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13 de junho de 2003
Um tridente de prata que vale ouro

Por Eduardo Costa

O que pode ser dito dos Devils?

Que eles deram início a era das defesas na NHL, que seu estilo de jogo é chato pacas, que Lou Lamoriello é um mão-de-vaca, que seus torcedores raramente enchem a Continental Airlines Arena, que Scott Stevens joga sujo às vezes, entre outras coisas. Mas o que temos que dizer antes disso tudo, é que o os Devils são vitoriosos. Nada mais, nada menos, e, como já disse um sábio (que eu não faço idéia quem seja), a razão está sempre do lado dos vitoriosos, e dessa vez não é diferente.

Se os Ducks ganharam, com merecimento, o respeito que nunca tiveram após esses playoffs, a equipe de New Jersey entrou definitivamente para o grupo da elite da NHL. Possuem em sua curta história o mesmo número de títulos que uma equipe "original" como o Chicago Blackhawks, e está a apenas uma conquista dos rivais Rangers, outra organização que beira os 80 anos de existência.

E poucos ousam tirar os méritos do "ditador" que está por trás do sucesso da franquia.

Lou Lamoriello, de pão-duro a gênio, em nove meses. Se Pierre Lacroix e Ken Holland ganham sempre destaque na mídia nos dias-limite de trocas ou nas movimentações pré-temporada, o mesmo acontece com Lou Lamoriello, mas por diferentes motivos. Enquanto os dois primeiros por contratações ou trocas de grande impacto, o segundo por sua inércia ou por suas trocas consideradas insignificantes. Criticado por nunca apertar o gatilho na hora "H", ele mais uma vez terminou a noite mais importante do ano (como a dessa última segunda-feira) como um gênio.

Suas duas principais aquisições em 1995 foram consideradas piadas pela imprensa, mas Shawn Chambers e Neal Broten, marcaram um par de gols cada no último jogo daquela histórica varrida contra os Wings. Em 2000, com apenas oito jogos restando na temporada regular e com a equipe líder da Conferência Leste ele mandou o treinador Robbie Ftorek embora e contratou para seu lugar Larry Robinson, que, como treinador principal tinha um histórico bem rico em derrotas, e os Devils foram campeões novamente.

O pesadelo de todo agente de jogador é sentar numa mesa para negociar um contrato com Lamoriello. Uma de suas vítimas no início dessa temporada foi Bobby Holik, um dos pilares time que, em busca de grana, teve que ancorar do outro lado do rio Hudson, onde o primo rico dos Devils o esperava com braços e carteiras abertas.

Outro popular atleta na cidade, Petr Sykora, ex-membro da aclamada "EASy line", foi trocado por Jeff Friesen. Friesen esteve quente nas quatro partidas das finais disputadas em East Rutherford, enquanto Sykora pouco apareceu. Mais uma vez o tempo deu razão ao gerente geral. Em tempo de vacas magras na NHL, a grande parte dos gerentes gerais deveriam mirar sua atenção para Lamoriello e aprender a tirar o máximo de uma equipe, mesmo com uma folha de pagamento limitada.

Foi ainda chocado com a derrota para o Carolina Hurricanes na pós-temporada de 2002 que o gerente geral foi atrás de Pat Burns para substituir o demitido Kevin Constantine. O bonachão treinador segue a mesma filosofia excessivamente disciplinadora de Lamoriello, tem o mesmo modo seco de tratar a imprensa e ambos são adeptos da filosofia de que o melhor ataque é a defesa e que nenhum atleta está acima do conjunto. Casamento perfeito. Mas foi uma aposta arriscada. Após sair dos Bruins, Burns ficou desempregado e foi tido como "acabado".

Ninguém conquistou mais vezes o Troféu Jack Adams, prêmio dado ao melhor treinador da temporada, do que Pat Burns. Venceu logo em sua primeira temporada como treinador na NHL, em 1989, quando levou os Canadiens às finais (derrota para o Calgary Flames). Ficou em Montreal até 1992 quando passou para o rival eterno, Toronto Maple Leafs, onde também venceu o Adams em sua primeira temporada. Por último conquistou o terceiro troféu com o Boston Bruins em 1998. Mas quem não trocaria um troféu individual por colocar seu nome na Stanley Cup? Com certeza Burns agora deve estar se sentido plenamente realizado.

Outro que provavelmente gostaria de trocar um prêmio individual pela conquista máxima do hóquei é Jean-Sébastien Giguere, vencedor do Troféu Conn Smythe como jogador mais valioso da pós-temporada. A expressão de "Jiggy" ao receber o seu troféu dizia algo como: "troféu errado". Em vez dele, quem ergueu a Stanley Cup foi o homem que todos acreditam que vai bater os recordes de Patrick Roy. Curiosamente Martin Brodeur tomou um recorde de outro grande goleiro nesses playoffs. Com sete shutouts, ultrapassou os seis de Dominik Hasek, obtidos ano passado quando o tcheco levou os Wings ao título.

Brodeur é um dos seis Devils desse elenco campeão, que vestiam a mesma camisa em 1995, ano do primeiro título, contra o Detroit Red Wings, e um dos onze que também fizeram parte da equipe que venceu o Dallas Stars em 2000. Outro que também sentiu o gosto das três conquistas é Ken Daneyko, e o que torna isso ainda mais saboroso é o fato dele estar na franquia desde o primeiro dia dela em New Jersey e ter enfrentado os anos de penúria da franquia . "Dano! Dano! Dano!" Acredito que não foram apenas os desafortunados amigos que tiveram que acompanhar a finalíssima via NHL radio na Internet, que ouviram a homenagem que os torcedores dos Devils fizeram quando Ken Daneyko pôs seus patins no gelo. Belo gesto também de Pat Burns ao mandar o velho Ken para os segundos finais da partida após manter o jogador fora de praticamente toda a série final.

Seu companheiro de longa data Scott Stevens deixou sua marca novamente. Tirou da cabeça as lembranças da derrota na sétima partida contra o Avalanche em 2001 e mais uma vez teve a honra de receber das mãos do comissário Gary Bettman (não foi a presença dele que tornou isso um ato honroso) o cálice sagrado, o mais importante troféu do esporte interplanetário, a Stanley Cup (isso sim é o motivo da honra). Além disso, o capitão mais uma vez deixou sua marca ao acertar um tranco de caráter duvidoso em Paul Kariya na sexta partida da série. O capitão dos Ducks se juntou ao infeliz grupo de vítimas de Stevens em jogos de pós-temporada, que inclui também Keith Primeau, Slava Kozlov, Ron Francis, Shane Willis e Eric Lindros.

Continuando na defesa, não há como não tirar o chapéu para a excelência dos Devils em evitar gols. Seguramente está entre as melhores de todos os tempos da NHL. Sem exageros. Além de Scott Stevens, eles possuem Scott Niedermayer, Brian Rafalski, além de atacantes com grande senso defensivo como John Madden e Sergei Brylin (um dos heróis invisíveis da conquista). Com quantidade e qualidade nessa área, como não dar ênfase ao jogo defensivo?

Mas alguém tem que colocar o disco na rede. E se Patrick Elias parecia estar em temporada de hibernação, surgiram os improváveis heróis. Michael Rupp e Jeff Friesen foram os personagens da sétima partida. Só o futuro irá dizer se Mike Rupp permanecerá por muito tempo na liga, mas já tem seu lugar na história reservado como um dos mais improváveis destaques de uma partida de tal magnitude. Seu primeiro gol em playoffs foi o gol vencedor da Stanley Cup. Só isso.

O jovem foi um dos beneficiados com a lacuna deixada após a contusão de Joe Nieuwendyk. O veterano central ficou de fora de toda a final este ano, mas os companheiros creditam a ele a inspiração para a vitória no jogo 7 contra o Ottawa Senators. Venceu sua terceira Stanley, em três diferentes décadas. Seu ex-companheiro de Stars, Jamie Langenbrunner, foi o maior pontuador da pós-temporada com 18 pontos, mesmo número que seu companheiro Scott Niedermayer. John Madden foi o quarto com 16.

Mais uma vez New Jersey, a sucursal do inferno na terra, é que tem a honra de ostentar o status de reis do hóquei. Dinastia ou não, Martin Brodeur quer mais e deixa seu recado: "É importante saber que não terminou para nós". Alguém duvida disso?

Ah! E já ia me esquecendo, eles venceram uma sem Claude Lemieux!

Eduardo Costa vai passar o dia dos namorados acompanhado da Sylvia Saint.
 
  INÍCIO DO FIM Jamie Langenbrunner e Mike Rupp festejam o gol que abriu a porta do paraíso para os Devils (Paul Chiasson/AP - 09/06/2003)
   
 
  O FIM Jean-Sébastien Giguere apenas acompanha o disco entrar após chute de Jeff Friesen (HO, NHL/AP - 09/06/2003)
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Página publicada em 12 de junho de 2003.