Por
Marcelo Constantino
Nesta temporada os goleiros estão protagonizando histórias que cabem
muito bem num velho chavão: "As voltas que o mundo dá". Em Detroit,
Curtis Joseph saiu da condição de defenestrado, rifado e relegado ao
time afiliado da liga menor para a de goleiro número 1 dos Red Wings.
Em Phoenix, apenas alguns meses atrás, ninguém queria Brian Boucher.
Da mesma forma que CuJo, ele foi deixado desprotegido no recrutamento
da desistência, no começo da temporada, e nenhum time o selecionou.
A comissão técnica não estava satisfeita com a produção dele e então
os Coyotes buscaram negociá-lo, tal qual CuJo. Mesmo resultado, ninguém
quis.
Agora ele é o fenomenal Boucher, que quebrou um recorde de 55 anos da
era moderna da NHL, com cinco shutouts seguidos e 332:01 sem levar gol.
Esse norte-americano de 26 anos de idade teve um início promissor na
NHL. Foi recrutado na primeira rodada (22o geral) de 1995 pelo Philadelphia
Flyers. Logo depois, em 1997, conquistou a medalha de prata pela seleção
americana no campeonato mundial de juniores [LINK ED. 31]. Na temporada
de 1999-2000 terminou com a melhor média de gols sofridos por um novato
(1.91) desde 1950-51 e levou os Flyers a uma vitória das finais da Copa
Stanley, mas perdeu os jogos 5 e 7 para o New Jersey Devils na final
de conferência. Sim, aquela série daquela longa partida decidida pelo
gol de Keith Primeau. Sim, aquela série em que Scott Stevens praticamente
arrasou com a carreira de Eric Lindros.
Em 2000-01 Roman Cechmanek foi alçado à posição de goleiro No. 1 dos
Flyers e Boucher caiu para uma média de 3.27 gols por jogo. Ele começou
bem a temporada, mas contundiu-se e viu Cechmanek assinar um contrato
de três anos que selava a posição de No. 1 do gol para ele. Acabou negociado
junto com uma escolha de terceira rodada para os Coyotes em 2002 por
Michal Handzus e Robert Esche. Como reserva de Sean Burke não impressionava
tanto como nos primeiros meses de Philadelphia.
Depois do constrangimento da exposição ao recrutamento da desistência,
estreou na temporada levando cinco gols. Era o terceiro goleiro do time
até que Zac Bierk se contundiu no início de novembro.
Com Bierk contundido, ele entrou no time para que Burke descansasse
na partida de 31 de dezembro (até então Boucher sequer estava treinando
com o time). Foi onde tudo começou. Vitória de 4-0 sobre os Kings, depois
6-0 sobre os Stars, 3-0 sobre os Hurricanes, 3-0 sobre os Capitals e
2-0 sobre o Wild. Cinco shutouts seguidos. Boucher começou a temporada
com apenas sete em quatro temporadas.
Na vitória contra o Wild ele quebrou os dois recordes e acumulou 146
defesas durante o período. O recorde antigo é de 309:21 e quatro shutouts
consecutivos, por Bill Durnan em 1949 pelo Montreal.
A chamada era moderna da NHL começou em 1943-44, quando foi colocada
a linha vermelha central. Na história completa da NHL, a marca de Boucher
fica em terceiro lugar, atrás de George Hainsworth, do Montreal, que
ficou mais de 343 minutos sem levar um gol em 1928-29, e Alex Connell,
do Ottawa, com 460 minutos em 1927-28 e seis shutouts seguidos.
Diante de um feito que o coloca definitivamente na história da liga,
como ele reagiu naqueles minutos em que estava quebrando o recorde,
na partida contra o Minnesota? "Eu realmente olhei para o relógio",
diz Boucher. "Quando eu vi que faltavam acho que uns quatro minutos
para o fim eu sabia que podia respirar tranqüilamente. Provavelmente
foi a primeira vez que eu realmente estava contando o tempo. Odeio fazer
isso, mas eu não sei se alguém ignoraria. Fiquei feliz que havia acabado,
então poderíamos nos concentrar em apenas vencer a partida. Ainda não
parei para pensar muito nisso. Quer dizer, não sei explicar o que está
acontecendo. Como eu já disse, fiquei 85 jogos sem um shutout e agora
eu tenho cinco seguidos. Quero apenas curtir cada minuto disso."
A bela seqüência terminou no último domingo com um disparo de Randy
Robitaille, que desviou no peito do defensor David Tanabe e acabou dentro
da rede, durante uma vantagem numérica do Atlanta Thrashers. Eram 6:16
do 1o período. Foi o primeiro gol em 147 tentativas. Sem chance para
Boucher, cujas luvas estão a caminho do Salão da Fama do Hóquei, em
Toronto.
Ainda reserva? -- E então, Boucher voltaria para a reserva? Ele
ainda é o goleiro reserva de Sean Burke, outro ex-goleiro dos Flyers.
O técnico Bob Francis encerra o assunto: "Sean é o nosso goleiro No.
1". Ainda mais que Burke tem 298 vitórias no currículo e certamente
anseia chegar logo a 300a. Boucher sabe de seu papel: "Sean é o nosso
goleiro principal, todos sabem disso. Eu me sinto bem no momento e quando
você está jogando bem, você quer seguir jogando. Mas Sean tem
sido o goleiro por cinco anos e tenho certeza de que eles o querem de
volta. Eu faço parte de um grupo e farei o que me pedirem."
Francis manteve Boucher para a partida de terça-feira contra o Vancouver
Canucks, quando sua invencibilidade terminou na derrota por 4-1.
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Marcelo
Constantino adoraria integrar um comando de caça a
quem atende telefone dentro do cinema. |
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CONSAGRAÇÃO
Depois de bater os dois recordes contra o Minnesota Wild, Brian
Boucher recebe o reconhecimento dos torcedores locais (Jim Mone/AP
- 09/01/2004) |
AS MAIS LONGAS SEQÜÊNCIAS |
Goleiro |
Duração |
Ano |
Brian Boucher, Pho |
332:01 |
2003-4 |
Bill Durnan, Mon |
309:21 |
1949 |
Turk Broda, Tor |
245:33 |
1950 |
J.S. Giguere, Ana |
237:07 |
2002 |
John Vanbiesbrouck, Phi |
227:40 |
1999 |
O QUE ELES FALARAM |
Técnico Bob Francis: "Boucher tem sido um mestre nos últimos jogos."
Manny Legace, goleiro reserva do Detroit Red Wings: "É insano, pra
ser sincero. É fenomenal. É difícil conseguir sequer um [shutout].
Eu consegui um nos últimos dois anos e eu jogo num time muito bom."
Bob Hartley, técnico do Atlanta Thrashers: "Impressionante. Eui
gostaria de cumprimentá-lo."
Byron Dafoe, goleiro do Atlanta Thrashers: "Há 60 outros goleiros
na liga tirando o chapéu para ele. Não creio que [o recorde] vá
ser quebrado, certamente não durante a minha vida" |
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