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13 de dezembro de 2002
A Semana da Paixão para os treinadores

Por Thomaz Alexandre

Mesmo tendo dado início à sua via-crucis muito mais tarde, durante os primeiros 24 jogos da atual temporada, Darryl Sutter concluiu-a mais rapidamente e foi o primeiro a pagar pelos pecados de seus mais de 20 atletas. Sutter recebeu o recado bombástico do GG do San Jose Sharks Dean Lombardi, e, a partir daí, era mais um treinador da NHL sem emprego.

Já Greg Gilbert, após duas temporadas e meia com os Flames, vem carregando seu ícone de madeira pesada há bem mais tempo. Há todo o tempo, provavelmente, já que nem mesmo na época em que assistia Don Hay atrás do banco ele viu o Calgary passar tantos anos fora da pós-temporada. Mas em 2001-02, sua única temporada completa como treinador do time, usou seus reforços Roman Turek e Rob Niedermayer para elevar o time no início da temporada. No fim da mesma, estava lá o Calgary Flames na fila de espera dos playoffs por 17 pontos.

Além de ter carregado a cruz por muito pouco tempo até atingir o fim da linha, Sutter também teve um período muito mais significativo como operador de milagres, passando mais de cinco temporadas pelas bandas de San Jose e sendo capaz de aumentar o total de pontos da equipe ao fim de cada uma delas. O que faz de Sutter muito mais experimentado para estrelar uma peça na Sexta-Feira Santa ou Alto De Natal do que Gilbert. Até porque, por mais ilhas de talento que se encontre em Calgary, todos sabiam que seus meninos não passavam de lutadores bem intencionados, mas sem os recursos para vencer. Drury, Gelinas e Yelle não fizeram de um time ainda sem defesa, sem goleiro — quem é Turek? —, e sem liderança — quem é Niedermayer? —, um candidato aos playoffs. As verdadeiras decepções, o pecado, estão em San Jose.

O que é o "capitão" Owen Nolan num momento desses? Não se pronuncia, não é com ele, deixa a apatia do time rolar e o homem que lhe confiou a liderança do time ser punido? Será que o "erro" pelo qual Sutter está pagando é, na verdade, ter atribuído funções tão importantes a veteranos que, à vista de alguma adversidade (no caso deste ano, a demora para assinar com o goleiro número 1 e um defensor do time), deixam a intensidade cair até o mais abissal dos níveis?

Para reflexão: Nolan vinha apresentando sintomas de uma concussão nos últimos momentos de Sutter na equipe e continuou fora do time no primeiro e único jogo com o treinador interino.

Se uns vão, outros vêm -- A vaga de Sutter já está preenchida, tudo de acordo com a promessa do GG californiano de que não perderia mais do que poucos dias procurando pelo substituto. E ele só precisou de um candidato e cinco minutos com este no escritório para fechar a contratação: Ron Wilson era a escolha mais previsível e correta que poderiam tomar.

Wilson já tem uma década em suas costas na NHL, tendo passado quase metade de uma em Anaheim e mais do que a metade da mesma em Washington. Com os Ducks, foi o primeiro a levar a eterna piada a estender sua temporada além do meio de abril. Com o Washington, atingiu as finais da Stanley Cup, venceu dois títulos de divisão e estabeleceu o time como um vencedor crível na Conferência Leste. Pelo menos durante a temporada regular. Pelo menos antes de Jagr...

Em Calgary, fala-se de Jimmy Playfair, 38 anos, que venceu a Calder Cup como campeão da AHL em 2000, seu primeiro ano pelo Saint John Flames. Esses Flames são o time de desenvolvimento dos Flames da NHL.

Enquanto a experiência e o estilo disciplinador de Wilson são necessários para lidar tanto com os veteranos difíceis quanto com os atordoados novatos, a novidade iminente em Playfair deve aclimatar melhor os inexperientes Flames. Não a ponto de fazerem um mundo além do que faziam por Gilbert, até porque sua abordagem deve ser semelhante, mas pelo menos para trazer o público de volta ao Saddledome.

E, com Wilson, podem os Sharks revalidar os prognósticos dos muitos que os deram como favoritos este ano? Podem. Ele é um treinador que gosta de dar mais tempo aos jogadores mais experientes, de colocar um sistema simples e eficaz e de começar pelo básico: acertar a defesa. Nada mal quando Nabokov e toda a rotação têm tido atuações sub-qualificadas. Wilson também conhece bem Selanne e provavelmente sabe como fazer ele voltar a marcar como em Anaheim. Agora que o finlandês está tão fora da mídia, ele tem tudo para assumir uma faceta mais "Peter Bondra". Tudo bem que alguns dos novatos podem se desesperar com a recente fama de Wilson não revelar ninguém e de aconselhar GGs a negociar blocos de bons prospectos com quem abra mão de um veterano. Mas não há problema: Ron promete ser flexível, e Lombardi já responde mandando Lynn Loins para as ligas menores.

Mas os resultados também serão cobrados rápido. Os Sharks não assinam contratos de muitos anos com treinadores. E não têm medo de rescindir os curtos bem antes de acabar.

Balançando -- E a ciranda acabou? Não... O que não falta é gente produzindo abaixo do esperado neste ano. Como nenhum GG tem coragem de penalizar dezenas de jogadores milionários, alguns dos engravatados a seguir podem pagar o preço.

Barry Trotz, Nashville Predators: O que fazer se o time só mantém e contrata atacantes de terceira linha, se seu maior artilheiro se contunde e se você, dia sim, dia não, perde por um gol? Não muito, mas, mesmo assim, a diretoria no Tennessee deve achar que os Preds já deveriam ser um concorrente aos playoffs após quatro anos completos. Pobre Trotz, outro que faz seu melhor...

Brian Trottier, New York Rangers: Aqui nem se pode falar em balançar o elenco, pois poucos desses superfaturados jogadores seriam acomodados em alguma outra folha salarial da liga. E quando esses Rangers dão segurança a um técnico? Maior folha de pagamento e capa da edição passada como fracassados. Estar em sétimo da conferência, um ponto à frente do 11.º não é maravilhoso, mas deixaria de ser péssimo se os Rangers não precisassem de três jogos a mais para consegui-lo (e ainda têm quatro jogos a mais que o oitavo e o nono, e cinco a mais que o décimo). Alguns acham que o jeito de Trottier é realmente lento e que ele vai endireitar o time. Vamos ver se Glen Sather tem esse entendimento. Ou essa paciência.

Bob Hartley, Colorado Avalanche: Não adianta dizer que a situação deles não é tão ruim quanto a dos Sharks. Pois as expectativas aqui eram de se manter decidindo títulos, e não começar a disputá-los. O nono lugar na conferência não é bom indicador de sucesso, e os ouvidos dos jogadores parecem estar fechados para Robert. Pois talento naquela escalação é o que não falta, vaza até para as ligas menores. Por ora, ele diz não haver motivo para pânico.

Bobby Francis, Phoenix Coyotes: Sean Burke faz falta, mas será esse um bom álibi frente a um Gretzky ávido por se mostrar valioso como administrador?

Peter Laviolette, New York Islanders: Peca tanto tempo fora, Yashin pouco se importando, Osgood emulando uma peneira, Mike Milburry como GG. Não, nenhum dos quatro paga o preço. Até porque o último deles é quem aperta o botão vermelho.

Curt Fraser, Atlanta Thrashers: O elenco do Atlanta não é tão ruim como se pensa. Fora Heatley e Kovalchuk, há jogadores de respeito, como McEachern, Kozlov, Smehlik, Stefan, Nurminem e, agora, Dafoe. Se formos inferir pelas ameaças que o GG Don Wadell faz, ou a defesa dos Thrashers sai da 30.ª posição ou Fraser sai para o seguro-desemprego.

Bruce Cassidy, Washington Capitals: Jagr, Lang, Bondra, Gonchar. Gols? Nada. Só mesmo Kolzig segurando tudo. Ele já prometeu que seu esquema de dar liberdade aos atacantes no início da temporada deve mudar. E é bom para ele que funcione.

Na fila - E alguns nomes fora vão precisar ser acionados para aliviar parte dessa carnificina. Peso, a esses nomes, não falta.

Bob Gainey: Ex-técnico e GG dos Stars/North Stars, assistiu Pat Quinn na campanha da medalha de ouro em 2002, onze anos após disputar a Stanley Cup pelo Minessota. Como jogador, venceu cinco títulos pelo Montreal e, como grande atacante defensivo, foi nomeado membro do Hall Da Fama. Canadense, sabe lidar bem com times jovens e poderia ser um bom nome para o Calgary se Playfair fosse descartado.

Larry Robinson: Companheiro de Gainey, ganhou um título a mais que ele pelo Montreal e também terminou no Hall Da Fama. Como treinador, foi discreto nos Kings, mas despontou pelo New Jersey Devils, onde ganhou a Stanley Cup de 1999-2000 após salvar um time que caía vertiginosamente ao fim da temporada, que Robbie Ftorek começou comandando. Dá muita liberdade aos jogadores, faca de dois gumes que se virou contra ele ainda em New Jersey, e é um nome para quem quer apenas voltar aos eixos. Washington e Colorado lhe caem bem.

Barry Melrose: Levou os Kings às finais em 1993. Já disse que poderia ir para os Caps se Ron Wilson fosse para a ESPN. E disputar uma Stanley Cup contra o próprio, ele encara?

Darryl Sutter: Para não mais nadar com tubarões. Poderia estar com um grande time, precisando este ou não de um pouco mais de disciplina e respeitabilidade, coisas que Sutter constrói. Rangers, Caps, Avs ou Isles para ele.

Thomaz Alexandre desenvolveu essa coluna pelo interesse do assunto e pela saudade dos pitacos coletivos na Slot.
NADANDO COM OS TUBARÕES Ron Wilson comanda o San Jose em sua estréia vitoriosa sobre o Columbus. Marchment, Harvey, Thornton e Smith esperam para mostrar serviço (John Todd/AP - 06/12/2002)
 
O QUE É QUE HÁ, VELHINHO? Greg Gilbert não entende o árbitro Stephen Walkom. Seus patrões não entenderam as 13 derrotas do time, incluindo esta aí, por 4-2, para os Caps (Joe Giza/Reuters - 27/11/2002)
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Página publicada em 11 de dezembro de 2002.