Por
Marcelo Constantino
É como assistir à mesma sessão de cinema durante
o dia inteiro, são quatro ou cinco vezes o mesmo filme. Pelo
menos, é engraçado para a maior parte do público.
No último verão norte-americano, o New York Rangers abriu
a carteira novamente e contratou alguns dos jogadores mais cobiçados
que tinham passe livre, invariavelmente pagando mais do que o valor
de mercado. O drogado misterioso Theo Fleury se foi, vieram Bobby Holik
e Darius Kasparaitis, dois dos "prêmios" de então.
É assim que o filme tem começado, sempre. O final das
sessões anteriores tinha os Rangers fora dos playoffs e alvo
preferencial das chacotas da liga.
Construindo -- Todos nós nos lembramos da temporada passada,
quando os Rangers contrataram Pavel Bure a preço de banana no
dia-limite de trocas (e ainda se livraram daquilo chamado Ulanov). Qual
era a avaliação predominante à época? "Se
os Rangers conseguirem chegar aos playoffs, podem até mesmo disputar
o título".
Bom, no mínimo o time estaria bem mais forte para a temporada
seguinte. Bure é um dos maiores goleadores da NHL, e poucos discordam
disso. Os críticos apontavam a pouca aptidão do Foguete
Russo em relação à defesa como um considerável
ponto negativo para um time que já era horroroso defensivamente.
Então, para reforçar a defesa, no mesmo dia-limite de
trocas, veio Tom Poti, em troca do versátil e eficiente Mike
York. Preço alto demais. Sem contar que Poti não
é um reforço defensivo.
Tudo bem, os Rangers não chegaram aos playoffs, veio a nova temporada,
chegaram novos jogadores. O problema é a defesa? Kasparaitis!
Faltam homens de frente que saibam atuar bem defensivamente? Holik!
Segue o filme -- Já se passou mais de um quarto do filme,
e parece que assistiremos a mais uma sessão do mesmo. É
comédia para o restante da liga, claro, mas que já começa
a perder graça. Afinal, é sempre a mesma coisa. Tal qual
as "Loucademias de Polícia" da vida, assistir a "Rangers
torra dinheiro pra ficar fora dos playoffs - parte VI" não
atrai tanta gente.
É a mesma porcaria de sempre. Lá estão eles novamente
no grupo dos que não se classificam para os playoffs. São
cinco temporadas sem chegar aos playoffs, e com a folha de pagamento
mais alta da liga.
É só ataque? -- Lembram-se do time da temporada
passada, que só primava pelo lado ofensivo? Hoje tem um dos piores
times de vantagem numérica da liga. Isso porque tem Eric Lindros,
Bure, Mark Messier, Petr Nedved, Brian Leetch, Poti & cia. Numa
época ao menos neste início em que times
especiais definitivamente fazem a diferença, está aí
uma das razões do novo desastre.
No desespero, uma opção que o técnico Bryan Trottier
analisa é colocar algum jogador mais forte fisicamente nas linhas
de vantagem numérica, para ver se conseguem criar algum tráfego
em frente ao goleiro. As opções? Sandy McCarthy (!) e
Holik. Acredite, se quiser.
Sim, Bobby Holik, o homem dos US$ 9 milhões que nenhum outro
time ousaria pagar. Holik, aquele antigo bom central dos rivais Devils,
que traria sua excelência defensiva para sanar este ponto fraco
dos Rangers. No pouco que atuou nesta temporada, esteve muito abaixo
das expectativas.
O que mais falar de Eric Lindros? -- Quem mais em sã consciência
apostaria uma bala Juquinha, que seja, em Eric Lindros? Bom... bala
Juquinha pode ser exagero, mas é nítido o pouco mercado
que ele tem fora de Nova York, onde até parece ter sido bem aceito.
Marcou surpreendentes 37 gols na boa temporada passada, fazendo com
que alguns até acreditassem que ele retiraria a máscara
de bebê chorão. Esforço em vão. Nesta temporada,
só agora conseguiu marcar seu quinto gol, já foi suspenso,
já brigou com a comissão técnica... Espere aí,
não há nada de novo nisso. Até mesmo algumas vaias
já foram ouvidas no Madison Square Garden. Isso é uma
novidade.
Disso surgem ridículas discussões sobre com quem Lindros
deveria atuar, se com fulano ao lado, se com beltrano atrás,
para que sua produção aumente. Logo ele, que deveria ser
o cara que faz seus companheiros de linha jogar melhor, não um
cara que precisa dos asas para jogar bem.
Quem acessou a seção Notas
da edição passada da Slot BR leu que ele se juntou
ao grupo dos insatisfeitos com a nova disposição da NHL
em coibir o agarra-agarra. Com uma considerável quantidade de
minutos de penalidade e um lamentável número de pontos,
Lindros faz o seu papel: reclama.
Imagino que o bebê chorão mais famoso da NHL tenha saudade
dos tempos da Legion of Doom ("Esquadrão da Morte",
para quem assistia às partidas ouvindo a narração
em português), quando jogava com John LeClair e Mikael Renberg.
Foram os melhores anos de Lindros na NHL, e isso faz cinco anos. Certo,
nada de Stanley Cup, mas ao menos ele jogava, era respeitado e chegava
aos playoffs.
Trottier trotando -- Quem se recorda do Flamengo em 1995? Tinha
Romário e Sávio no ataque e trouxe Edmundo para formar
o "ataque dos sonhos" para o Campeonato Brasileiro de futebol,
além de contratar quase um novo time inteiro do meio pra trás.
Para comandar este novo time, quem a diretoria do time escolheu? O radialista
Washington Rodrigues, que nunca havia treinado um time na vida. Fracasso
retumbante.
Tudo bem, não é pra ofender Bryan Trottier tanto assim,
mas vale o paralelo. Trottier é um técnico novato, que
tem nas mãos um habilidoso elenco que não se acerta porque
é reformulado a cada ano, entre outras razões. Afinal,
são 11 novos jogadores em relação à temporada
anterior.
Senão, vejamos: as duas principais armas do time, Bure e Lindros
(sim, não vamos negar que ele é uma das armas principais),
têm recebido menos tempo de jogo que o habitual. O Foguete Russo
andou atuando por ridículos 14 minutos por partida, enquanto
o central Nedved, por exemplo, chega a ter 24. Até jogadores
como Ronald Petrovicky e Mikael Samuelsson atuam mais tempo que Bure!
Que mundo é esse?
Castigar o jogador é uma coisa; castigar o time é outra.
Se a idéia é repetir o famoso purgatório para onde
Scotty Bowman mandava os jogadores que não estavam rendendo o
esperado, melhor pedir licença e dar um passeio. Nunca vi Bowman,
por exemplo, dar dez minutos de jogo a mais para Kris Draper, um jogador
importante do time, em relação a Sergei Fedorov, uma das
armas principais do time.
A luz -- É possível que chegue a hora em que a
comissão técnica vai acertar o time. Material humano de
qualidade existe para isso. Até porque, diante de decepções
e desilusões, quem surge rejuvenescido nesta temporada é
o quarentão e futuro integrante do Hall da Fama Messier, numa
surpreendente campanha até aqui. Quer dizer, mesmo assistindo
a uma pelada em que este time perde de sete para o Atlanta Thrashers,
há luz no fim do túnel. Talento para isso existe.
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Marcelo Constantino é simpático aos Rangers, mas
considera impossível não traçar semelhanças
com o Flamengo da era Kleber Leite/Edmundo Santos Silva. |
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ROTINA Dan Blackburn observa
o disco entrando no seu gol, contra o Atlanta Thrashers. Aconteceu
outras seis vezes na mesma partida (Gregory Smith/AP - 28/11/2002) |
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VELHINHO REJUVENESCIDO Mark
Messier comemora o gol de empate contra o New Jersey Devils. Foi
o décimo dele na temporada (Bill Kostroun/AP - 21/11/2002) |
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