Por
Alexandre Giesbrecht
Fazia tempo que eu não me alienava assim da NHL. Duas semanas
sem acesso à Internet, sem acesso a e-mail, apenas com jornais
locais, que, óbvia e lamentavelmente, não cobrem hóquei
no gelo. Meu único contato com a liga foram os e-mails recebidos
no celular com os resultados dos jogos dos Penguins, geralmente com
horas e horas de atraso, sendo que os referentes à vitória
por 1-0 sobre o Chicago, no dia 30 de dezembro, nunca chegaram, e só
fui descobrir o resultado quando voltei.
Para escrever esta coluna, foi necessário tentar ficar a par
do que aconteceu nessas duas semanas quando gelo, para mim, era só
o que eu colocava no copo na hora de beber alguma coisa de fora da geladeira.
E não houve acontecimento mais importante do que a quebra do
recorde de minutos de shutout da era moderna, pelo até então
goleiro reserva dos Coyotes, Brian Boucher.
Boucher é aquele mesmo que, depois de uma temporada sensacional
em 1999-2000, entrou em colapso nos playoffs, nunca repetiu tais números
e acabou sendo trocado para Phoenix antes da temporada passada. Ou seja:
ele já tinha mostrado que era capaz, embora não com freqüência
os Coyotes o expuseram durante o recrutamento de desistência,
em setembro. Ainda falta mostrar que é capaz de manter a mesma
produtividade. Ele não conseguiu da primeira vez, mas agora,
mais experiente, pode encarar melhor a responsabilidade que vem com
o sucesso.
E ele começou bem nessa tarefa. Depois que ele teve de buscar
o disco no fundo de seu gol pela primeira vez em mais de cinco horas
de hóquei, o jogo parou para ele ser cumprimentado pelos seus
companheiros de time e para o telão do estádio mostrar
alguns momentos da incrível seqüência, que durou exatos
332 minutos e um segundo. Com toda essa distração, não
seria difícil o Atlanta Thrashers, adversário naquela
noite, aproveitar-se disso e conseguir uma goleada. Mas não foi
o que aconteceu. Boucher continuou espetacular, parando todos os demais
chutes que foram em sua direção.
Aliás, o próprio chute que o iludiu só terminou
atrás dele por ter batido no peito de um de seus companheiros,
David Tanabe. Sem o involuntário desvio, o disco iria fatalmente
ser parado por Boucher, como os 146 anteriores. Mas Tanabe sabe que
não tem culpa, e sabe também que, uma hora ou outra, a
seqüência teria de acabar, apesar de a torcida querer que
ela continuasse até, quem sabe, o título da Copa Stanley:
"Eu não sinto nem um pouco de remorso. Nem por um segundo
me sinto mal pelo que aconteceu. Não havia nada que eu pudesse
fazer. Eu estava jogando e estava na minha posição, fazendo
o que eu deveria estar fazendo."
Não que o gol que encerrou a seqüência tenha sido
de todo ruim. Tirou um belo peso das costas do time. Não deve
ser fácil começar um jogo sabendo que o adversário
tem um incentivo a mais para marcar gols. Ainda mais porque o ataque
dos Coyotes não é tão confiável: o time
só marcou mais de três gols em nove jogos e, nesses nove
jogos, tem uma campanha de meros 5-2-2 (duas destas vitórias
vieram durante a seqüência de Boucher).
Por isso mesmo, é bom ninguém achar que o incrível
feito do goleiro automaticamente transforma o Phoenix em favorito. O
time ainda está fora da zona de classificação,
embora empatado em pontos com o oitavo colocado. É bem verdade
que um goleiro em boa fase pode carregar um time nas costas durantes
os playoffs, como provou Jean-Sébastien Giguere e seu Anaheim
Mighty Ducks no ano passado, mas é importante ter um time com
vários pontos fortes, e os Coyotes ainda não têm
isso.
Ainda assim, eles estão muito melhores do que se poderia esperar
no início da temporada. Poucos esperavam que eles conseguissem
fugir das últimas colocações na Conferência
Oeste e na liga. Mesmo esses poucos dificilmente apostariam que o time,
depois de jogar a metade de seus compromissos, estaria tão na
briga por uma vaga nos playoffs.
A partir daí, o que foi conseguido durante a temporada, mesmo
os cinco shutouts seguidos, deixa de valer. "[A partir dos playoffs,
o time] pode focar a seqüência que realmente importa: a Maldição
de Winnipeg", escreveu o colunista Dan Bickley, do jornal Arizona
Republic. "A dura bagagem que acompanha um time que não
ganha uma série nos playoffs desde 1987."
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Alexandre Giesbrecht, 27 anos, agora terá
de esperar mais longos 36 dias até suas próximas
férias ei, férias atrasadas também
têm seu lado bom. |
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Brian Boucher é cumprimentado depois de sofrer um gol. O
primeiro em 13 dias (Roy Dabner/Reuters - 11/01/2004) |
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