Por
Rafael Roberto
Na quarta-feira da semana passada, no dia 28 de maio, o maior goleiro
de todos os tempos decidiu encerrar sua carreira. "Estou me aposentando
com o sentimento de ter feito tudo o que pude para ser o melhor", falou
Patrick Roy na conferencia onde anunciou sua saída da NHL.
Roy se aposenta possuindo quase todos os recordes que um goleiro pode
ter. Em seus 1.029 jogos de temporada regular, ele passou 60.235 minutos
no gelo (o equivalente a 41 dias, 15 horas e 55 minutos) e conquistou
551 vitórias, sendo o único a conseguir mais de 200 vitórias jogando
por dois times diferentes.
Os recordes continuam nos playoffs. Foram 247 partidas resumidas em
15.209 minutos e 151 vitórias, sendo 23 dessas com shutout. Roy também
possui o recorde de vitórias consecutivas em jogos de pós-temporada
(11 em 1993), a maior seqüência sem tomar gols desde 1926 (227 minutos
e 41 segundos), foi o primeiro goleiro a conquistar dois shutouts em
uma final da Stanley Cup (2001) e é o único jogador com três troféus
Conn Smythe, concedido ao melhor jogador dos playoffs (1986, 1993 e
2001).
Depois de dezoito temporadas, pouco mais de dez com o Montreal Canadiens
e quase oito com o Colorado Avalanche, e quatro Stanley Cups, Roy deixa
o hóquei não só com números espetaculares, mas também com um legado
e por isso pode ser considerado o maior goleiro que já passou pelos
rinques.
"Ele influenciou toda uma geração de goleiros de Quebec", disse John
Davidson, goleiro que jogou no New York Rangers e no Saint Louis Blues
nos anos de 1970 e 1980. "Veja os dois goleiros que estão nas finais
da Stanley Cup, ambos cresceram idolatrando Roy."
Assim como Jacques Plante, que revolucionou a posição de goleiros quando
começou a usar máscara, Roy transformou o modo de se jogar entre as
traves, não criando o estilo butterfly (que em português quer
dizer borboleta), mas sim o aperfeiçoando ao hóquei moderno. Patrick
também se adaptou a esse novo modo de jogar melhorando seu posicionamento
na rede e estudando o modo como seus adversários chutam para não ficar
tão dependente dos reflexos e da sorte. Agora, mais de 90% dos goleiros
jogam desta maneira.
"Existem várias cópias boas de Roy, mas nenhuma é igual à original",
disse Grant Fuhr, um dos melhores goleiros da história e vencedor de
cinco Stanley Cups. Hoje Fuhr não é reconhecido como merecia porque
não se aposentou no auge, como Roy está fazendo agora. Todos dizem que
O Rei (Roy significa Rei em francês) poderia jogar mais uma ou, quem
sabe, até duas temporadas.
Porém, um grande goleiro sabe a hora de parar; sabe que aos 37 anos
seus reflexos não são mais os mesmos; sabe que a velocidade de seus
movimentos só diminuem, aumentando as chances de tomar gols fáceis e
diminuindo, assim, sua confiança. Por isso Roy decidiu que esta seria
sua última temporada antes mesmo que ela começasse.
Outro legado que Roy deixa é a sua paixão pelo jogo e a vontade de vencer
e de melhorar o modo como ele e todo o seu time joga, inspirando seus
companheiros através de seus exemplos. Um fato que demonstra
essa paixão ocorreu nos playoffs de 1994 quando um apêndice tiraria
Roy da briga pelo segundo título seguido. Os médicos queriam operá-lo
imediatamente mas Roy disse que a cirurgia não poderia ocorrer porque
ele tinha um jogo contra o Boston Bruins naquela noite. Pois O Rei pegou
uma ambulância, foi para o Fórum de Montreal, jogou a partida, voltou
ao hospital para esperar o próximo jogo e só foi operado depois que
o Habs foi eliminado no jogo 7.
Quando Roy chegou ao Avalanche, em dezembro de 1995, a franquia tinha
uma fama de possuir um elenco talentoso mas que não jogava com a paixão
de um clube vitorioso. Roy trouxe essa paixão na sua mala quando chegou
em Denver e os Avs conseguiram sua primeira Stanley Cup numa atuação
mágica do Rei no jogo 4 contra o Florida Panthers, onde ele conseguiu
um shutout depois de defender 63 chutes em um jogo inteiro e mais três
prorrogações.
Quando chegou em Denver, Roy também voltou a trabalhar com o seu primeiro
agente e amigo, o gerente geral do Avalanche Pierre Lacroix. Juntos
os dois construíram mais do que uma fortuna, construíram um franquia
vitoriosa e tornaram-se os melhores em suas respectivas funções. Talvez
eles sejam as melhores coisas que aconteceram para o Colorado, sem eles
(ou pelo menos um deles) os Avs talvez não teriam conquistado nenhum
título, quanto mais dois.
Agora esta parceria acabou. Roy abandonou o hóquei "sem chances de volta"
segundo ele. A partir de agora vai passar mais tempo com a família,
estará mais perto do Quebec Remparts, time que é um dos donos, e poderá
voltar à NHL como gerente geral, se essa oportunidade lhe for dada.
Já Lacroix permanece no clube, mas com um enorme problema: como substituir
um goleiro do calibre de Roy?
"Vamos deixar as coisas bem claras", disse Lacroix. "Você não consegue
substituir um Patrick Roy e o que ele representa. Portanto, nossa intenção
não é achar outro Patrick Roy, mas sim dar chances para os jogadores
mais jovens que vêm jogando pela nossa organização por anos". Com esse
discurso ele deixou claro que o Avalanche deve procurar o substituto
dentro do clube e David Aebischer e Phil Sauve são os primeiros nomes
na lista.
Aebischer vinha sendo o reserva de Roy desde 2000 quando o substituiu
com grandes atuações em alguns jogos devido a uma contusão do Rei. Depois
de um 2001-02 na média, os números de Aebischer nesta temporada ficaram
abaixo do esperado (7-12-0, sofrendo mais de 2.4 gols por jogo). Agora
o jovem suíço sabe que terá uma boa chance de se firmar na NHL e não
pode largá-la. Mesmo porque seu (principal candidato) reserva foi eleito
o melhor jogador da American Hockey League (AHL) nesta temporada. Sauve,
23 anos e filho do agente de Roy, Bob Sauve, também pode ser considerado
um possível titular.
Uma coisa que Lacroix também pode fazer é usar Aebischer como titular
e contratar um reserva veterano para auxiliar e dar mais confiança ao
suíço, já que ele vai jogar pela primeira vez sem a segurança de ter
um Roy no banco para uma emergência. Fazendo isso, Sauve volta para
o Hershey Bears, time filiado ao Avs na AHL, para ganhar mais experiência.
Lacroix ainda tem mais duas opções: ou contrata alguém no mercado de
jogadores livres ou adquire algum por meio de troca. A primeira é também
menos provável, uma vez que o gerente geral do Avs não tem a cultura
de contratar jogadores dessa maneira. A segunda opção também se torna
pouco viável porque o clube não tem mais uma variedade de jovens jogadores
que possam ser trocados por grandes goleiros. O principal nome na lista
de uma possível troca é o de Sean Burke, sempre um candidato
a ser transferido devido ao seu alto salário num Phoenix Coyotes
em crise financeira.
Independentemente de quem começar como titular no gol do Avalanche
na próxima temporada, ele terá muito trabalho para preencher todos os
espaços deixados por Roy. Pelo simples fato de ser Roy quem estava no
gol os seus companheiros ficavam mais confiantes e relaxados para jogar
porque, se algo desse errado na frente, eles sabiam que atrás tinha
um goleiro que poderia consertar a falha.
"Depois que ele chegou tudo ficou um pouco estranho", disse o capitão
Joe Sakic. "Você olhava pra trás e via Patrick Roy. Era difícil acreditar
que ele estava do nosso lado. Ele era uma lenda em Montreal e agora
estava conosco em Denver. Ele mudou várias atitudes que tínhamos como
um time. Nós mudamos de um time que possivelmente venceria para um time
que provavelmente venceria."
Roy também era um líder e uma inspiração. Dave Reid lembra que ele não
era o tipo de jogador que fazia discursos, mas fez um depois que o Avalanche
perdeu o jogo 6 contra o Los Angeles Kings por 1-0 nos playoffs de 2001.
"Ele falou que estava chateado porque fez tudo o que podia como um goleiro
para vencer o jogo mas nós não correspondemos e isso definitivamente
chamou nossa atenção. Isto mostra a paixão que ele tem pela vitória."
É possível encontrar vários excelentes goleiros no hóquei
hoje, mas poucos são muitos bons e fazem seus companheiros também jogarem
bem e Roy conseguia fazer. Por isso o Rei dos Goleiros vai deixar mais
do que um espaço vazio nas redes da NHL e um número aposentado em Colorado,
ele vai deixar milhões de órfãos e um legado porque os grandes personagens
têm esse poder de influenciar e mudar o hóquei e as pessoas quem o vivem.
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Rafael Roberto faz suas as palavras de Lacroix: "Obrigado Patrick, você
é um verdadeiro campeão."
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STANLEY CUPS Patrick Roy celebra
mais um título da Stanley Cup. No total foram quatro, dois
com os Canadiens e dois com o Avalanche. Por três vezes ele
também foi eleito o melhor jogador dos playoffs (Arquivo
The Slot BR) |
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RIVALIDADE Já em Denver,
Roy ajudou a criar a rivalidade do Avalanche com os Red Wings. Em
uma das mais belas fotos de um goleiro em ação, Patrick
aparece atuando contra o rival (Arquivo The Slot BR) |
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RECORDISTA Patrick Roy possui
quase todos os recordes que um goleiro pode ter. Nesta foto ele
é flagrado comemorando a conquista do recorde de maior número
de vitórias na história da NHL. Ao todo foram 551
vitórias, 104 a mais que o segundo colocado (Arquivo The
Slot BR) |
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CAMISA APOSENTADA Com a aposentadoria
do craque e de seu número esta camisa nunca mais será
usada no Avalanche. É uma grande perda para a NHL (Craig
F. Walker/Denver Post) |
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