Por
Alexandre Giesbrecht
A definição oficial do Troféul Hart é que
ele vai para "o jogador considerado o mais valioso para o seu time".
Então, seguindo-se este critério ao pé da letra,
o jogador mais valioso (MVP) da NHL nesta temporada, sem dúvida,
é Jarome Iginla.
Ele terminou a temporada como artilheiro em pontos, tem uma média
superior a um gol a cada dois jogos, marcou sete gols da vitória,
converteu quase 17% de seus chutes e, o mais impressionante, participou
de incríveis 48% dos gols marcados por sua equipe, o Calgary
Flames.
Mas é possível que Iginla não ganhe o Hart, simplesmente
porque os seus Flames não se classificaram para os playoffs da
Stanley Cup.
Não há nenhuma regra que proíba os membros votantes
da Associação de Cronistas Profissionais de Hóquei
de escolher um jogador de um time de fora dos playoffs para o Hart,
mas é como se houvesse. Não há muitos precedentes:
a última vez que um jogador de um time que não se classificou
para os playoffs ganhou o Hart foi em 1988, quando Mario Lemieux marcou
70 gols e 98 assistências, enquanto seu Pittsburgh Penguins ficou
de fora dos sextos playoffs consecutivos.
Antes disso, é preciso voltar até 1959, quando Andy Bathgate
marcou 40 gols e 40 assistência para o New York Rangers, quinto
colocado na NHL de então, com apenas seis times. E ele nem ganhou
o Art Ross naquele ano, ficando em terceiro, oito pontos atrás
de Dickie Moore, do Montreal Canadiens. Cinco anos antes, Al Rollins
tornou-se o mais improvável MVP na história da liga. Ele
ganhou o Hart depois de sobreviver a uma temporada no gol do patético
Chicago Blackhawks de então. A campanha de Rollins foi de, nada
mais, nada menos, 12-47-7 naquele ano.
Essa regra não-escrita já eliminou inúmeros candidatos
excepcionais ao Hart desde que o truféu foi instituído.
E isso pode vir a ser mais verdade do que nunca nesta temporada, quando
a maioria dos jogadores que realmente foram valiosos para seus times
ou vão ficar de fora ou quase não se classificaram para
os playoffs.
O que dizer de José Théodore? Ele carregou praticamente
sozinho os fracos Canadiens de volta aos playoffs depois de três
anos ausentes com um trabalho consistentemente espetacular no gol.
Ou Nikolai Khabibulin? Lógico, seu Tampa Bay Lightning deixou
de se classificar pelo sexto ano seguido, mas não houve goleiro
que tenha feito mais atrás de menos, encarando todo dia uma avalanche
de borracha.
Ou Markus Naslund? Apoiando-se na sua técnica, o Vancouver Canucks
passou a empregar uma estratégia ofensiva e se classificou na
última hora. Ele só perde para Iginla na artilharia.
Ou Alexei Kovalev? Ele perdeu todos os seus companheiros de linha --
para não falar de dois terços da linha de cima -- para
contusões e ficou de fora de 13 jogos no início da temporada,
por conta de uma cirurgia no joelho, mas sua média de pontos
por jogo é a melhor da liga: 1,18.
Omitir jogadores de times desclassificados, particularmente Iginla,
além de cometer as injustiças aqui citadas, deixa a lista
de prováveis candidatos um tanto insossa.
Joe Thornton teve o papel mais importante na revitalização
do Boston Bruins, mas ele tem apenas 22 gols e não é nem
o artilheiro de seu time. Brendan Shanahan é o artilheiro do
líder, o Detroit Red Wings, mas ele está cercado de talento
digno do Salão da Fama. A mesma coisa vale para Dominik Hasek,
que tem números dignos de sua fama, mas que não tem precisado
ser extraordinário. Os melhores argumentos para o Hart, baseados
nos critérios usados pela maioria dos cronistas, podem ser usados
para Patrick Roy, do Colorado Avalanche, e Sean Burke, do Phoenix Coyotes.
O que poderia ser mais adequado a essa temporada tão sem ataque,
onde apenas um jogador quebrou a barreira dos 50 gols -- adivinhe quem
--, do que um goleiro levar o Hart?
Uma das duas únicas esperanças de Iginla é justamente
esta falta de candidatos jogando os playoffs. O fato de a agonia do
Calgary ter sido estendida em mais um ano é devido à falta
de talento do time, não ao brilhantismo de Iginla. Ele deve ser
punido porque ninguém foi mais pressionado a jogar bem -- senão
muito bem -- do que ele? É culpa dele Marc Savard ter passado
a temporada reclamando e Rob Niedermayer ter sido um desastre, mantendo
os Flames como um time de uma linha só?
Se os eleitores não conseguem se livrar do paradigma da desclassificação,
a outra esperança do jovem craque dos Flames é que lembrem
de Lemieux, Bathgate e Rollins.
"Eu joguei com e contra Andy Bathgate", diz o executivo dos
Flames Al MacNeil. "Eu odiava jogar contra ele e quando acabamos
no mesmo time, em Pittsburgh, no primeiro ano da expansão, eu
descobri como ele era uma pessoa boa". "Iggy", prossegue,
"é a mesma coisa. Seria um inferno jogar contra ele -- tão
grande, forte e competitivo --, mas ele é um sonho de pessoa.
Quero dizer, eu costumava ver Bobby Hull assinar autógrafos até
suas mãos se esfolarem. Igyy faz isso também. Os grandes
-- Hull, Gretzky -- têm tempo para as pessoas. Eles são
grandes no gelo e fora dele. Iggy fez tudo o que pôde para fazer
desta temporada um sucesso para o Calgary Flames".
Iginla não apenas carregou seu time; foi jogada em seus ombros
a responsabilidade de revitalizar uma fraquia que um dia já foi
imponente, mas hoje está estagnada. Os Flames podem estar fora
dos playoffs de novo, mas, para uma cidade desesperada por algum tipo
de excelência na NHL, ainda há um motivo para ir ao estádio.
Ainda há ele. Ainda há Iginla. Ainda há algo para
se torcer.
Deve ser destacado também que, nos anos que Rollins e Bathgate
ganharam o Hart, havia apenas duas chances em seis de não ir
aos playoffs. Na campanha MVP fora dos playoffs de Lemieux, apenas cinco
de 21 times ficavam de fora. Agora, 16 estão dentro, 14 estão
fora, aumentando consideravelmente as possibilidades de qualquer jogador
poder reservar campos de golfe ao final da temporada regular.
Como bem resumiu MacNeil, "a não ser que eu esteja enganado,
é sobre o Troféu Hart que estamos discutindo aqui, não
o Troféu do Presidente".
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Alexandre Giesbrecht, publicitário, estava ouvindo "Infected",
do Bad Religion, quando terminou a coluna. |
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LÁ VEM O QUINQUAGÉSIMO
Jarome Iginla solta a bomba que, uma fração de segundo
depois, dar-lhe-ia o seu 50.º gol da temporada, contra o Chicago
(Brian Kersey/AP - 07/04/2002) |
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LÁ FOI O QUINQUAGÉSIMO
Iginla recebe os cumprimentos de Derek Morris, depois de marcar
seu 50.º gol na temporada (Brian Kersey/AP - 07/04/2002) |
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E AINDA VEIO MAIS UM Iginla
mostra os discos dos dois gols marcados contra os Hawks (Sue Ogrocki/Reuters-
07/04/2002)
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FICHA |
Jarome Iginla
Nascido: 01/julho/1977
Local: Edmonton, Alberta (Canadá)
Altura: 1,85 m
Peso: 91 kg
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CAMPANHA (CARREIRA) |
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G |
A |
Pts |
+/- |
PIM |
96-97 CGY 82 |
21 |
29 |
50 |
-4 |
37 |
97-98 CGY 70 |
13 |
29 |
32 |
-10 |
29 |
98-99 CGY 82 |
28 |
23 |
51 |
+1 |
58 |
99-00 CGY 77 |
29 |
34 |
63 |
0 |
26 |
00-01 CGY 77 |
31 |
40 |
71 |
-2 |
62 |
01-02 CGY 80 |
51 |
44 |
95 |
+26 |
75 |
TOTAL 466 |
171 |
188 |
359 |
+13 |
285 |
|
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