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20 de novembro de 2002
Kevin Dineen: um eterno Whaler atormentado por tartaruga

Por Eduardo Costa

Encaminhando-se para o banco de penalidades com menos de dois minutos para o término da partida, com sangue escorrendo no rosto e feliz por ter tirado o melhor jogador da equipe adversária da partida. Foi assim que Kevin William Dineen encerrou sua carreira como jogador no último dia 9, em Columbus, contra os Sabres. Batalhou a partida inteira contra Chris Gratton, até que o central perdesse a compostura e revidasse. Ambos foram penalizados e os Sabres não tiveram no gelo seu mais produtivo central da temporada para tentar o empate.

Foi com essa entrega que Dineen disputou 1.188 partidas na NHL. Quando diagnosticado com a doença de Crohn (inflamação crônica da área digestiva), foi previsto que não duraria mais de seis temporadas na liga, mas tornou-se, ao longo dos anos, um dos mais dedicados atletas da NHL. Atuou em Hartford, Philadelphia, Carolina, Ottawa e Columbus, com 355 gols, 405 assistências e 2.229 minutos de penalidades.

O asa direita de 39 anos, nascido em Québec, é um dos oito jogadores a chegar à marca de 300 gols e 2 mil minutos de penalidades na história da NHL, juntando-se a Mike Foligno, Dale Hunter, Scott Mellanby, Gary Roberts, Brendan Shanahan, Rick Tocchet e Pat Verbeek. Faz parte de uma das famílias mais tradicionais do hóquei canadense. Seu pai, Bill, venceu a Stanley Cup como jogador do Detroit Red Wings em 1954 e 1955. Em seguida, treinou o Houston Aeros e o New England Whalers, na WHA, e os Flyers, na NHL. Seus quatro irmãos jogaram hóquei profissionalmente, sendo que dois deles, Peter e Gord, na NHL.

A história de Kevin Dineen confunde-se com a do Hartford Whalers. Foi ele que escreveu a última página da bela história dos baleeiros em 13 de abril de 1997. Na última partida da temporada regular, a equipe já estava sem chances de se classificar aos playoffs, mas o Hartford Civic Center estava lotado — infelizmente por ser o último jogo dos Whalers antes da mudança para a Carolina do Norte. Dineen marcou o último gol da equipe na vitória de 2-1 sobre o Tampa Bay Lightning. Ao final da partida, uma óbvia comoção atingiu não apenas os torcedores presentes, mas também os jogadores e todos os fãs da equipe, estivessem eles em Connecticut, Nova Inglaterra, ou no Rio Comprido. Claro que Peter Karmanos, o dono da franquia e responsável pela mudança, não estava incluído entre eles.

Selecionado pelos Whalers na terceira rodada (56.º no geral) do recrutamento de 1982, o mesmo em que a equipe selecionou Ulf Samuelsson e Ray Ferraro, somente foi disputar sua primeira partida na NHL em 3 de dezembro de 1984, contra os Canadiens. Quatro noites depois, marcaria seu primeiro ponto, uma assistência contra os Leafs no Maple Leafs Garden. Terminaria sua temporada de estréia na sétima posição da equipe, com 41 pontos.

Com um bom grupo de jogadores, a equipe iniciaria seis temporadas consecutivas (1985-86 a 1991-92) com presença nos playoffs. A primeira delas foi mágica para Dineen, que terminou a temporada regular com média de mais de um ponto por partida. Foi especial para os Whalers também, que venceram sua primeira série de playoffs ao varrer o Quebec Nordiques em três jogos. A equipe somente foi parada pelo Montreal Canadiens, mais tarde campeão, nas finais da Divisão Adams. Na quarta partida da série, Dineen marcou o que muitos consideram como o gol mais significativo da história do time. Ele interceptou um passe na zona neutra, tirou da jogada o superdefensor Larry Robinson e venceu Patrick Roy, marcando o gol da vitória.

Infelizmente para os Whalers, no jogo 7 brilhou a estrela do então novato Claude Lemieux, que marcou o gol da vitória na prorrogação. Ao bater o goleiro Mike Liut naquela sétima partida, Lemieux eliminava a chance mais clara que os Whalers tiveram em sua história de chegar a uma final de conferência ou até mesmo à Stanley Cup.

Ao final dos playoffs, Dineen contabilizava 13 pontos em dez partidas, a melhor marca de sua carreira e também a melhor da equipe naqueles playoffs junto ao asa esquerdo John Anderson.

Na temporada seguinte, a equipe venceu a Divisão Adams pela primeira vez. Foram 93 pontos e 43 vitórias, ficando atrás apenas dos Flyers na Conferência Prince of Wales. A linha formada por Dineen, Ron Francis e John Anderson, somados, marcou 247 pontos. Nos playoffs, derrota na primeira rodada para os Nordiques.

No 39.º jogo das estrelas, disputado em St. Louis em fevereiro de 1988, Dineen tornou-se o primeiro Whaler a começar a partida como titular. Atuando na linha de Mats Naslund, dos Canadiens, e de Mario Lemieux, o jogador do Hartford foi um dos responsáveis pela quarta vitória consecutiva da Conferência Wales sobre a Campbell. A partida terminou em 6-5, com o gol da vitória marcado na prorrogação por Mario, com assistência de Dineen. No ano seguinte, em Edmonton, segunda e última participação em Jogo das Estrelas, mas, dessa vez, sem pontos e sem vitória para sua conferência.

A temporada 1989-90 foi a mais produtiva em pontos para Kevin, com 89 em 79 jogos, atingindo sua melhor marca na carreira também em gols (45) e assistências (44).

A caminho de sua pior temporada em sete anos, os Whalers mandaram o capitão Francis para os Penguins, em uma troca múltipla em março de 1991. O desmanche continuou e foi a vez de Dineen ser negociado. Em novembro de 1991, o jogador foi para os Flyers em troca de Murray Craven. A equipe da Pensilvânia vinha de duas temporadas frustrantes, e, mesmo com a aquisição do ex-Whaler, amargaria mais três anos fora dos playoffs. Com a saída do capitão Rick Tocchet para os Penguins em fevereiro de 1992, Dineen assumiu o posto de líder da equipe para a temporada 1993-94. De 1991 a 93, o time foi treinado por Bill Dineen, pai de Kevin.

O sonho de vencer a Stanley Cup esteve mais vivo do que nunca em 1995. Na temporada encurtada pela greve, os Flyers renasceram sob o comando de Terry Murray e venceram a Divisão Atlântico. Nos playoffs, o Philadelphia eliminou os Sabres em cinco jogos e depois varreu o detentor da Stanley Cup New York Rangers de forma surpreendente. Faltavam apenas os Devils de Jacques Lemaire.

Os primeiros dois jogos foram vencidos pelos Devils, e os dois seguintes, pelos Flyers. O jogo 5, disputado no Spectrum, foi extremamente tenso. John MacLean abriu o placar para os visitantes com menos de quatro minutos de jogo. Pouco depois, em jogada dos russos Dmitri Yushkevich e Anatoli Semenov, Dineen empatou. Ainda no primeiro período, Bob Carpenter — um dos muitos americanos daquela equipe — colocou os visitantes na liderança novamente. O placar voltaria a ser alterado no terceiro período, novamente com Dineen, mas Claude Lemieux estava determinado a estragar a festa e marcou o gol da vitória dos Devils faltando 45 segundos para o fim do tempo regulamentar.

O jogo 6, em New Jersey, terminou com vitória dos comandados de Lemaire por 4-2, com Claude Lemieux marcando seu 11.º gol nos playoffs. Dineen, que havia marcado apenas 13 pontos em 40 jogos na temporada regular, obteve dez em 15 partidas na pós-temporada.

Retornando aos Whalers em dezembro de 1995, participou da já citada transição para Greensboro/Raleigh. Duas temporadas nos Hurricanes e, em 1999, deixava de vez a franquia. Saiu ranqueado em segundo em jogos (708), gols (250), assistências (294), pontos (544) e gols em vantagem numérica (71) na história da franquia, estatísticas lideradas por Francis. Pelo menos restou ser o líder em minutos de penalidade, com 1.439.

Após passar a temporada 1999-00 com os Senators, onde disputou sua milésima partida na NHL, o jogador foi selecionado no recrutamento de expansão pelo Columbus Blue Jackets. Em 129 jogos pelos Blue Jackets, o jogador produziu 13 gols e 15 assistências. Entretanto, disputou apenas 4 das 11 primeiras partidas do time nesta atual temporada, e a idéia de se aposentar ganhou sentido no confronto contra os Coyotes, onde atua o jogador que considera diretamente responsável pela perda de dois títulos.

Dineen alinhou-se frente a Claude Lemieux e, ao olhar para seus companheiros de linha nos Jackets, viu os mesmos Geoff Sanderson e Andrew Cassels, com quem disputou a última partida da história dos Whalers e de quem recebeu as assistências para aquele último gol. Veio em mente também a batalha de 1986, aquela em que Lemieux foi o responsável direto pela eliminação dos Whalers. Não apenas naquela série, como também em 1995, quando os Flyers de Dineen foram derrotados na final da Conferência Leste pelos Devils, Lemieux estava presente. Naquele momento ele já tinha consigo a certeza da aposentadoria, mas não iria sem antes tentar diminuir a conta pendente com "le provocateur":

— Vamos lá, Claude, tire as luvas. Pelos velhos tempos — disse Dineen, tentando chamar o veterano dos Coyotes para um último duelo.
— Eu não posso. — respondeu Lemieux.
— Por que não? — perguntou Dineen.

Neste momento, Dineen, ao narrar a história, começa a imitar o forte sotaque francês de Lemieux e recebe uma resposta insatisfatória do Coyote:

— Eu tenho 24 pontos na mão. — retrucou Lemieux.

Lemieux não tirou a luva para provar e o porta-voz dos Coyotes manifestou não saber de qualquer problema com as mãos de LeTurtle.

Eduardo Costa, com colaboração de Humberto Fernandes, também responsabiliza Claude Lemieux pelos males do mundo.
BALEEIRO Kevin Dineen com a camisa dos Whalers, hoje artigo de museu (Arquivo The Slot BR)
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Página publicada em 18 de novembro de 2002.