Duas das maiores equipes dos últimos dez anos da National Hockey League, Detroit Red Wings e Colorado Avalanche acumularam conquistas e sucesso incondicional ao custo de milhões e milhões de dólares destinados ao pagamento das exorbitantes folhas salariais até então existentes na liga.
Claro que não era o dinheiro que vencia os jogos, vide o exemplo do New York Rangers e seu elenco repleto de jogadores supervalorizados. Mas também não podia ser desprezada aquela máxima de que "dinheiro não traz felicidade". Trouxe, sim, para Wings e Avs, por ter sido bem empregado.
Entretanto, o teto salarial de US$ 39 milhões presente no novo acordo coletivo de trabalho colocou os rivais mais uma vez como os principais times da liga, desta vez no quesito "os maiores prejudicados". Muito acima do limite máximo, tiveram de se desfazer não apenas de alguns bons jogadores, mas também de um pouco de sua história.
E enquanto a restrição salarial, aliada a outros problemas, afunda o Avalanche, os Red Wings parecem intactos às mudanças no jogo.
Detroit Red Wings
A folha de pagamento da versão 2003-04 dos Red Wings atingia a casa dos US$ 80 milhões, o dobro do que a NHL permite gastar nos dias de hoje em que, com metade deste valor, Detroit é o número um da liga. É como se cortar 40 milhões de dólares em salários fosse tão simples e não gerasse efeitos colaterais.
Se antes de outubro eram vistos como azarões, graças ao teto salarial que limitou a política da equipe, os Wings atualmente estão em uma sequência de seis vitórias e somam nove triunfos na temporada. A única derrota foi sofrida em casa para o Vancouver Canucks, quando o time morreu por atuar em dois dias seguidos.
O segredo do sucesso do time está em grande parte nas mãos de Pavel Datsyuk e Henrik Zetterberg, que lideram o time em gols (sete) e pontos
(13), respectivamente. Formam a dupla de ouro do time, responsável não só pelo presente, mas também pelo futuro da equipe. Os veteranos Brendan Shanahan, Robert Lang e Mathieu Schneider também estão em ótima fase, dando a impressão de que a idade ainda não os afeta tanto.
Mas os maiores destaques são mesmo os jogadores dos quais pouco se esperava, ou você não está se perguntando de onde veio Mikael Samuelsson?
O sueco é mais um excelente achado de Ken Holland e o time de olheiros dos Red Wings, especialistas em encontrar bons jogadores, seja no recrutamento ou perdido em algum país da Europa. E foi na Finlândia que Jason Williams, antigo desafeto da torcida, sagrou-se artilheiro da liga local, mas é em Detroit que ele escreve seu nome entre os principais artilheiros do time, sendo o líder em assistências (dez).
Outros achados da gerência incluem Johan Franzen e Dan Cleary, atacantes com elevado senso defensivo, e Andreas Lilja, que estava desperdiçado no Nashville Predators e que aos poucos se adapta ao papel de guarda-costas de Nicklas Lidstrom, para que esse se junte ao ataque com freqüência sem que a defesa fique desprotegida.
Em se tratando de defesas — no plural —, não houve ninguém melhor na última semana que Manny
Legace, goleiro titular da equipe, eleito pela liga o jogador defensivo dos últimos sete dias, por vencer todos os três jogos que disputou, registrando ótimos números e ainda um shutout.
Ao compilar 9-1-0 nos dez primeiros jogos, não sabia o treinador Mike Babcock que dirigia o elenco responsável pelo melhor começo de temporada da rica história dos Red Wings. Foi necessária uma ligação de Holland para avisar ao treinador, que pouca importância deu ao feito. Em suas palavras, Detroit se preocupa com o fim da temporada, não com o início.
Babcock intensifica os treinamentos das equipes especiais e o resultado é visto no gelo. Os Red Wings têm o segundo melhor aproveitamento de vantagem numérica e o terceiro melhor de desvantagem numérica da liga. Com tamanha excelência nas diversas situações de jogo, os Wings somam o melhor ataque da liga com a defesa menos vazada em média de gols sofridos por jogo.
E mais: o capitão Steve Yzerman disputou apenas dois jogos na temporada. Será um bom reforço para o time quando recuperar-se de uma insistente contusão na virilha.
Se é possível fazer tudo isso com apenas US$ 39 milhões, por que gastavam o dobro?
A maior ressalva ao bom desempenho da equipe até aqui vem do próprio calendário de jogos realizados. Com exceção de Los Angeles Kings e San Jose Sharks, as demais vitórias foram sobre times ruins ou em má fase. Quatro delas contra os dois piores do Oeste, St. Louis Blues e Columbus Blue Jackets. Quando encararam um time bem estruturado, os Wings foram derrotados.
Colorado Avalanche
Chegará o dia em que o fã do Avalanche perdoará a NHL? Porque perdão é o mínimo que a liga pode pedir por "tirar" de Denver um dos maiores jogadores já vistos, o sueco Peter Forsberg.
Sem condições de abrigar tantas estrelas em um mesmo teto salarial, os Avs se viram obrigados a optar entre Forsberg e o capitão Joe Sakic. Prevaleceu a escolha óbvia: Super Joe.
Ainda na mesma linha, também foram obrigados a decidir entre Rob Blake e Adam Foote e, embora o segundo fosse mais idolatrado entre os fãs, não havia como rejeitar Blake.
De uma só vez os Avs perderam Forsberg e Foote, dois dos maiores ícones do time em toda sua curta e vencedora história. E a conseqüência disso veio tão veloz quanto a tristeza dos fãs: derrota na estréia, outras três derrotas em casa em sequência e a inexplicável mania de perder jogos em grandes viradas.
Contra o Nashville Predators, no quarto jogo da temporada, os Avs venciam por 3-0 até a metade do segundo período, mas sofreram o empate. Quando a partida estava 4-4 já nos minutos finais, David Aebischer cometeu uma penalidade estúpida em Simon Gamache. Na oportunidade em vantagem numérica os Predators marcaram o gol da vitória.
Uma semana depois, desta vez recebendo os Kings, os Avs abriram 4-1 no placar, mas a partir da metade do segundo período tudo mudou. Com três gols em onze minutos os Kings empataram, e no terceiro período, no último minuto, Craig Conroy marcou o gol da vitória.
Após nove jogos, embora tenha o segundo melhor ataque da liga, os Avs somam apenas nove pontos, com a pífia campanha de 4-4-1, o que garante apenas a quarta posição na Divisão Noroeste. Nas estatísticas encontram-se bem classificados nos times especiais, porém o aproveitamento de faceoffs é péssimo.
O que vem afundando o time é o desempenho da dupla de goleiros, David Aebischer e Peter Budaj. Juntos registram média de 3,33 gols sofridos por jogo e apenas 87,6% de defesas, com vantagem para Budaj, o reserva. Aebischer em toda sua carreira nunca teve números tão ruins.
Os Avs também pecam por indisciplina, cometendo penalidades desnecessárias por chutar o disco após sofrer um gol ou atingir um soco no adversário, por exemplo.
O mais curioso é que o goleador do time na temporada é o defensor Patrice Brisebois, com cinco gols, e o artilheiro também vem da linha azul, John-Michael Liles, dono de 11 pontos. Brisebois foi contratado como agente-livre, sendo o principal reforço do time ao lado do central Pierre Turgeon, que imediatamente após sua chegada declarou que não era um Forsberg. Também não é um Turgeon, já que deixou seu melhor hóquei em algum lugar do passado.
O treinador Joel Quenneville recentemente teve problemas para escalar o time. Milan Hejduk perdeu os seis primeiros jogos da temporada recuperando-se de uma cirurgia e Dan Hinote ainda não está livre de uma contusão nas costas. Outra decisão sua é manter fora do time os veteranos defensores Bob Boughner e Kurt Sauer, demonstrando no mínimo coragem. O próximo na fila para sair do time, dizem, é Andrew Brunette. Quenneville decidiu também o futuro do calouro Wojtek Wolski, recrutado na 1ª rodada em 2004. Mesmo marcando seis pontos, Wolski foi mandado de volta para seu time júnior porque caso disputasse mais um jogo pelos Avs teria de passar toda a temporada em Denver.
O gerente-geral Pierre Lacroix, reconhecidamente um dos mais talentosos da liga — embora tenha feito más negociações
nos últimos anos —, já se movimentou para reforçar o Avalanche até a data-limite de trocas. Lacroix rejeitou oficialmente as opções contratuais de Sakic e Blake para a próxima temporada, salvando cerca de 700 mil dólares na atual folha de pagamento, dinheiro que pode ser usado em uma troca futura.
É apenas uma questão de tempo para que os Avs se adaptem ao novo estilo de jogo da liga. Basta que suas estrelas remanescentes voltem a brilhar.
GOLAÇO
O sueco Henrik Zetterberg (40) marca um gol espetacular contra o Columbus Blue Jackets. Radoslav Suchy (21) foi apenas um dos três adversários driblados por Z-Man (Terry Gilliam/AP - 24/10/2005)
EM RECUPERAÇÃO O goleiro David Aebischer, em má fase, se atira no gelo e impede o gol de Jani Rita, do Edmonton Oilers. Desta vez os Avs venceram (David Zalubowski/AP - 25/10/2005)