Por
Alexandre Giesbrecht e Marcelo Constantino
André José Adler é o narrador dos jogos da NHL
na ESPN desde 1994. A maior parte da nova geração de torcedores
deste esporte no Brasil associa aquele visual branco do gelo com o disco
rolando à voz dele. E mais: a maioria aprendeu boa parte das
regras com ele, que, incansavelmente, busca explicar o que está
acontecendo no gelo, além de sempre difundir os fóruns
de informação sobre a NHL no Brasil, como a lista de e-mail
NHLbr e o canal #nhl da Brasnet (Mirc), além da própria
The Slot BR.
Aos 60 anos de idade recém-completos (no último 21 de
junho), nascido em Budapeste, Hungria, Adler já é tido
como o padrinho do futebol americano no Brasil e tem tudo para ser o
mesmo do hóquei no gelo por aqui. Ainda que muito pouco conhecido
no País, o hóquei tem nele um grande apoiador dentro da
própria ESPN. Mas ele dá o alerta: "A popularidade
de qualquer esporte cresce com a sua prática. É ela que
força a divulgação, a sua mídia."
Para quem não sabe, vale explicar que Adler não é
o responsável pela programação da ESPN para a América
Latina e nem mesmo tem ingerência direta sobre isso. Sempre que
pode — e isso já ocorreu algumas vezes —, ele consegue
puxar uma sardinha para o hóquei e fazer com que a emissora programe
alguma partida para o Brasil. Não podemos pensar que a ESPN,
ou qualquer outra emissora, irá preterir, por exemplo, a NBA
para transmitir hóquei, porque isso confronta a lógica
empresarial. Infelizmente.
A entrevista nos foi concedida por e-mail, logo após as finais
da Copa tanley, e atualizada posteriormente, na semana passada, mas,
ao lermos as respostas, temos a impressão de que Adler estava
no mesmo recinto que nossos dois editores (que, por sinal, estavam em
São Paulo e no Rio, respectivamente).
Como alguém nascido na Hungria e criado no Brasil foi parar
em Bristol, CT?
Minha família chegou ao Rio quando eu tinha três anos e
meio. Virei carioca aos poucos e já aos 12 anos estreei na televisão,
como ator na TV Tupi do Rio de Janeiro. Garotinho metido, né?
Aos 34, depois de ter feito televisão, cinema e teatro como ator,
autor, produtor, diretor — e assistente de produção
e direção, é claro — e ainda ter produzido
e dirigido comerciais, senti que estava precisando aprender mais coisas
na vida e me mandei para a Europa. Vagabundeei por quatro meses, morando
em Paris, e voltei ao Brasil. Vendi carro e tal... e voltei para a França
um mês depois, crente que ia conseguir trabalho e viver por lá
mais um tempo! Só que não deu nada certo, e saquei que
iria ter que voltar para o Brasil rapidinho, porque o Fundo de Garantia
já tinha sido devidamente estourado! Mas eu tinha uma passagem
Paris—Nova York, que ganhei em permuta de trabalho. Aí
resolvi usar e passar 21 dias em Nova York, para ver como era. Era uma
nova escola de vida. Um recomeço. Cheguei a Manhattan em 1979
e acabei morando em Nova York até 1994, quando me mudei para
Bristol, depois de passar dois anos trabalhando na ESPN na base do trem
para lá e para cá todas as semanas.
Como exatamente você foi parar na ESPN?
Inesperadamente. Em Nova York, enquanto estudava teatro, comecei a me
sustentar usando o microfone. Só que era o dos ônibus de
turismo, enquanto eu mostrava os pontos turísticos habituais
da cidade. Ou então o microfone de estúdios de dublagem.
Com os anos, eu comeci a fazer muitas traduções, desde
legendas para longa-metragem até certidões de nascimento
e versões em inglês para programas da Rede Globo. Gravei
muitos videos institucionais, fiz a voz em português de alguns
presidentes de companhias americanas em vídeos de empresa etc.
Uma vez, recebi um telefonema de uma agência, para a qual já
havia gravado o vídeo institucional da MTV, me chamando para
fazer um teste para a ESPN. Eu pensei que se tratasse de uma coisa igual
e disse para mandarem minha fita demo. Em seguida, recebi o telefonema
de uma pessoa contratada pela ESPN para recrutar brasileiros para o
serviço em português que estava em vias de ser lançado.
Eu? Narrar esportes? Não poderia imaginar, em 1992, o quanto
eu iria gostar e o quanto iria mudar a minha vida.
Além de narrar os jogos da NHL, quais são suas outras
atribuições na ESPN?
Sou o narrador principal de futebol americano há muitos anos.
Além disso, uma saudável variedade de esportes radicais,
boliche, patinação artística, boxe, rúgbi,
lacrosse, eventualmente golfe e competições caninas. É
quando ter o Gretzky [o husky siberiano de Adler] me ajuda muito!
Desde quando você narra a NHL para a ESPN? Já tinha
alguma outra experiência com o hóquei no gelo?
O hóquei foi o único esporte que me ofereci pra narrar.
Já estava havia alguns meses na ESPN, quando li no USA Today
sobre a aquisição de direitos. Eu disse para o chefe que
eu tinha interesse em experimentar narrar a NHL. Para falar a verdade,
a concorrência não foi muito grande por parte dos colegas.
Mas eu sempre tive admiração pelos jogadores e as habilidades
necessárias para praticar o esporte. Patinar mudando de direção
o tempo todo e acertar um disquinho de borracha com um taco é
uma conquista atlética. Aprendi o básico de narração
com o John Paul Della Camara [atual locutor oficial do Atlanta Trashers,
narrou vários jogos destes últimos playoffs na ESPN 2,
e foi um dos narradores para os Estados Unidos (ESPN, ABC) das duas
últimas Copas do Mundo de futebol], que foi um verdadeiro
mentor. Nos primeiros jogos, ele ficava na técnica dando dicas.
Foram vários jogos, inclusive playoffs. Mas ficou a vontade de
narrar as finais da Copa Stanley (entre Kings e Canadiens), já
que não tínhamos os direitos das finais. Já em
1993-94 fomos até o fim. E que Copa Stanley inesquecível!
Flavio Pereira fez comigo, mas a praia dele é mesmo futebol.
Depois entrou o Regis Nestrovsky para a ESPN. Ele já havia morado
em Toronto e curtia hóquei. Fizemos muitos bons jogos juntos.
Nesta época o Marco Alfaro, que fazia o antigo Sportscenter,
sempre conversava sobre a NHL comigo. Não me lembro por quê
ou como, mas houve a necessidade de entrar mais um no hóquei.
Então o Marco entrou, e a gente se afinou bem. Ele faz hóquei
com tanto prazer quanto eu, e aí estamos. Mais uma Copa Stanley
feita. Acho que já é a sétima dele. Para mim, foi
a número 11.
De quanto em quanto tempo você costuma vir ao Brasil?
Umas duas vezes por ano. Às vezes, três. Em 2004, já
fui quatro! Ano de banzo!
Quais são os seus ídolos dentre as pessoas ligadas
ao hóquei?
Meu cachorro se chama Gretzky. Fora "The Great One", que sempre
admirei, não só pelo talento e pela garra, eu tenho que
citar Mario Lemieux. O que ele já fez como pessoa, além
de jogador, pelo hóquei, mostra uma paixão e decisão
de grande homem.
E dentre narradores?
Dentre os narradores, o melhor é, sem dúvida, o Gary Thorne.
Quando eu crescer, quero ser como ele, só que acho que não
dá mais tempo!
Qual foi o melhor jogo que você já narrou?
Isto é mais difícil. Confesso que, como já narrei
tantos, e como narro vários esportes, eu esqueço muito.
Tipo vai para a lixeira do computador, para aliviar a memória
RAM. Mas esta Copa Stanley de 2004 foi certamente uma série de
alta competividade, técnica, talento e emoção.
Comparável apenas à Copa Stanley de 1994 e à determinação
de Mark Messier.
E o pior?
O pior jogo eu não lembro. Mas já narrei jogos chatos
de Stars, Capitals, Rangers, Hurricanes e Devils. Os piores eu tento
esquecer o mais rápido possível, para não pedir
para fazer mais golfe!
Na sua opinião, qual o time da NHL que detém a maior
torcida no Brasil?
Detroit Red Wings.
Você narrou duas das mais longas partidas da história
da NHL, Philadelphia x Pittsburgh, em 2000, e Anaheim x Dallas, em 2003
(as duas mais longas desde 1936!). Em algum momento bateu aquela insatisfação
com uma transmissão que já durava seis horas? Ou foi simplesmente
divertido?
Honestamente, foram desafios muito apreciados. A gente narra os atletas
batalhando contra o cansaço, e estas foram oportunidades de "atletismo
na cabine". Quem estiver olhando para o relógio não
pode narrar jogos de playoffs da NHL. No entanto, não faço
a menor questão de bater o nosso recorde!
Qual foi a situação mais engraçada que você
já viveu durante uma transmissão?
Uma de que me lembro foi durante um jogo na madrugada, que não
gravamos antes ao vivo. Não lembro os times. Mas eram aquelas
coisas que se arrastavam. Eu já havia feito um outro programa
antes. Num certo ponto, o Marco começou a contar aquelas boas
histórias que ele pesquisa pra enriquecer as transmissões,
e eu... dormi! Talvez três segundos, se tanto. Mas, quando dei
por mim, era a minha vez de falar, e eu disse, com aquele tom de recomeçar
a ação: "Dallas Cowboys!" O Marco olhou para
a minha cara, pasmo. Aí eu me toquei, e nem sequer o Dallas Stars
estava jogando! Minha única saída foi continuar: "...Dallas
Cowboys... um dos times batalhando nesta temporada da NFL, que você
assiste aos domingos e segundas na ESPN!"
Como é a relação com os outros brasileiros da
ESPN fora da emissora? Você costumam sair para fazer happy hours,
encontros de família etc.?
Alguns são mais próximos que outros. Mas já aconteceram
muitas boas festas.
Como brasileiro nascido húngaro, você já leu
o romance "Budapeste", de Chico Buarque?
Estou lendo. O Chico diz no livro: "...húngaro, única
língua no mundo que, segundo as más línguas, o
diabo respeita." Eu nem sabia que eu tinha poderes de exorcista!
Nós sabemos que o hóquei sobre o gelo, no Brasil, está
bem atrás de esportes como, por exemplo, o futebol americano
e o beisebol em termos de popularidade. Com a experiência que
você tem do futebol americano — em que você pôde
assistir à dinâmica do crescimento do número de
torcedores do esporte no Brasil — você arriscaria a palpitar
um prazo para que o número de torcedores da NHL por aqui seja
representativo?
Eu acho que há uns 4 anos havia mais times jogando in-line do
que hoje. A popularidade de qualquer esporte cresce com a sua prática.
É ela que força a divulgação. É ela
que força a sua mídia. Vocês aqui da Slot
e nós só podemos incentivar pelo exemplo da nossa dedicação.
Coisa que a gente vem fazendo direitinho, né?
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FIEL ESCUDEIRO Adler com Gretzky,
seu husky siberiano (cortesia André
José Adler) |
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DUPLA DE LOCUTORES Adler com
Gary Thorne, seu ídolo dentre os locutores de esportes (cortesia
André
José Adler) |
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PERFIL |
Nome de batismo |
Endre József Adler |
Data de nascimento |
21/junho/1944 |
Local de nascimento |
Budapeste, Hungria |
Time de futebol |
Flamengo |
Narra NHL na ESPN |
Desde 1992 |
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CINEMA |
Nem todos sabem, mas André José
Adler trabalhou no cinema brasileiro dos anos 60 e 70, tendo
sido ator e diretor em alguns filmes. |
COMO ATOR |
1974 |
A Estrela Sobe |
1972 |
A Viúva Virgem |
1970 |
O Bolão |
1970 |
Estranho Triângulo |
1969 |
Os Paqueras |
1969 |
A Penúltima Donzela |
1958 |
Pega Ladrão |
COMO DIRETOR |
1977 |
Nem As Enfermeiras Escapam |
1971 |
A Nova Estrela (curta) |
COMO ROTEIRISTA |
1975 |
O Estranho Vício do Dr. Cornélio |
1975 |
As Loucuras de um Sedutor |
1973 |
Os Mansos |
1973 |
As Moças Daquela Hora |
1962 |
A Viúva Virgem |
1970 |
O Bolão |
1970 |
Pais Quadrados... Filhos Avançados |
1969 |
Os Paqueras |
Fonte: iMDB.com |
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