Por
Marcelo Constantino
O fato de Steve Yzerman ainda jogar pode ser considerado um desafio
à medicina. Sim, esta afirmação pode até ser um exagero, mas estamos
falando de um jogador de 38 anos de idade, com um considerável histórico
de contusões em duas décadas de NHL e que fez uma delicadíssima operação
de reparação no joelho nas férias de 2002.
Trata-se de osteotomia, uma cirurgia geralmente realizada em pessoas
mais velhas, com doença degenerativa nos ossos, um procedimento nunca
antes feito em atletas profissionais.
Ainda nos playoffs de 2002, com o joelho em frangalhos, o capitão dos
Red Wings insistia em jogar. Na fase inicial, enquanto o time parecia
perdido, Yzerman era, disparado, o melhor da equipe no gelo. Com uma
perna só.
Brendan Shanahan recorda-se de como era difícil para Yzerman até mesmo
caminhar após as partidas, tamanha era a dor de apoiar-se no chão. "Se
era assim para andar, imagine para patinar e jogar".
O capitão fez a cirurgia nas férias e havia dúvidas se ele voltaria
a jogar. Ele voltou, no final da temporada, ainda longe do ideal. Com
a eliminação frente aos Mighty Ducks logo na primeira fase, Steve Y
teve mais tempo para recuperar-se para jogar a sua 21ª temporada
com os Red Wings, provavelmente a última de sua carreira.
O planejamento da comissão técnica para este ano havia lhe destinado
uma posição na asa esquerda ou direita, menos tempo de gelo e descansos
nas partidas em dias seguidos. Era consenso que nas alas Yzerman não
forçaria tanto o joelho. Centrais precisam patinar mais para cobrir
diversas áreas do gelo e o objetivo era poupar Yzerman ao máximo de
grandes esforços. Qual não foi a surpresa quando o próprio jogador pediu
para voltar a atuar com central.
Dave Lewis ficou surpreso, mas aceitou: "Nós avaliamos que ele patinaria
menos subindo e descendo pelos cantos, a distância a percorrer seria
menor. Mas Steve disse: 'Sim, mas os asas precisam dar mais daquelas
freadas bruscas.'"
A volta de Yzerman à posição de central cai como uma luva para a equipe,
que andava carente com as saídas de Sergei Fedorov e Igor Larionov.
O time contava apenas com Pavel Datsyuk, Kris Draper e Jason Williams
para esta posição. E, claro, Henrik Zetterberg, que joga (bem) onde
quer que seja.
Ele era para estar na últimas, depois de tudo que passou, mas já tem
quatro gols na temporada. Ninguém esperava dele qualquer grande produção
ofensiva. O simples fato de saber que Steve Yzerman está no grupo, no
gelo, já vale. A alma do time está presente, muito embora o próprio
Steve negue que seja suficiente: "Eu não estou aqui apenas para ser
o capitão, é preciso jogar e eu quero contribuir no gelo. Estamos cheios
de líderes aqui."
Tanto melhor. Na estréia, um daqueles momentos simbólicos para guardar
nas memórias. O gol da vitória marcado no último segundo da partida
contra os Kings.
Lewis torce para que seja um sinal. "Em 1998, quando Vladdy [Konstantinov]
sofreu aquele acidente, eu sabia que venceríamos a Copa Stanley. Daquilo
nasceu um sentimento coletivo, algo difícil de explicar".
Era a razão a mais para a conquista da Stanley Cup, além do desejo pessoal.
Em 1997 era encerrar a longa seca de títulos, em 98 foi para Vladimir
Konstantinov. Em 2002, pode-se dizer (forçando a barra) que era uma
Copa para Dominik Hasek e Luc Robitaille, dois futuros integrantes do
Salão da Fama que jamais haviam conquistado o título.
Tal qual os Avs fizeram a campanha "Uma Copa para Ray Bourque" em 2001,
este ano pode surgir algo como "Uma última Copa para Steve Yzerman".
Uma quarta Copa para um jogador que, seis anos atrás boa parte da mídia
achava que jamais conquistaria uma sequer.
Yzerman marcou mais um gol logo na partida seguinte, e depois dois gols
contra o Dallas Stars na última sexta-feira, um deles batendo de primeira.
Foi a primeira vez que marcou dois gols num mesmo jogo desde 21 de dezembro
de 2001, contra o Minnesota Wild.
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Marcelo
Constantino gostaria de ter acompanhado a NHL nos tempos em
que, depois de Wayne Gretzky e Mario Lemieux, o terceiro nome
era Steve Yzerman. |
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