Por
Eduardo Costa
Ser escolhido em primeiro lugar no recrutamento. Ser o primeiro europeu
a atingir essa posição tão alta. Ir para o Toronto Maple Leafs em troca
de Wendell Clark, na época o mais querido jogador da franquia. Passar
a ostentar a posição de capitão dos Maple Leafs, uma das seis equipes
originais, após a saída de Doug Gilmour em 1997, outro jogador histórico
do clube. Também o primeiro europeu a ser capitão na história da franquia....
Mats Sundin passou por tudo isso. Muitas vezes se falou que faltava
fibra, ou que não tinha os requisitos básicos de um líder, principalmente
após as eliminações em pos-temporada. "Desmotivado", "preguiçoso"...
É difícil acreditar que esses já foram os adjetivos usados em
Ontário para descrever o hoje indiscutível Sundin. A imprensa de Toronto,
como já foi escrito em inúmeras matérias aqui na The Slot BR, sabe ser
cruel e a cada dia que se distancia da última conquista da equipe a
pressão aumenta mais e mais.
Não era muito comum jogadores saírem do velho continente para acompanhar
o recrutamento pessoalmente, mas como existia a possibilidade de ele
ser o primeiro escolhido em Minneapolis (local do recrutamento), Sundin
arrumou as malas e partiu rumo aos Estados Unidos. Mais quatro jogadores
tinham reais possibilidades de alcançar o topo, mas foi mesmo Sundin
o primeiro nome ouvido através do sistema de som da arena naquele dia.
O Quebec Nordiques foi o time que quebrou a histórica tradição.
Coincidência ou não, a partir daquele ano o contingente de jogadores
europeus selecionados disparou. Os 38 europeus selecionados no recrutamento
de 1989 correspondeu a 15,1% do total de jogadores escolhidos. No ano
seguinte foram 53 (21,2%), até atingir a marca de 141 jogadores europeus
em 2000 (48,1% dos selecionados).
Já em sua primeira partida na liga (4 de outubro de 1990), Mats marcou
seu primeiro gol. Terminou a temporada entre os melhores novatos. No
ano seguinte melhorou seus números e na temporada 1992-93 começou a
causar impacto. Marcou ao menos um ponto em cada uma das primeiras 30
partidas dos Nordiques e terminou a temporada com 114 pontos, ajudando
sua equipe a chegar aos playoffs pela primeira vez em seis anos.
Mas a equipe foi eliminada pelos Canadiens após estar liderando a série
por 2-0. Na temporada seguinte, sequer obteve a classificação para a
pos-temporada. Foi o bastante para a direção do Quebec Nordiques se
mexer e contratar Pierre Lacroix em maio de 1994 para ser o gerente
geral e, principalmente, tentar armar uma equipe para evitar que os
tradicionais rivais de Quebec continuassem a levar a melhor nos confrontos
entre as duas equipes.
Uma das primeiras constatações de Lacroix era que faltava um jogador
de espírito guerreiro na equipe. Wendell Clark, na época capitão do
Toronto Maple Leafs, seria o homem ideal para liderar a equipe de Quebec
rumo a algo maior. O gerente geral dos Leafs na época, Cliff Fletcher,
disse que o único jogador dos Nordiques que interessava era Sundin.
Toronto também estava pensando em mudanças já que o sonho de retornar
as finais da Copa Stanley sempre morria na reta final. Como já possuía
Joe Sakic no elenco, Lacroix não pensou muito e aceitou a troca que
envolveu também outros jogadores de menor impacto e uma escolha de primeira
rodada de cada lado.
A vida dos Leafs não melhorou. Foram eliminados na primeira rodada dos
playoffs de 1995 e 1996 e sequer se classificaram para a pós-temporada
em 1997 e 1998. Fletcher, o homem que trouxe Sundin para o organização,
caiu durante essa fase negativa. A produção ofensiva do sueco foi sempre
alta, invariavelmente liderando a equipe em pontos ao final de cada
temporada. Mas mesmo assim os fãs e imprensa questionavam se Sundin
era realmente o líder que a equipe necessitava.
A temporada 1998-99 viu o renascimento da franquia. A equipe ganhou
muito com a chegada do goleiro Curtis Joseph, vindo do Edmonton Oilers.
Com CuJo e Mats Sundin se destacando, os Leafs voltaram aos playoffs
e chegaram até as finais da conferência em 1999, fato que se repetiu
na última temporada. Além de ter passado da primeira rodada em cada
um das últimos quatro playoffs. Outro feito foi a primeira campanha
na casa dos 100 pontos dos Leafs em sua história (1999-00).
Com Doug Gilmour negociado para o New Jersey Devils em fevereiro de
1999, a vaga de capitão da equipe foi dada a Sundin, que, com isso,
se tornou o 16º capitão da história da franquia, mesmo com todo
as críticas que ainda existiam em relação a ele. É um posto que
ocupa já há seis temporadas, o maior período de um europeu capitaneando
um time na história da NHL. Antes dele apenas dois suecos já haviam
sido capitães na liga, ambos do Winnipeg Jets: Lars-Erik Sjoberg (1979-80)
e Thomas Steen (1989-91).
"Há 30 equipes na NHL, cada com um capitão", diz goleiro reserva Trevor
Kidd. "Quem tem o trabalho mais duro na liga, tendo que lidar com a
mídia de Toronto e todo o resto? Eu acho que o capitão do Toronto Maple
Leafs é o primeiro nome nessa lista." A seguir, completa: "Neste clube
de hóquei não há qualquer 'se', 'e' ou 'mas' sobre quem deveria usar
o 'C' de capitão. Isso é de Mats Sundin".
Assim como Mike Modano e Steve Yzerman, Sundin teve uma queda em seus
números ofensivos ao se tornar mais responsável defensivamente e, conseqüentemente,
um jogador mais completo. Isso pode contribuir para que, pela primeira
vez desde que chegou a Toronto, o título de artilheiro possa ir para
outro jogador, no caso o líder em pontos da equipe nessa temporada:
Alexander Mogilny. Mesmo assim, no último dia 10, o sueco chegou ao
número mágico de 1000 pontos na carreira ao marcar contra os Oilers.
Curiosamente contra seu companheiro de seleção Tommy Salo. Uma bela
marca para quem acreditava que atuaria apenas três ou quatro anos na
NHL, mas que está bem perto também da marca de 1000 jogos na liga!
Com tudo isso, Sundin é o maior pontuador sueco na história da NHL e
o quinto jogador nascido no velho continente a atingir a marca de 1000
pontos na mais competitiva liga de hóquei do planeta, igualando-se
aos eslovacos Stan Mikita e Peter Stastny, o tcheco Jaromir Jagr e o
finlandês Jari Kurri. Participou oito vezes do Jogo das Estrelas (preferiu
se preservar para a corrida aos playoffs com os Leafs a atuar na última
edição).
É também o quinto jogador a atingir seu milésimo ponto vestindo a camisa
dos Leafs, feito que também pertence a Norm Ullman (1971), Glenn Anderson
(1993), Doug Gilmour (1995) e Larry Murphy (1996). Curiosamente todos
eles, exceto Ullman, possuem no mínimo uma Stanley Cup no currículo,
mas nenhum deles a obteve enquanto atuavam em Toronto.
E a Stanley Cup é o grande gol que falta na carreira de Sundin. Quando
se é capitão de uma equipe como os Maple Leafs, recordes ficam em segundo
plano. Se o time estiver mal, mesmo que Sundin ainda produza, é para
ele que serão destinadas as perguntas mais venenosas e críticas mais
duras. Pode ser injusto, mas é assim que funciona. É responsabilidade
de todos, mas principalmente de Sundin, ele é o capitão. Ele é o homem
que todos em Toronto esperam que lidere a equipe ao título que não vêem
desde 1967.
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Eduardo Costa é colunista da The Slot BR.
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1000 PONTOS
Mats Sundin marca contra Tommy Salo o seu milésimo ponto
na NHL (John Ulan/AP - 10/03/2003) |
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