generosas. Muitas jogadas rápidas,
em especial dos finlandeses Salmelainen e Ruutu. E mais vontade
nas bordas. Parece que toda mudança de treinador gera mais vontade.
Parece ser uma verdade universal. O placar final foi um pouco
enganoso: dos cinco gols, dois foram contra uma meta vazia, quando
os Blues tentavam marcar seu terceiro na partida. Outro ponto
positivo foram as boas intervenções de Khabibulin. Confiança é
parte muito importante no rendimento de um goleiro, e ele parece
estar recuperando isso.
A terceira vitória foi contra os líderes da Divisão Central, os
Predators, e em território inimigo. Sem dúvida que o placar de
4-3 deixou o gerente geral Tallon com um sorriso maior do que
o prestígio que a TheSlot.com.br tem na Eslovênia. Os jogadores
que ele dizia que estavam sendo pouco e mal aproveitados pelo
antigo treinador ganharam mais presença com Savard. Salmelainen
e Hamilton foram os destaques. Esse último, em dia inspirado,
com seu primeiro hat trick na NHL. E ainda deu o passe para Salmelainen
marcar o seu. Por falar em passe, foi Radim Vrbata (aquele mesmo
que apareceu bem no Avalanche há alguns anos e que hoje lidera
os Hawks em pontos) que serviu o gol de Hamilton no tempo extra.
Um gol que deixa os torcedores dos Hawks se perguntando se tudo
isso é pra valer mesmo, ou apenas aquele entusiasmo que geralmente
acontece quando se muda de comando (para ler mais sobre isso,
consulte uma postagem recente de Alexandre Giesbrecht no blog
da redação).
Isso só o tempo vai dizer, mas o Chicago tem, sim, condições de
buscar esse complicado sonho de ganhar respeitabilidade. Basta
Ruutu, Khabibulin e Havlat (que deve voltar ainda nesta semana)
se manterem longe das macas e a alta cúpula não se desprender
de ótimos valores, como os defensores Brent Seabrook, Duncan Keith
e Lasse Kukkonen.
O que tem no sistema?
Assim como o Pittsburgh Penguins, os Hawks acumularam escolhas
altas após temporadas de fiascos memoráveis e podem ter em breve
uma equipe com base em escolhas de primeira rodada. Claro que
não tão prodigiosas quanto a da equipe da Pensilvânia. Tuomo Ruutu
(9.ª escolha geral em 2001) e Brent Seabrook (14.ª em 2003) já estão
rendendo dividendos. Três outros são esperados com ansiedade.
Cam Barker (terceira geral de 2004) é um dos melhores defensores da
nova safra canadense. Forte em ambos os lados do gelo, tem habilidade
para ser o responsável por levar o disco até a zona ofensiva.
Os atacantes Jack Kille (sétima geral de 2005) e Jonathan Toews (terceira
em 2006) são outros ótimos prospectos que já possuem boa bagagem, tendo disputado, pelas seleções dos Estados Unidos e Canadá respectivamente,
mundiais de juniores e outras competições onde estavam presentes
atletas como Evgeni Malkin e Anze Kopitar.
Bem, com isso encerramos a segunda parte dessa histórica coluna.
Não pela qualidade, é claro, mas sim porque foi a primeira vez que
uma revista do hemisfério sul levou a seus leitores, informações
sobre os Blackhawks em duas edições consecutivas. Pouca coisa?
Eduardo Costa ficou muito honrado
e, até certo ponto, envergonhado por ter sido citado por
tão nobres (nem tanto), cultos (às vezes) e educados
(nunca) companheiros de redação na última edição
dessa pitoresca publicação.
VOLTANDO A
VENCER Tony Salmelainen (8) e Jeff Hamilton (51)
comemoram o gol que deu a terceira vitória consecutiva
dos Hawks. Ambos foram um dos motivos pela mudança de
treinador em Chicago.
(Mark Humphrey/AP - 02/12/2006)
SAVARD
O novo treinador Denis Savard, entre Denis Arkhipov e Martin
Lapointe. Em 881 jogos com atleta da franquia, Savard somou
1096 pontos.
(Nam Y. Huh/AP - 29/11/2006)
À ESPERA
DO ALMOÇO Os canibais da Papua Nova Guiné
já estavam esperando carne branca vinda da América.
"Quem sabe os Blues não quebram nosso galho. O nº
7 deles é bem gordinho", babou Bago-Bago, líder
da tribo Fore.
(Arquvo pessoal de Eduardo Costa)