Por
Alexandre Giesbrecht
Na semana passada, o comissário da NHL, Gary Bettman, e o presidente
da Associação de Jogadores da NHL (NHLPA), Bob Goodenow,
tiveram um encontro em Nova York e foram assistir a uma partida no Madison
Square Garden.
Acho que não poderia haver lugar melhor para eles irem do que
a casa do time sempre apontado como principal vilão na escaladas
dos salários da liga na última década. Os nada
menos que US$ 80 milhões que os Rangers pagam a seus jogadores
representam praticamente o dobro das folhas salariais de Penguins e
Predators. Juntos.
É claro que os Rangers não são os únicos
culpados. As regras do acordo coletivo de trabalho acertado em 1995
permitem tais gastos. Os jogadores, obviamente, aceitam os altos salários.
A liga insiste em dizer que tudo está bem, quando, na verdade,
está muito longe disso.
E ficamos os fãs de hóquei imaginando o que acontecerá
depois que a Copa Stanley for levantada, em junho próximo. A
ameaça de locaute será piorada pelo simples fato de que
a NHL aceitou 15 de setembro como data final do atual acordo coletivo.
Por que não 1.º de julho? É nessa data que os contratos
expiram, e será nessa data que a confusão vai se iniciar.
Agentes livres irrestritos ficarão no limbo, sem receber ofertas,
porque os times não poderão se dar ao luxo de fazê-las
sem saber o que vem pela frente. Agentes livres restritos correrão
o risco de não receber nem a oferta mínima – tornando-se,
pois, irrestritos –, pelo mesmo motivo. Não se sabe ainda
se o novo sistema, seja ele qual for, vai forçar ou desencorajar
a renovação de contratos das estrelas, por isso os gerentes
gerais ficarão mais perdidos do que muitos já são
quando o mês de julho chegar.
Se pegarmos o Detroit Red Wings como exemplo, podemos ver que a situação
é séria. O que farão eles quando os contratos de
Nicklas Lidstrom, Kris Draper, Tomas Holmstrom, Chris Chelios, Mathieu
Schneider, Brett Hull e Dominik Hasek expirarem? Normalmente, a chance
seria grande de que a maior parte deles renovasse contrato, mas as próximas
férias estarão mais distantes da "normalidade"
do que jogos ao vivo na ESPN International todos os dias da semana.
Jogadores com altos salários já estão sendo oferecidos
ao redor da liga, mas não há quem os leve. Os Penguins
cortaram drasticamente sua folha de pagamento fazendo exatamente isso:
Jaromir Jagr, Darius Kasparaitis, Robert Lang, Alexei Kovalev, Martin
Straka e outros menos cotados saíram simplesmente porque seus
salários tinham zeros demais. Se um teto salarial for instituído,
o time de Pittsburgh sairá na frente dos tradicionais gastadores
(Rangers, Avs, Wings, Stars e Flyers).
Essa solução radical tem sido apontada por muitos como
a melhor saída, mas ela provoca um belo inchaço na coluna
"derrotas" da classificação. Times na briga
pelo título não podem se dar a esse luxo. Melhor ganhar
agora, "enquanto dá", e aguardar o que vem por aí,
rezando para tudo dar certo.
Bem, no fim das contas, tudo vai dar certo. Só não se
sabe quando será o fim das contas. Os donos de times querem porque
querem um teto salarial. A NHLPA já disse que nem começa
a negociar tal regra, embora Goodenow já tenha dado uma declaração
incongruente (para não dizer estúpida) a respeito, dizendo
que alguns times já têm um teto salarial não-declarado.
Será que ele já ouviu falar sobre algo chamado "orçamento"?
Suponho que ele tenha um em casa.
Mark Madden, colunista do jornal Pittsburgh Post-Gazette, escreve: "Os
jogadores da NHL ficam com cerca de 76% da receita bruta da liga. Os
da NFL ficam com 64,25% de sua respectiva liga. Os da liga de basquete
ficam com 48%. A NHL quer que os jogadores fiquem com algo entre 55%
e 60%. Jogadores de hóquei ganhando um pedaço maior da
torta que jogadores de ligas mais populares desafia a lógica.
A NFL é, de longe, a liga profissional mais popular dos EUA.
Os donos de times ganham dinheiro. Os jogadores ganham dinheiro. É
uma parceria de verdade. Ninguém parece se sentir tapeado."
Aí vem Bill Guerin e diz: "O sistema da NFL é uma
piada. É o pior acordo coletivo de trabalho em qualquer esporte
profissional." Já seria uma declaração risível,
mas fica hilariante quando se lembra que Guerin é o mesmo jogador
que quase decepou a cabeça de um novato com uma tacada que mais
parecia uma machadada na pré-temporada de 2002-03.
Está mais do que claro que o sistema da NFL funciona para todo
mundo, e não apenas para os jogadores, como acontece na NHL.
Desde que o acordo coletivo atual começou, a receita da liga
aumentou 163%. Nada mau, não? Mas os salários aumentaram
252% no mesmo período. Pode até ser que a NHL esteja exagerando
quando diz que os times somaram um prejuízo de US$ 300 milhões
na última temporada, mas o crescimento dos salários realmente
está fora de proporção, ainda mais se comparado
com o declínio de interesse e audiência que a liga tem
experimentado desde que... bem, desde que houve o último locaute,
em 1994.
Madden continua: "Mario Lemieux e Wayne Gretzky, dois dos maiores
jogadores da história do hóquei, são donos de times
hoje e viram a insanidade fiscal da NHL dos dois lados. Tendo se aproveitado
das benesses de um sistema sem teto salarial, pode parecer hipócrita
da parte de Lemieux bater o pé por isso. Mas Lemieux nunca recebeu
todo o seu salário." É verdade. Lemieux sobrou com
promessas no valor de US$ 35 milhões e não achou outra
alternativa para receber seu dinheiro, a não ser ficar com uma
parte do time. Parte essa, aliás, que ele não conseguiria
vender, mesmo que tentasse.
Aconteça o que acontecer, é bom irmos nos preparando para
um ano ou mais sem hóquei. Nem de madrugada.
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Alexandre
Giesbrecht, 27 anos, lembra-se da decepção de
quando descobriu, em cima da hora, que a abertura da temporada
de 1994-95 seria adiada. |
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VILÃO? Brian Leetch,
Bobby Holik, Alexei Kovalev e Jan Hlavac: só com esses quatro,
tem-se praticamente a folha salarial de Penguins e Predators (Kathy
Willens/AP - 02/02/04) |
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