Por
Marcelo Constantino
Na semana passada o Anaheim Mighty Ducks conseguiu bater um recorde
na NHL que perdurava desde 1927. E um recorde positivo. A vitória
sobre o Calgary Flames na quarta-feira, dia 12, foi a décima
vitória consecutiva em jogos com um gol de diferença.
O recorde anterior, de nove jogos seguidos, era do Ottawa, na temporada
de 1926-27!
O Calgary Flames é um time saco de pancada, tudo bem, mas ainda
assim a vitória foi emocionante. Os canadenses empataram quando
faltava um mísero segundo para o fim, mas Mike LeClerk marcou
o gol da vitória na prorrogação, logo aos dez segundos.
A novidade disso é que os Ducks agora estão vencendo esses
jogos apertados, que têm diferença de apenas um gol. Na
temporada passada, quando amargaram um 13.º lugar, geralmente perdiam.
De 34 partidas decididas por um gol, venceram apenas 13 delas (38%).
Nesta temporada o aproveitamento foi invertido: venceram 18 de um total
de 30 (60%) até o fechamento desta edição. Quem
leu a reportagem de capa da semana passada sabe que o New Jersey Devils
está aí mesmo para provar que é possível
construir uma sólida campanha na NHL desta forma.
Sim, os Mighty Ducks estão surpreendendo. Não só
eles; parece que há novos ventos nesta temporada: alguns times
que costumeiramente eram tratados como chacota na NHL estão dando
um importante passo em direção ao respeito. O Tampa Bay
sempre foi sinônimo de "o que faz uma porcaria dessas na
NHL?" e faz uma campanha surpreendente; o Minnesota está
mostrando que é possível praticar um hóquei decente
mesmo sendo um recém-nascido na liga.
E o Anaheim, que já esteve nos playoffs em 1997 e 1999, mas que
vinha caminhando rumo à pecha de chacota permanente, está
de volta ao seleto grupo que deverá ir para à pós-temporada.
Nada muito confortável, porém. Na verdade, estão
lutando para se manter nesta posição, ali no perigoso
oitavo lugar na conferência. Entretanto, depois de duas campanhas
vexaminosas nas duas últimas temporadas, esta vem sendo tratada
como o reencontro com alguma qualidade.
Paul Kariya enxerga o óbvio: "O grande negócio [desta
temporada] é que temos um time melhor. Temos melhores jogadores
e melhores jogadores fazem melhores jogadas."
A melhora do time não é à toa. Começou antes
da temporada, quando a gerência assinou com o consagrado central
Adam Oates, mais uma das inúmeras tentativas do time ter um central
à altura de sua estrela, Paul Kariya. Oates é o típico
jogador que chama um grande atirador a seu lado. Ele fora contratado
pelos Flyers no dia-limite de trocas do ano passado, numa verdadeira
loucura da gerência de Philadelphia, que cedeu suas três
primeiras escolhas por ele, alem de um jovem goleiro de futuro promissor.
Só que Oates começou a temporada frio demais. Foi quando
o time teve de recorrer mais uma vez ao eterno central do Anaheim, Steve
Rucchin. Jogador de 31 anos de idade, tem uma boa experiência
na NHL e já foi uma dos vários candidatos a ser "o
central de Kariya e Teemu Selanne", nos tempos quentes da dupla.
Atuou por pouco mais da metade do conjunto de jogos das duas últimas
temporadas, tendo passado por seu pior momento justo durante aquelas
que foram as piores temporadas dos Ducks. Em 2001-02 fraturou a canela
da perna esquerda, tendo perdido 44 partidas por conta disso.
Neste ano Rucchin tem conseguido permanecer saudável e deu conta
do recado ao lado de Kariya. Atualmente, com o crescimento da produção
de Oates e a boa química encontrada pelo trio Kariya-Oates-Sykora,
Rucchin passou a liderar a segunda linha do time.
Petr Sykora é outra peça importante do novo Anaheim. Membro
da famosa linha EASY (Elias-Arnott-SYkora) do New Jersey Devils, foi
negociado também antes desta temporada, numa troca que envolveu
a cessão de Jeff Friesen e Oleg Tverdovsky. Embora esteja muito
longe de repetir as atuações de Selanne ao lado de Kariya
na linha principal, ou mesmo as suas nos melhores tempos de Devils,
tem sido um jogador eficiente nesta temporada.
Friesen havia chegado no mau negócio que mandou Selanne para
San Jose, em 2001. Mau negócio para ambos: o Anaheim cedeu um
dos grandes jogadores da NHL àquela altura por um preço
baixo, e Selanne nunca mais repetiu a grande fase que teve quando jogava
pelo time da Disney. Friesen chegou e teve um rendimento abaixo do esperado
na temporada seguinte à negociação. Não
deixou saudades.
Para a defesa sem o "não-é-só-isso-nem-é-tudo-aquilo"
Tverdovsky, foram buscar Fredrik Olausson. Campeão da Stanley
Cup de 2002, ele recusou-se a assinar por mais um ano com o Detroit
Red Wings, alegando que desejava retornar ao seu país. Eis que
logo a seguir decide permanecer na NHL, aceitando proposta do Anaheim,
de US$ 1,1 milhão por um ano.
Completando a construção do time, acabam de contratar
Sandis Ozolinsh, um jogador com ótimas características
ofensivas que um belo dia cismou que sua posição era de
defensor. Para obtê-lo, cederam um central que, anos atrás,
foi mais um dentre os diversos apontados com "ideal" para
centrar Kariya e Selanne: Matt Cullen. A folha salarial dos Ducks aumentou
em mais de US$ 3 milhões com a troca, numa clara indicação
de que a gerência quer sair da mediocridade.
Desde que Ozolinsh chegou, Olausson foi barrado do time. Contratado
para ajudar a vantagem numérica (VN), ele decepcionou com a pouca
produtividade (sete pontos, sendo cinco em VN).
No gol, lembram-se de Jean-Sebastien Giguere, aquele que, em dezembro
passado, conseguiu a terceira maior seqüência sem levar gols
da história da NHL? Ele segue numa boa campanha, sem deixar saudades
de Guy Hebert, goleiro com mais bagagem na história da franquia.
Com seis shutouts, 25 vitórias, aproveitamento médio de
91,5% de defesas e média de gols sofridos na faixa dos 2,4 por
partida, ele está entre os dez melhores da liga nesta temporada.
Não é nada pouco para um time que briga pelos playoffs.
O time tem uma relativamente baixa média de gols sofridos, na
faixa dos 2,45 por jogo (nono lugar na NHL). O que não quer dizer
muito, afinal sofreram menos gols ainda na temporada passada, que foi
um desastre. O ponto é que o time só se preocupava em
defender sob o comando do gerente geral Bryan Murray, que também
foi o técnico do time em 2001-02. Com Mike Babcock no comando
este ano, a ordem é que o defensor avance ao ataque sempre que
possível. Ozolinsh cai como uma luva nesta filosofia.
O goleiro prefere dizer que a defesa é que o faz eficiente: "Eles
clareiam o disco da frente da área, evitam rebotes." O defensor
Ruslan Salei concorda e diz que o grupo atual é o melhor desde
que ele chegou ao time. Trata-se de uma boa mistura entre juventude
e experiência e, fora Ozolinsh, todo o restante é de pouca
expressão na NHL.
Um dos times da NHL mais populares no Brasil, certamente devido à
propaganda de seus donos (Neste país é costume mandar
os filhos de classe média para conhecerem o que se chama comumente
de "Disney" geralmente a de Orlando, não a da
Califórnia. De lá, muitos trazem um casaco do time de
hóquei, boa parte das vezes sem sequer conhecer o que está
vestindo, mas este já seria outro assunto.), o Anaheim dificilmente
é tratado com a devida seriedade por aqui.
Esta temporada é a chance de darem ao respeito.
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Marcelo Constantino nunca quis ir à Disney. |
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VITÓRIA E RECORDE
Jogadores do Anaheim comemoram a vitória na prorrogação,
por 4-3, sobre o Calgary Flames, que marcou a quebra de um recorde
de 75 anos na NHL
(John Hayes/AP - 12/02/2003) |
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