Por: Thiago Leal

A maioria dos leitores de TheSlot.com.br, assim como dos fãs brasileiros de hóquei em geral, é jovem. Boa parte deles surgiram após os anos 2000 ou, sendo muito otimista, após 1998. Uma geração ESPN Brasil, obviamente. Alguns são oriundos do video game como eu e muita gente aqui na redação, enquanto outros conheceram hóquei através de filmes e desenhos animados. Mas fato é que é uma geração nova, pós-2000.

Como imagino que todo mundo aqui goste de futebol (soccer sucks!), vou estabelecer um comparativo. Imagine que os últimos campeões brasileiros fossem Náutico, Avaí, Barueri e Duque de Caxias. E me refiro à Série A, não a B. Certamente um canadense que chegasse ao Brasil acharia que esses são os times mais tradicionais do futebol, e vendo clubes como Corinthians, Vasco, Grêmio e Palmeiras rebaixados teria a visão de que esses aí são os mais fracos. Logo, um fã de hóquei surgido de meados da década de 90 para cá viu um cenário estranho. O Florida fez uma final de Copa. O Anaheim fez duas e venceu uma. O Carolina, idem. O Colorado venceu duas e perdeu uma. E até o Tampa venceu uma Copa, enquanto Toronto não ganha nada há mais de 40 anos, Montreal, os dois New Yorks e Chicago vinham fazendo temporadas ruins. Ou seja, tudo estava/está ao contrário.

Obviamente, os clubes mais tradicionais da Liga são aqueles que compõem o grupo chamado Seis Originais — Montreal, Toronto, Detroit, Chicago, Boston e New York Rangers. Desses, apenas o Detroit tem feito grandes temporadas neste novo período da NHL. Os demais alternam temporadas boas e ruins e não ganham títulos a pelo menos 15 temporadas. E a situação pior tem sido, sem dúvida, a de Boston e a do Chicago.

Portanto, hoje faremos a primeira parte de uma matéria dupla especial a respeito de duas das maiores franquias não apenas da NHL, mas do esporte, que têm tido temporadas ruins, mas vêm se recuperando e, junto, trazendo à tona sua história.

O Berço da América Moderna... onde o hóquei não deita
As últimas temporadas do Boston Bruins vinham alternando entre o último lugar da divisão e a classificação aos playoffs, com direito a Campeão do Nordeste, mas eliminação logo na primeira rodada. Para ser mais preciso, na temporada passada o Boston foi eliminado pelo maior rival Montreal Canadiens logo na rodada de estreia da pós-temporada. Nas temporadas 2006-07 e 2005-06 foi o último no Nordeste. Em 2003-04 foi campeão de divisão, mas caiu também na primeira rodada para os Canadiens. Em 2002-03 foi eliminado na primeira rodada pelo New Jersey. Em 2001-02, campeão de divisão e, mais uma vez, eliminação para os Canadiens. Em 2000-01 e 1999-00 nem para a pós-temporada foi, ficando mais uma vez em último em 2000.

A última vez que passou da primeira rodada dos playoffs foi em 1999, quando foi eliminado na semi-final de Conferência. E nesse período Boston, a cidade conhecida como Berço da Liberdade ou Berço da América Moderna, via a história acontecer. O New England Patriots ganhou três Super Bowls só esta década. O Boston Red Sox, grande xodó da cidade, venceu duas Séries Mundiais depois de um jejum de mais de 80 anos sem títulos. E até o time de bola-ao-cesto, considerado o maior vencedor da cidade, voltou a vencer campeonatos. Até no futebol (o bola-no-pé mesmo) o New England Revolution fez quatro finais da Copa Major League Soccer. Naturalmente, os Bruins perderam espaço.

Ah, os anos 70, quando o clube venceu duas Copas, cinco Conferências e sete Divisões. O último título de Conferência dos Bruins foi em 1990, quando venceu também o Troféu dos Presidentes pela última vez, mas perdeu a Copa para os Oilers. Putz... são quase 20 anos.

Reconstruindo a história
Por isso é uma surpresa para muita gente que os Ursos Pardos venham fazendo uma temporada tão espetacular. A razão disto tudo? Simples. Zdeno Chara e Tim Thomas. Sim, porque todo o bom trabalho que os Bruins vem fazendo se baseia numa defesa extremamente sólida, uma das melhores que a NHL tem tido na década atual. Talvez eu tenha escolhido um mal momento para falar sobre isso, uma vez que os Bruins perderam quatro dos últimos seis jogos e caiu da liderança da Liga para o terceiro lugar. Mas a defesa do Boston ainda é a melhor, um papel que vem sendo desempenhado basicamente por Chara e Thomas — principalmente Chara, já que Thomas vez por outra divide o trabalho sujo com Manny Fernandez. Tomas vem liderando a percentagem de defesas e a média de menos gols-contra no momento.

Mas levemos em consideração que Thomas em muito tem o seu trabalho facilitado pelos loucos que formam a defesa em sua frente. Sim, porque Matt Hunwick, Shane Hnidy, Andrew Ference e Dennis Wideman, assim como o próprio Chara, se jogam na frente de qualquer disco que for chutado contra o gol de Thomas. Aliás, falando nele, Wideman vem sendo outro nome fundamental no time dos Bruins. Ao lado de Chara, apóia o ataque de modo que a pontaria ruim dos Bruins (leia mais no parágrafo abaixo) vem sendo corrigida por seus chutes certeiros.

Falando nisso, não podemos deixar de remeter à história clássica dos Bruins: a primeira Copa Stanley da franquia na Era Pós-Expansão de 1967 foi conquistada com um gol de um defensor, Bobby Orr, que simplesmente levantou voo após o lance, mas aterrissou no chão já campeão e MVP do troféu mais importante dos esportes. Orr foi também o primeiro defensor com presença de ataque e a primeira grande estrela de hóquei no gelo. Sem dúvida, para o fã mais antigo, ver Chara hoje em dia é lembrar — guardadas as devidas proporções, claro — do maior atleta que a franquia já teve.

E se a arma ofensiva dos Bruins está na defesa, a grande arma defensiva do time tem estado no ataque: claro que estou falando dele, Milan Lucic, capa de TheSlot.com.br, notícia até no Brasil e candidato a melhor intimidador de todos os tempos. É que quando você joga contra os Bruins, não basta você passar pelos trancos de Aaron Ward ou pelo desarme de Chara e Wideman. Depois dessa etapa, que por si só é muito dura, você vai ter que encarar o trabalho mais difícil que é passar por Lucic. Um outro indimidador que vem atuando bem é Shawn Thornton.

Claro que não podemos deixar de falar no ataque massivo dos Bruins. Marc Savard, David Krejci e Philip Kessel vêm sendo responsáveis por um massacre de chutes que todo goleiro que vai a Boston sofre, o que até pode soar como uma crítica, uma vez que, com a quantidade de chutes a gol por jogo, os Bruins deveriam ter também o melhor ataque da temporada e também pelo menos um dos líderes em pontos ou em gols. A pontaria fosse melhor, talvez o Boston ainda estivesse liderando a corrida pelo Troféu dos Presidentes. Nenhum deles aparece entre os cinco principais pontuadores ou goleadores da Liga no momento, mas recomendo que leia o excelente artigo de Eduardo Costa sobre Krejci, já linkado neste parágrafo, para entender melhor o ataque dos Bruins.

E lembremos que Savard, Chara e indiretamente Ference não estariam em Boston não fosse a troca de Joe Thornton, conforme explicou Marcelo Constantino.

O que "a volta do Boston" agrega à NHL?
Ora... é ver novamente o bom e velho hóquei no gelo do jeito que tem que ser jogado, por quem tem que ser jogado e, o melhor, assistir às velhas rivalidades ganharem força novamente.

Logo no terceiro jogo da Liga, Bruins e Canadiens protagonizaram um confronto emocionante, com os Canadiens abrindo 3-0 no primeiro período, os Bruins empatando ao longo do segundo e terceiro e vitória dos Habs definida nos pênaltis. Outro clássico sensacional foi um empate em 1-1 com os Blackhawks, em Chicago, com vitória dos Bruins, num show de penalidades e grande trabalho dos goleiros Thomas e Nikolai Khabibulin. Na sequência os Bruins golearam os Canadiens por 6-1 em casa e, em mais um grande clássico, perderam para os Bruins, mais uma vez nos pênaltis, após empate por 2-2, para vencer o Toronto Maple Leafs por 3-2 no jogo seguinte, em mais uma ocasião onde Thomas fechou o gol. Tudo isso em novembro, mês que viu mais uma vitória sobre os Habs, desta vez nos pênaltis, e terminou com um 4-1 sobre os Wings, ocasião onde foi a vez de Fernandez fechar o gol.

Os clássicos se seguiram ao longo da temporada, passando por um 8-5 sobre os Leafs em dezembro, outro jogo espetacular com hat trick de Krejci. No geral, os clássicos que os Bruins têm jogado — e aqui não vou incluir confronto contra os Sharks... — vêm sendo todos muito bons. E não tem nada como ver uma boa e velha rivalidade esquentando na NHL. Contra os Canadiens, seu maior rival, até agora foram cinco jogos disputados onde os Habs só venceram o primeiro, o que ajuda a esquentar o clima para um provável confronto entre os dois na pós-temporada. E os Bruins não devem estar satisfeitos por serem sempre eliminados pelos Canadiens...

Por fim, fico feliz como fã de hóquei em ver aquela que é uma das franquias com mais história na NHL jogando bem novamente. Você conversar com alguém que acompanha hóquei a anos e ter que se referir a um time como os Bruins com uma equipe ruim soa estranho. E os próprios Bruins vêm tratando de corrigir isso.

Próxima semana: Chicago Blackhawks, também reconstruindo sua história.

Thiago Leal descobriu recentemente que nossa boa amiga Paris Hilton é fã de hóquei e praticou o esporte na adolescência.
Ray Lussier
Bobby Orr decola ao marcar o gol mais bonito da história do hóquei, que garantiu ao Boston Bruins sua primeira Copa Stanley.
(10/05/1970)

Arquivo TheSlot.com.br
Greg Johnston (mais um defensor) marca, mas a Copa Stanley de 1990, a última que o Boston disputou, ficou com os Oilers.
(22/05/1990)

AP
Zdeno Chara e Tim Thomas: com eles, a defesa do Boston Bruins é um muro.
(10/01/2009)
Michael Dwyer/AP
Passar pelos defensores é até possível. Mas aí vem o tranco de Milan Lucic...
(05/03/2009)
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Página publicada em 12 de março de 2009.