Nas últimas três eliminações do Detroit Red Wings nos playoffs, sobretudo
e especialmente nas duas últimas, eu escrevi neste espaço artigos sempre
ressaltando como o time amarelava quando a hora decisiva chegava, como
faltava garra e luta à equipe como um todo. No fundo eu esperava por
uma repetição disso nesta temporada. Porém, desta vez não. Desta vez
os Red Wings foram bravos guerreiros.
Eles acabaram fulminados por uma sensacional virada dos Ducks no jogo
5 da final da Conferência Oeste. Absolutamente um jogo decisivo quando
uma série está empatada, o jogo 5 foi praticamente um déjà-vu para os
Wings — só que ao contrário. Na série anterior, quando tudo parecia
caminhar para os lados do San Jose Sharks, Robert
Lang empatou o jogo 4 nos últimos segundos e Mathieu Schneider virou
o jogo na prorrogação. Os Sharks não conseguiram se recuperar do baque
e perderam a série.
Diga-se de passagem, trata-se de um baque de proporções muito, mas muito
grandes para qualquer time. É provavelmente pior que sofrer uma goleada
acachapante. Você ter um jogo nas mãos para levar o gol de empate nos
últimos momentos já é demolidor. Perder esse jogo logo a seguir, na
prorrogação, é mais que arrasador — embora até seja uma conseqüência
um tanto "natural" do ato anterior. E aconteceu com os Wings, no decisivo
jogo 5 da série contra os Ducks, agora como vítima.
O Detroit dominava a partida, mas vencia apenas por 1-0. Desperdiçava
vantagens numéricas, inclusive de dois homens. Essas duas deficiências
graves e antigas da equipe — dominar jogos sem traduzir isso em gols
e a falta daquele instinto matador — acabaram por cobrar seu preço,
caríssimo, derradeiro e definitivo, no fim daquele jogo 5. Uma penalidade
duvidosa foi marcada contra o Detroit, o técnico do Anaheim Randy Carlyle
ousou e retirou seu goleiro e os Ducks conseguiram empatar. E depois
viraram na prorrogação.
De nada adianta buscar escolher culpados individuais, sejam eles Pavel
Dastuk (pela suposta penalidade), o juiz (por ter marcado a duvidosa
penalidade e ainda mais naquele momento), Johan Franzen (por não ter
conseguido rifar o disco da zona defensiva logo antes do gol de empate),
Andreas Lilja (por bisonhamente perder o disco que acabou na rede de
Dominik Hasek) ou quem quer que seja. Quem perdeu o jogo foi o time,
que, mesmo dominando a maior parte do tempo, não conseguiu marcar mais
de um gol. Eles tiveram várias e várias chances de matar o jogo, e desperdiçaram
cada uma delas.
Mas não apenas isso: o Anaheim mostrou ser um time que, se jogava de
um modo geral em equilíbrio contra o Detroit, ao menos tinha o instinto
matador no fim das contas. Ou seja, quando era necessário, nas horas
decisivas, seus jogadores decidiam.
De um modo geral o saldo desta temporada é positivo para os Red Wings.
Muito positivo, eu diria, sobretudo em comparação às três últimas. Poucos
apostavam no time desta vez, em grande parte diante dos repetidos fracassos
passados e das evidentes deficiências que o time trazia. Mas esse time
mostrou a todos que era mais do que se esperava. Jogadores como Pavel
Datsyuk e Henrik Zetterberg diversas vezes desferiram trancos na zona
de ataque, batalharam por discos nas bordas e jamais se intimidaram.
Jogaram bem, marcaram gols, pressionaram, atacaram e marcaram com eficiência.
Ainda falta algo mais de ambos? Sim, mas o estigma passado deve ficar
no passado.
Durante os playoffs a equipe jogou sem seu defensor número 3, Niklas
Kronwall, e ficou sem seu defensor número 2, Mathieu Schneider — não
é qualquer coisa, é um defensor da elite da NHL —, para a série contra
os Ducks. E, ainda assim, jogou de igual para igual e jamais se entregou.
Aliás, essa talvez seja a principal característica desses novos Red
Wings: jamais se entregaram. Até mesmo quando tudo parecia perdido,
no jogo 6, perdendo por três gols de diferença, eles correram atrás
e chegaram perto, muito perto: diminuíram a diferença para um gol e
proporcionaram um sensacional fim de jogo, com uma forte pressão sobre
Jean Sebastien Giguere.
Só que acabou ficando no "quase", ou o velho "já imaginou se...". Já
imaginou se o time convertesse as vantagens numéricas de dois homens;
se Datsyuk não tivesse supostamente interferido naquele final de jogo
ou se o árbitro não tivesse marcado; se Franzen tivesse rifado aquele
disco; se Nicklas Lidstrom não tivesse tentado bloquear o disparo de
Scott Niedermayer; se Andreas Lilja não tivesse errado o passa na saída
da defesa; se algum daqueles disparos nos segundos finais do jogo 6
tivesse entrado... Pois é, tudo isso que os Red Wings ficam imaginando
na forma do "se" aconteceu efetivamente para os Ducks, lá atrás no jogo
5: o gol de empate no fim e a virada na prorrogação.
Esse Detroit é ainda um time que finalmente tem um goleiro confiável,
ainda que em curva descendente e por, talvez, no máximo, mais uma temporada.
Esse é um time que tem jogadores "de meio" que são grandes guerreiros,
em especial Dan Cleary, talvez o jogador de ataque mais regular do time
durante os playoffs. O corpo defensivo, que já gerava algumas dúvidas
quando era completo, desfalcado de dois de seus melhores correspondeu
bem, muito bem. É desnecessário classificar Lidstrom, mas vale ressaltar
que Chris Chelios foi um monstro (ainda que dinossauro), Danny Markov
foi ótimo e Brett Lebda e Lilja, infelicidade deste último à parte,
superaram-se de um modo geral. Até a série contra os Ducks o time não
havia sofrido mais que três gols numa partida.
Enfim, essa é uma base que deve ser mantida. Eles viraram jogos, marcaram
gols de empate e da vitória no fim dos jogos e jamais perderam uma partida
por diferença superior a dois gols. Batalharam sempre, jamais desistiram.
Até o último segundo do jogo 6 da final contra o Anaheim.
Quando Mike Babcock levou o então Anaheim Mighty Ducks à final da Copa
Stanley, uma frase dele tornou-se marcante na época: Os deuses do hóquei
premiam os mais batalhadores. Na série deste ano contra os Wings os
Ducks batalharam mais e venceram. Mas os Wings foram um time batalhador
como poucas vezes visto antes.
Foi o time mais guerreiro do Detroit que eu vi em anos.
Chris Carlson/AP |
Daniel Mears/The Detroit News Fim de temporada mais cedo para os Red Wings. Desta vez de cabeça erguida. |