Edição n.º 26 | Editorial | Colunas | Jogo da semana | Notas
 
27 de dezembro de 2002
O problema dos Avs não era Bob Hartley

Por Marcelo Constantino

Times estelares que fazem feio na temporada são uma surpresa natural. Desde que não sejam o New York Rangers, claro. Um time como o Colorado Avalanche — franquia que, desde que se mudou para Denver, venceu duas Stanley Cups e ficou de fora da final da Conferência Oeste apenas uma vez — brigando para ficar entre os oito times que vão aos playoffs beira o absurdo. Adicione a isso os nomes das várias estrelas que compõem o time, e chegamos ao inacreditável.

O que sempre vem à mente dos tradicionais adversários do Avalanche no Oeste? "Enquanto estiverem lá jogadores do quilate de Roy, Sakic, Forsberg, Blake e outros, os Avs serão um time duro de se bater nos playoffs". Em tese, sim, mas, se chegarem aos playoffs jogando o que temos visto na temporada (e se chegarem até lá), é primeira fase e um abraço.

Assim estão os Avs: patinando. Parecem desinteressados de vez em quando, falta criatividade, estão previsíveis demais, indisciplinados demais, intensidade é característica distante... Possuem um dos piores — senão o pior — times especiais desta temporada. Isso num time com todos aqueles nomes peso-pesados. Nunca o time foi tão mal numa temporada regular.

Patrick Roy não tem sido o monstro que foi ano passado, e o time carece de terceira e quarta linhas que realmente apareçam e contribuam, coisa que adversários como os Red Wings têm, com Kirk Maltby e Darren McCarty. Saudades de Drury, Yelle e Nieminen?

É absolutamente natural para um time que vive sendo um dos favoritos ao título da Stanley Cup que a temporada regular seja vista como um longo e cansativo intervalo (ou treinamento) prévio à corrida ao título. Mas o time de Denver está exagerando na dose.

Para tentar mudar este panorama cavernoso, na semana passada o gerente geral do Avalanche, o sagaz Pierre Lecroix, decidiu demitir o técnico Bob Hartley do comando do time e efetivar o assistente Tony Granato. Era necessário fazer alguma coisa, balançar o time.

Hartley começou seu trabalho em 1998 e, desde então, venceu todos os títulos de divisão com os Avs, levou o time a todas as finais da Conferência Oeste e foi campeão da Stanley Cup em 2001. Até começar esta, ele havia vencido 183 partidas nas quatro temporadas anteriores, mais do que qualquer outro técnico do time. Nesta temporada, ele tinha apenas dez vitórias nos 31 primeiros jogos.

Hartley naturalmente sentia a atmosfera ao seu redor, mas boa parte dos analistas do Avalanche esperava que Lacroix, para variar, tentasse uma grande troca antes de se decidir por Hartley. Só que esta grande troca já foi realizada, no começo da temporada: a que mandou Chris Drury para os Flames, trazendo o defensor Derek Morris. O resultado até aqui não foi positivo.

Drury era popular entre os jogadores, e a troca certamente chocou a torcida, além de ter feito a alegria de vários dos torcedores rivais dos Red Wings. Rob Blake era seu companheiro de quarto e, provavelmente, também ficou chocado. E tem jogado mal. Daí a insinuar que Blake não vem produzindo também por causa disso — e que o time todo sentiu muito a saída dele —, como já li num artigo de um analista dos Avs, façam-me o favor! Quando negociaram Adam Deadmarsh e Aaron Miller foi a mesma coisa. E foram campeões assim.

Com uma folha de pagamento acima da casa dos US$ 60 milhões, é obrigação do gerente geral fazer o que for necessário para que o time não passe o vexame de ficar de fora dos playoffs. Afinal, os Avs não são os Rangers. E assim foi feito: sobrou para Hartley.

As diversas declarações dadas por todos os atores do espetáculo após o fato consumado indicam que, embora a atmosfera ao redor não fosse boa, ninguém esperava que Lacroix demitisse Hartley agora. Nem ele próprio, nem os jogadores. Não se iludam com as belas declarações de Mike Keane e Alex Tanguay ("nós causamos a demissão dele", "nós é que jogamos, nós é que perdemos" etc.). Frases agora são reconfortantes; melhor seria que a atitude no gelo tivesse sido diferente.

Entregando o comando do time a Tony Granato, que parou de jogar em 2001 e juntou-se à comissão técnica antes desta temporada, o Avalanche segue a tradição de ter um técnico novato na NHL. Tanto Marc Crawford como Hartley nunca haviam dirigido um time na liga antes de se tornarem técnicos do Colorado.

Mesmo afirmando que Bob Hartley não era o problema, ouso afirmar que a saída dele pode dar vida nova ao time e fazer com que o poderoso Colorado Avalanche rume na direção segura dos playoffs. Nem sempre resolvemos um problema eliminando sua causa inicial. Algo como "não se apaga um incêndio matando ou prendendo o incendiário". Neste caso, Lacroix pode estar mandando sinais aos próprios jogadores.

O time é praticamente o mesmo da temporada passada, agora com Forsberg voltando a atuar regularmente. O técnico era o mesmo dos útlimos quatro anos. Muita gente na NHL afirma que cinco anos é um período suficiente para a vida de um técnico à frente de um mesmo time, por diversas razões. OK, então técnico trocado. Agora é com o time. Sim, e com Granato também, claro.

Troca de técnico num time que está em crise pode ser uma solução positiva, independente da competência do trabalho que venha sendo realizado. É uma sacudida no elenco, é uma saída da rotina, é um novo panorama, novo cenário. E os primeiros dias de Granato já indicam este caminho.

Marcelo Constantino Monteiro admira o trabalho e a serenidade de Bob Hartley, ainda mais em comparação ao destemperado técnico anterior dos Avs, Marc Crawford.
HARTLEY SAI... De surpresa (AP)
 
...GRANATO ENTRA E aqui já comemora o primeiro gol no comando do time, marcado por Vaclav Nedorost (22), contra o Edmonton Oilers (David Zalubowski/AP - 19/12/2002)
Edição atual | Edições anteriores | Sobre The Slot BR | Contato
© 2002 The Slot BR. Todos os direitos reservados.
É permitida a republicação do conteúdo escrito, desde que citada a fonte.
Página publicada em 25 de dezembro de 2002.